No mês de abril, o governador Tarso Genro anunciou um programa de R$ 100 milhões para a agricultura camponesa, que deve sair do papel no segundo semestre. A ação, que terá participação ativa de movimentos sociais do campo, vai apoiar famílias de agricultores para projetos como recuperação de solos, instalação de horta, formação de pastagem, criação de pequenos animais e sementes, aquisição de equipamentos, logística, entre outros. “A importância é dar condição para o agriculor entrar em outro patamar de desenvolvimento. Ao longo da história, ele ficou alijado, sendo apenas fornecedor de matéria-prima. Ele poderá assumir a agregação de valor, a industrialização, a comercialização”, afirma o secretário de Desenvolvimento Rural, Ivar Pavan.
O programa será financiado com 50% de recursos do fundo social do BNDES e outros 50% do orçamento do Estado. O montante irá para o Fundo Estadual de Apoio ao Desenvolvimento dos Pequenos Estabelecimentos Rurais (FEAPER) e será uma espécie de financiamento, só que o Governo irá subsidiar em 100% os agricultores que estão no cadastro único do Bolsa-Família e em 80% para os demais, que devem participar de compras públicas como merenda escolar ou o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), do Governo Federal.
“O foco é em quem produz alimentos prontos, como hortifrutigranjeiros, frutas, batata, aipim”, explica Pavan. “O agricultor é que irá fazer o seu projeto, como apoio técnico da EMATER, delimitando o que quer produzir, o que quer adquirir. Terá um limite máximo de recursos”, complementa.
O secretário espera que no segundo semestre o programa esteja em operação. O Governo está esperando a liberação dos recursos do BNDES para dar início. Não há ainda um dado oficial, mas a previsão de Ivar Pavan é de que entre 15 e 20 mil famílias sejam beneficiadas. “Não é tão alto assim, se considerarmos que o estado que tem cerca de 380 mil famílias de agricultores, mas é um volume importante”.
Pavan espera que o programa possa se tornar uma política permanente, mas afirma que para isto é essencial o sucesso na aplicação dos R$ 100 milhões iniciais destinados a ele. “A gente sempre orienta que se o programa for bem-sucedido a tendência é que tenha continuidade. Se os agricultores, o Governo, o BNDES não cumprirem bem sua parte, terá vida curta. Mas eu aposto que terá vida longa”, afirma.
MPA afirma que programa vai beneficiar camada marginalizada pelas política públicas
Movimentos sociais do campo ligados à Via Campesina devem gestionar a seleção de agricultores para entrarem no programa, porque ele envolve decisões coletivas. De acordo com Marcelo Leal, dirigente do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), há quatro eixos em que os recursos podem ser utilizados e apenas um deles é mais claramente individual – os investimentos na propriedade, focados em recuperação do solo, adubação orgânica, aquisição de sementes, entre outras medidas, visando a transição ou a consolidação do modelo agroecológico.
Os outros eixos previstos para a utilização do recurso envolvem o uso coletivo. São eles a logística, prevendo a aquisição de caminhões para o transporte de produtos; e a industrialização dos produtos. Está prevista também a construção de centros de distribuição em um segundo momento do programa.
Além da comercialização por meio de compras públicas, a Via Campesina está articulando com sindicatos, especialmente de metalúrgicos, para que grandes empresas adotem os alimentos agroecológicos produzidos por camponeses em seus restaurantes. Também se articula a criação de cestas de produtos a serem vendidas para operários em um dia específico com as compras sendo previamente acertadas.
Leal afirma que os movimentos sociais estão conversando com o Governo para definir a operacionalização do programa e esperam ter este modelo pronto até o final de junho para que em julho já se possa iniciar os repasses.
O integrante do MPA afirma que o programa vai ser uma iniciativa ímpar, por apoiar uma camada de agricultores que está alijada da iniciativas de governos. “É um reconhecimento de uma forma de fazer agricultura que está marginalizada das políticas públicas do Estado brasileiro. Há políticas, como o PRONAF, que contribuem para uma camada mais bem posicionado. Para a grande massa do campo não existe programa de desenvolvimento de sua maneira de produzir, que é a agroecologia”, afirma.
Ele explica que o conceito de agricultura camponesa se difere do que se convencionou chamar de agricultura familiar por não estar atrelada à grande indústria, tendo mais autonomia. “A agricultura familiar contemplada por políticas públicas se especializa, faz monocultura, e é dependente de indústrias como Sadia, Nestlê, entre outras. Um aviário custa R$ 300 mil e muitas famílias quebraram quando a Sadia quebrou”, exemplifica. A agricultura camponesa, por sua vez, preza a produção diversificada, agroecológica e independente das grandes indústrias.
Um dos pontos importantes do programa é que este repasse vai ser feito para uma camada que está alijada de crédito bancário, destaca Leal. Outro aspecto de destaque é o incentivo à produção agroecológica. “O brasileiro consome em média 5,4 quilos de agrotóxico por ano”, afirma o dirigente do MPA.
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