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Síria: Cameron recua após derrota humilhante no parlamento
Por treze votos de diferença, o parlamento
britânico rejeitou dar luz verde a um ataque à Síria. A Casa Branca diz
que pode avançar sozinha, mas Obama está sob pressão para que seja o
Congresso a autorizar a escalada do conflito na Síria. E os militares
expressam dúvidas sobre o "efeito boomerang" de uma intervenção militar
apoiada por apenas 9% dos norte-americanos nas sondagens.
Cameron foi
traído pela sua própria bancada, Obama não quer negociar a autorização
do Congresso à intervenção militar na Síria. Foto PM britânico/Flickr
"Parece-me evidente que o Parlamento britânico, que reflete o ponto de
vista do povo britânico, não quer ver uma ação militar britânica. Eu
entendo e o governo irá agir em conformidade", lamentou o
primeiro-ministro David Cameron, ao ver derrotada por 285 votos contra
272 a sua proposta para participar num ataque militar à Síria, em
aliança com os EUA e a França.
Para além de uma humilhação sem precedentes para Cameron, a votação
revelou-se uma surpresa, já que pouco antes também fora chumbada - mas
por 114 votos de diferença - uma emenda proposta pelos trabalhistas. A
emenda pedia "provas convincentes" acerca dos ataques com armas químicas
relatados na semana passada, e que têm sido alvo de investigação por
uma equipa das Nações Unidas, antes de avançar para um ataque militar
contra Damasco.
A derrota de Cameron ficou a dever-se aos deputados da sua bancada, já
que a dos trabalhistas contava com cerca de trinta lugares vazios.
Segundo fontes parlamentares trabalhistas, 30 deputados conservadores e
11 liberais-democratas votaram contra a proposta do primeiro-ministro
que apoiam. E abstiveram-se na votação 14 conservadores e 13
liberais-democratas.
Obama sob pressão de congressistas e militares
Na Casa Branca, a reação foi lida pela porta-voz do Conselho de
Segurança Nacional, indicando que "o processo de decisão do presidente
Obama será conduzido de acordo com os melhores interesses dos EUA" e
que continuarão a consultar o aliado britânico, apesar de Londres ter
decidido não participar na operação militar conjunta.
Mas a pressão para Obama não avançar com os ataques sem autorização dos
Congresso aumentou esta quarta-feira, com uma carta subscrita por 98
congressistas republicanos e 18 democratas. "Mandar os nossos militares
para a Síria quando não existe nenhuma ameaça direta aos EUA sem
autorização prévia do Congresso violaria a separação de poderes que é
claramente delineada na Constituição", diz a carta dos congressistas a
Obama.
Numa resposta às críticas, Obama optou por enviar os responsáveis pelos
negócios estrangeiros, defesa e segurança nacional (John Kerry, Chuck
Hagel e Susan Rice), juntamente com responsáveis do Pentágono e dos
serviços secretos, para darem explicações aos dirigentes das bancadas
republicana e democrata. Para além da carta dos congressistas, os
líderes da Comissão de Informações do Congresso queixaram-se de não
estarem a ser devidamente informados dos planos de Obama. Segundo a
Reuters, até agora as conversas têm decorrido por telefone em linhas não
seguras, impedindo o conhecimento dos detalhes de toda a situação.
Na última semana, várias vozes de constitucionalistas questionaram a
legalidade da intervenção, já que apenas o Congresso tem o poder de
declarar uma guerra. E tem sido lembrada a declaração de John Kerry na
sessão de avaliação antes de tomar posse à frente da diplomacia na
administração Obama. "Uma resolução das Nações Unidas é um ingrediente
necessário para haver uma base legal que permita agir militarmente em
caso de emergência", declarou Kerry em janeiro, quando substituiu
Hillary Clinton.
Mas as dúvidas sobre a intervenção também alastram entre os militares, a
começar pela liderança. O chefe de Estado Maior das Forças Armadas e
principal conselheiro militar da Casa Branca lançou a dúvida sobre as
consequências de um ataque. "Aprendemos nos últimos dez anos que não
basta alterar o balanço do poder militar sem pensar cuidadosamente no
que é preciso para preservar um Estado que funcione" , afirmou o general
Martin Dempsey no início desta semana.
"Temos de prever e estarmos preparados para as consequências
indesejáveis da nossa ação. Se as instituições do regime colapsam e não
há uma oposição viável, podemos inadvertidamente reforçar os extremistas
ou até libertar as mesmas armas químicas que queremos controlar",
alertou o líder militar dos EUA. Uma leitura que é partilhada por outros
militares e especialistas em relações internacionais, ao sublinharem o
facto de que o protesto contra Bashar al-Assad começou por ser liderado
por militantes pró-democracia, mas que hoje em dia o protagonismo vai
para os extremistas islâmicos que vêm nos EUA e em Israel os principais
inimigos.
Norte-americanos não querem guerra na Síria, mesmo que haja ataques com armas químicas
A par das dúvidas sobre o sucesso dos bombardeamentos para a estratégia
dos EUA na região, Obama tem também de enfrentar uma opinião pública
que é desfavorável à intervenção. Uma sondagem da Reuters/Ipsos feita
entre 19 e 23 de agosto, já com as notícias sobre ataques de armas
químicas atribuídos ao regime de Assad, mostrou que apenas 9% dos
inquiridos apoiavam a intervenção.
Questionados sobre a eventualidade de se provar que o regime usou armas
químicas contra civis, o número de apoiantes do ataque à Síria subiu
para 25%, com 46% a dizer que mesmo assim não concordam com uma ação
militar. Comparada com a mesma sondagem feita dez dias antes, o
resultado mostra o declínio no apoio à guerra, mesmo com o recurso a
armas químicas, o argumento usado por Obama para intervir militarmente
na Síria.
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