Os governos de oito países anunciaram terça-feira 29, a expulsão dos embaixadores e outros diplomatas da Síria, num movimento coordenado de represália contra o chamado massacre de Houla, que deixou pelo menos 90 pessoas mortas na sexta-feira passada, 32 delas crianças. A expulsão dos embaixadores, se por um lado revela o desejo do Ocidente de se contrapor ao ditador Bashar al-Assad, por outro expõe a incapacidade da comunidade internacional como um todo de buscar alternativas viáveis para estancar a violência na Síria.
Na prática, a expulsão dos embaixadores tem pouco significado. Os diálogos entre os países ocidentais e o governo da Síria estavam suspensos já há muito tempo. Estados Unidos, França e Reino Unido, os três membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas que pressionam por sanções contra o governo Assad, comandaram a expulsão. Outros cinco governos alinhados a este trio, Alemanha, Austrália, Canadá, Espanha e Itália, fizeram o mesmo. Na Rússia e na China, aliadas ao governo Assad, as representações diplomáticas sírias continuam funcionando normalmente.
Enquanto este impasse persistir, a comunidade internacional continuará apegada a iniciativas cosméticas, como o “processo de paz” liderado pelo ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan. Enviado especial para a Síria, Annan esteve nesta terça-feira em Damasco. Em conversa com Assad, Annan classificou o massacre de “horrendo” e afirmou que seu plano de paz só vai funcionar se Assad “tomar atitudes corajosas para acabar com a violência e libertar prisioneiros”.
A missão de Annan é quixotesca. Hoje, Assad não tem motivos para encerrar a campanha violenta contra seus opositores que mantém desde março do ano passado. Por três motivos. Em primeiro lugar, porque boa parte da sociedade síria continua apoiando seu governo, por medo de quem pode substituí-lo. Em segundo lugar, porque o apoio diplomático da Rússia e da China serve como encorajamento na luta contra os grupos opositores classificados por Assad como “terroristas”. Em terceiro lugar, porque a comunidade internacional já atua de forma clandestina na Síria. Como mostrou CartaCapital há duas semanas, países como a Arábia Saudita e os Estados Unidos dão apoio aos rebeldes rivais de Assad. Ao mesmo tempo, o Irã segue apoiando o regime sírio, seu maior aliado na região. Na segunda-feira 28, o chefe da Força Quds, uma tropa de elite da Força Revolucionária do Irã, admitiu que agentes iranianos estão atuando dentro da Síria.
Diante desta divisão diplomática, da importância geopolítica da Síria e do acentuado sectarismo religioso no país, a opção de uma ação armada unilateral, semelhante à que ocorreu na Líbia, segue descartada. Os países ocidentais têm várias preocupações reais quanto a uma intervenção. A primeira é entrar num conflito que, em pouco tempo, pode transformar a Síria num novo Iraque pós-invasão norte-americana de 2003. A segunda é espalhar o conflito para outros países. Mesmo sem intervenção, entretanto, essas duas consequências podem se tornar realidade. Dentro da Síria, a violência sectária está cada vez mais inflamada. No Líbano, país vizinho, os temores de uma retomada da guerra civil são cada vez maiores. Outro temor é que um conflito na Síria se torne um confronto aberto entre as potências ocidentais e o Irã e, no limite, a Rússia, uma batalha cujas consequências são imprevisíveis.
Hoje, a alternativa mais factível para um desfecho aceitável da crise é Assad aceitar um plano de transição incluindo sua saída da presidência da Síria. Para viabilizar essa proposta, semelhante à aplicada no Iêmen, os Estados Unidos estão tentando obter o apoio da Rússia para a iniciativa. Mesmo se este consenso for obtido, há dúvidas quanto à aceitação do plano por parte de aliados de Assad e dos setores da sociedade síria que apoiam o ditador.
Como se vê, a Síria se tornou um desafio colossal para a forma como as decisões são tomadas na comunidade internacional. Mesmo diante de um massacre, que incluiu segundo a ONU execuções sumárias de crianças, os políticos do mundo seguem em estado de paralisia.
Carta Capital
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