No mês de novembro, a agenda do executivo
Leonardo Brito, da construtora baiana OAS, incluirá passagens de três ou quatro
dias por África do Sul, Moçambique, Quênia, Congo, Gana, Guiné e Guiné
Equatorial. Ele tem dificuldades de responder sobre o local onde mora. E não
sem motivo: passa boa parte de seu tempo no avião da empresa, indo de um país
africano para outro. Uma vez por mês, por três ou quatro dias, volta a São
Paulo, onde moram a mulher e o filho. De certa forma, a vida do executivo
resume o renovado apetite brasileiro pelas oportunidades oferecidas
pelo continente africano. Hoje, grandes empresas nacionais
prospectam negócios relevantes em mais de uma dezena de países da África (ver
quadro). Angola é o maior e mais tradicional mercado, a África do Sul recebe a
maior parte dos investimentos de indústrias de transformação e Moçambique pode
ser chamado de um "destino emergente" (o Brasil é o quinto maior
investidor internacional na nação).Empresas como Vale e Petrobrás
investem pesado em mercados ricos em recursos naturais, como petróleo, gás,
carvão e minério de ferro, ajudando a espalhar influência brasileira pelo
continente. A Vale explora carvão em Moçambique e é sócia da israelense BSG no
complexo de Simandou, na Guiné, considerada a maior reserva inexplorada de
minério de ferro do planeta. Já a Petrobrás tem ativos de óleo e gás em nações
como Angola, Nigéria, Tanzânia e Namíbia. Para a Andrade Gutierrez, as obras
contratadas no continente africano somam US$ 2,2 bilhões, ou 20% do volume
total da companhia.A África é, ao lado da América
Latina, o principal vetor da expansão internacional de grupos brasileiros.
Segundo um estudo da Ernst & Young, embora o Brasil só participe com 0,6%
do total dos investimentos estrangeiros nos 54 países africanos, a expansão nos
últimos cinco anos tem acompanhado de perto o ritmo chinês. Desde 2007, a
atividade brasileira cresceu 10,7% ao ano na África, enquanto a chinesa subiu
11,7%.Junto com o direito de explorar os
recursos naturais do continente vem a obrigação de realizar obras de
infraestrutura para os governos - o que abre um mercado cativo para as
empreiteiras. Não é por acaso que Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Odebrecht
estão entre os grupos brasileiros mais bem conectados no continente.Segundo o diretor-superintendente
da Odebrecht em Moçambique, Miguel Peres, a presença em determinados países
abre portas para obras de governo, não necessariamente ligadas a projetos de
exploração de recursos naturais.A disputa de obras governamentais
com as construtoras chinesas, que oferecem crédito barato e de fácil liberação,
fez com que o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)
iniciasse um projeto para facilitar a vida dos grandes grupos nacionais. A
Odebrecht atualmente constrói um aeroporto internacional em Nacala, no norte de
Moçambique, com financiamento do banco. O BNDES não financia a obra em si, mas
os serviços que são exportados por conta desses contratos.As liberações para as exportações de serviços somaram US$ 658
milhões de janeiro a agosto deste ano. Dois países africanos - Angola e
Moçambique - concentram cerca de 40% dos empréstimos (o restante do valor foi
repassado a projetos na América Latina). Segundo o banco, a quantidade de dinheiro liberada só não é maior porque muitos governos
africanos têm dificuldade para as garantias financeiras necessárias neste tipo
de financiamento.
Assim como o BNDES, as grandes
companhias brasileiras sabem que investir na África embute uma boa dose de
risco. Um dos exemplos dessa instabilidade é a entrada da Vale na Guiné. Com o
fim do regime ditatorial que governou o país por mais de 20 anos, a nova
administração resolveu modificar o código mineral e revisar os contratos
firmados de acordo com as regras antigas. Resultado: a expectativa de explorar
uma reserva comparável à de Carajás, no Pará, se transformou em uma obra parada
no meio da floresta.Mesmo assim, a posição da empresa
tem sido de renegociar os termos do contrato com o governo. Pela quantidade de
minério estimada em Simandou, existe uma longa lista de interessados em
explorar o potencial caso a Vale decida deixar o país. O banco BTG, de André
Esteves, está em entendimentos com o governo para oferecer serviços financeiros
e auxílio em obras estruturais. Neste ano, o BTG criou a B&A Mineração, em
sociedade com Roger Agnelli, um ano depois de sua saída da Vale.A aproximação entre o governo do
país e o BTG incomodou a sócia da Vale em Simandou, a israelense BSG. A direção
da empresa chegou a vir ao Brasil procurar advogados para abrir um processo
contra Roger Agnelli e o BTG.Para trabalhar na África, é
importante conhecer bem quem serão os parceiros. Eduardo Sampaio,
diretor-gerente da americana FTI Consulting, tem a missão de facilitar a
entrada de investidores no continente. O primeiro passo, conta ele, é checar os
antecedentes dos envolvidos. Sampaio também ajuda na confecção dos contratos. O
caminho mais recomendável é definir que a arbitragem de conflitos seja feita em
um tribunal internacional.Com o devido dever de casa feito,
no entanto, a avaliação das empresas é que os ganhos compensam os riscos. Antes
de assumir a direção da divisão africana da construtora OAS e peregrinar o
continente em um avião particular, Leonardo Brito trabalhava no departamento
financeiro da empresa. Ainda no Brasil, mapeou as possibilidades de cada uma
das nações da África. Hoje, a OAS já está presente em seis países, incluindo
Angola, Moçambique e Guiné. No momento, Brito busca executivos para administrar
cada um deles.Mas isso não quer dizer que o
tempo de voo do executivo vá diminuir nos próximos meses. Pelo contrário: assim
que formar a equipe, vai preparar a expansão da OAS para pelo menos outras sete
nações africanas. A construtora, que está envolvida em estradas, hidrelétricas
e portos elegeu a África como prioridade em seu projeto internacional.A empresa quer fincar bandeira em
vários pontos do mapa africano - de preferência, antes da concorrência. Com
base no estudo que elaborou, Brito diz ter convicção de que a redemocratização
de várias nações permitirá apostas ousadas no futuro. "Estudei cada um dos
mais de 50 países africanos. E posso garantir que há potencial de investimento
em pelo menos 30."
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