Obama ameaça intervenção dos EUA na Síria
Depois da Líbia, a ofensiva imperialista no Oriente Médio encaminha-se para uma nova frente. Em 18 de Agosto o presidente Barack Obama exigiu que o Presidente sírio Bashar al-Assad se demitisse, tendo afirmado que os dias do líder sírio estão contados. Os governos da Grã-Bretanha, França e Alemanha juntaram-se-lhe nessa exigência. Esta declaração é uma grosseira interferência imperialista nos assuntos internos da Síria.
Por Sara Flounders*
4 de Setembro de 2011 - 9h59 Mais do que isso, é uma ameaça declarada de intervenção militar em outro país nesta região, semelhante ao que os Estados Unidos (EUA) e os seus aliados europeus já fizeram no Afeganistão, no Iraque, na Líbia e na Somália, com mísseis e bombas. É uma ameaça ao povo sírio de qualquer coisa como foram os últimos cinco meses de massacre do povo líbio.
Duas semanas antes, em 5 de agosto, o representante da Rússia na Organização do Tratado Atlântico Norte (Otan), Dmitry Rogozin, disse aos meios de comunicação que a Otan planeja uma campanha militar contra a Síria para derrubar o regime de Assad. Em entrevista ao diário russo Izvestia, Rogozin afirmou que a Organização do Tratado Atlântico Norte também deve estabelecer como objetivo de longo alcance a preparação de um ataque ao Irã. (Relatado em Xinhua, em 5 de Agosto)
Quando o imperialismo dos EUA ataca qualquer governo ou movimento, como acontece agora na Síria, é covarde manter-se neutro. Constitui uma traição estar no mesmo lado em que está o polvo imperialista, que pretende dominar o mundo. Isto tem servido de lição para os movimentos dos trabalhadores através de 150 anos de lutas com consciência de classe. É a própria base do marxismo. Qualquer que seja a avaliação que se faça do governo que está a ser atacado, qualquer tentativa de intervenção imperialista, seja por meio de sanções ou de ataque armado, deve ser combatida.
Os dois pesos e duas medidas de Obama
A Administração Obama tem reclamado o afastamento "apenas" dos governos da Líbia e da Síria. Poderia-se pensar que não há outros governos que usem as forças do Estado contra uma parte da população.
Consideremos o mais próximo aliado de Washington, do outro lado do Atlântico, em Londres. Este governo acaba de enviar 16 mil agentes contra os rebeldes da capital. Mandaram pessoas para a prisão por quatro anos por enviarem mensagens através da BlackBerry. Esses mesmos agentes assassinaram 333 civis no Reino Unido nos últimos 13 anos. As forças estaduais da Espanha dispararam balas de borracha contra os manifestantes acampados na Plaza Catalunya, em Barcelona. Na Grécia, reprimem grevistas e manifestantes. Washington aplaude o poder do Estado em todas as três capitais aliadas por punirem estas revoltas legítimas.
Ainda mais flagrante é a repressão no Bahrein, um país com meio milhão de pessoas, onde a Quinta Frota dos EUA está baseada. Com dezenas de manifestantes mortos e centenas de presos e torturados, a monarquia deste país não recebeu qualquer crítica de Washington. Mesmo depois das tropas sauditas terem invadido a ilha para ajudar a derrotar os revoltosos.
A situação interna da Síria pode ser difícil de entender, mas na luta que se desenvolve, há declarações inequívocas contra as medidas de desestabilização, por parte dos EUA, que partiram de Hugo Chávez na Venezuela, do Secretário-geral do Hezbollah Seyyed Hassan Nasrallah no Líbano e de vários líderes exilados do Hamas, a organização palestina que foi eleita pelo povo de Gaza. Estes líderes conheceram em primeira mão campanhas de desestabilização por parte dos EUA, que usaram notícias fabricadas pelos meios de comunicação corporativos, grupos de oposição com financiamento estrangeiro, assassinatos, “operações especiais” de sabotagem e operadores de Internet bem treinados.
A ameaça à Síria está relacionada com a explosão social que agita o mundo árabe. O Imperialismo norte-americano e todos os velhos regimes a ele vinculados na região estão a tentar desesperadamente gerir e dominar esta agitação em massa, que ainda está a crescer, por vias que não ameacem o domínio imperialista da região.
Os EUA e os seus colaboradores estão também a tentar dividir e enfraquecer as duas alas principais das forças que resistem ao domínio imperialista (as forças islâmicas e as forças nacionalistas seculares) que, juntas, derrubaram as ditaduras apoiadas pelos EUA no Egipto e na Tunísia. Há agora um esforço concertado dos EUA para virar essas mesmas forças políticas contra dois regimes que nesta região se opuseram ao domínio dos EUA no passado: a Líbia e a Síria.
Tanto a Líbia como a Síria têm seus próprios problemas de desenvolvimento, que são exacerbados pela crise capitalista global e por décadas de compromissos impostos, enquanto tentavam sobreviver num ambiente hostil de ataques implacáveis, políticos, por vezes militares, incluindo sanções económicas.
O bombardeio da Líbia pelos EUA / Otan esclareceu a posição do Imperialismo relativamente a esse país. A Síria é também um alvo do Imperialismo; pela sua recusa em reconhecer a ocupação sionista, pelo seu apoio ao Hezbollah na sua luta para pôr fim à ocupação israelita do Líbano, e pela sua aliança estratégica com o Irão.
Do lado da pretensa “oposição democrática” estão reaccionários como o Senador Joseph Lieberman, presidente do poderoso Comité de Segurança Interna do Senado, que pediu aos EUA para bombardear a Síria a seguir à Líbia. Apoiantes declarados da oposição na Síria incluem James Woolsey, ex-director da CIA e conselheiro da campanha presidencial do senador John McCain.
A Wikileaks expõe o papel dos EUA
Um artigo intitulado “EUA apoiaram secretamente grupos de oposição na Síria”, de 18 de Abril no Washington Post, descreveu o relatório da Wikileaks sobre os telegramas diplomáticos dos EUA. O artigo resume o que esses telegramas do Departamento de Estado revelam sobre o financiamento secreto dos grupos sírios de oposição política, incluindo a transmissão, neste país, de programação contra o Governo, através da televisão por satélite.
O artigo descreve os esforços financiados pelos EUA como parte de uma “campanha de longa duração para derrubar o líder autocrático do país, Bashar al-Assad”, que começou no Governo do Presidente George W. Bush e continua no Governo do Presidente Barack Obama. Agora, a declaração aberta de Obama contra Assad faz com que não mais seja necessário ver telegramas secretos para saber o que pretende o imperialismo dos EUA.
O governo sírio alega que atiradores dispararam contra as manifestações, alvejando o exército e a polícia para que esta abra fogo sobre os manifestantes. Houve contrabando de armas vindas do Líbano, da Turquia e do Iraque. Rumores, mensagens anónimas na Internet e reportagens de televisão por satélite que visavam reforçar diferenças entre sectores são parte da campanha de desestabilização.
O caráter dúplo da Síria
Não é difícil perceber por que razão o imperialismo norte-americano e os seus peões nesta região, incluindo Israel e as monarquias corruptas e dependentes da Jordânia, do Qatar, dos Emirados Árabes Unidos e da Arábia Saudita gostariam de ver uma “mudança de regime” na Síria.
A Síria é um dos poucos estados árabes que não tem relações com Israel. Várias organizações de resistência palestinianas têm sedes no exílio na Síria, incluindo o Hamas. A Síria é uma aliada próxima do Irão e da organização do Hezbollah no Líbano.
A Síria não é hoje um país socialista ou revolucionário. O capitalismo, com as suas desigualdades, não foi ultrapassado. Há uma classe capitalista na Síria. Muita dessa gente beneficiou de “reformas” que venderam indústrias anteriormente na posse do estado ao capital privado. O Estado Sírio representa, deste modo, forças contraditórias.
Anos de sanções dos EUA e as acções de desestabilização tiveram também um efeito cumulativo. O aparelho de Estado, sempre receoso da constante intervenção externa, tornou-se receoso de mudanças.
Impacto da guerra no Iraque
Para escapar aos últimos oito anos de ocupação por parte EUA, mais de 1,5 milhões de iraquianos invadiram a Síria, cuja população em 2006 era de 18 milhões. De acordo com um relatório de 2007 do Gabinete do Comissário para os Refugiados dos EUA, este afluxo teve impacto em todos os aspectos da vida na Síria, em particular os serviços oferecidos pelo Estado a todos os cidadãos e refugiados.
A chegada inesperada destes refugiados iraquianos colocou sob tensão as infra-estruturas da Síria, incluindo a garantia de ensino elementar e secundário gratuito, cuidados de saúde gratuitos, habitação disponível e outras áreas da economia, e aumentou os custos da fronteira. Os preços dos alimentos e produtos básicos subiram em 30%, os preços dos imóveis em 40% e o aluguer de habitação em 150%.
Os refugiados iraquianos também beneficiaram de subsídios do Estado sírio na gasolina, na água, nos alimentos e outros bens essenciais fornecidos a todos. Essa massa tão grande de pessoas desempregadas levou à redução dos salários e ao aumento da concorrência por emprego. O impacto da crise económica mundial durante este período difícil agravou estes problemas. (Middle East Institute, 10 de Dezembro de 2010, relatório sobre Cooperação com os Refugiados)
As diversas nacionalidades, religiões e grupos culturais na Síria, os jovens desempregados e sectores empobrecidos da população, têm todo o direito de ser parte deste processo. Mas o que eles mais precisam é que a incessante intervenção imperialista de EUA e outros acabe. Por isso dizemos aos EUA e à Europa: tirem as mãos da Síria!
*Sara Flounders é co-directora do International Action Center
Tradução de André Rodrigues P. Silva
Fonte: ODiario.info
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