Diante de invasão chinesa no continente africano, Brasil aposta nas cooperações técnicas para agricultura
Por Bruno de Pierro, no Brasilianas.org
Da Agência Dinheiro Vivo
Da Agência Dinheiro Vivo
A China tem desempenhado movimento de colonização perverso
na África. A nova versão de imperialismo consiste em impedir o
desenvolvimento de empresas nascentes, ao promover um dumping indireto. A
avaliação é de Abel Domingos, presidente da Câmara de Comércio
Afro-Brasileira. Para ele, pior do que reforçar a destruição da
indústria em alguns países, desvalorizando a moeda e utilizando mão de
obra barata, a China tem exercido pressão desfavorável às novas empresas
africanas. “Os produtos chineses extremamente baratos invadiram a
África”, que possui mercado interno em ascensão em muitos países, como
Cabo Verde e São Tomé.
A atuação chinesa no continente preocupa o Brasil, que na última
década intensificou o intercâmbio comercial com países africanos e vê na
África grandes oportunidades de expansão agrícola e de investimentos em
infraestrutura. Diante da ameaça do bombardeio de manufaturas chinesas,
um caminho que tem sido perseguido pelo Brasil é no sentido de investir
na aproximação diplomática com países africanos, baseada em cooperações
técnicas para o desenvolvimento da agricultura promovidas pela Embrapa e
pelo Itamaraty.Segundo estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU), a população mundial chegará a 9,2 bilhões até 2050, o que exigirá aumento de até 90% na produção de alimentos. A perspectiva é de que a África deva contribuir com 17% nesta produção. Hoje, no entanto, boa parte dos 54 países do continente mal consegue alimentar a si mesma.
“Existe potencial, mas obviamente há problemas de organização de produção, infraestrutura e sustentabilidade. A África precisa de um modelo diferenciado, ela precisa construir o seu modelo próprio, para poder se alimentar e ter uma contribuição significativa na produção de alimentos para 2050”, explicou o diretor-presidente da Embrapa, Pedro Arraes, durante o programa Brasilianas.org da última segunda-feira (21).
As conquistas do Brasil na agricultura tropical podem ser adaptadas na realidade africana, e este deve ser o foco do país frente à concorrência da China. Para Arraes, “nosso papel é o de transferir tecnologias, para que os africanos possam aprender conosco e possam criar soluções”. Em contrapartida, o Brasil pode promover uma expansão da fronteira agrícola.
Para o ministro Nedilson Ricardo Jorge, diretor do Departamento de África do Itamaraty, a realidade africana de hoje é muito melhor do que há 30 anos. “Com a Guerra Fria houve dificuldade de atuação empresarial; hoje, a presença brasileira está mais favorável, com mais estabilidade política e com previsão de crescimento que não pode ser ignorada”, declarou. Os avanços da diplomacia brasileira na África são evidentes. Até o final de 2002, havia apenas 18 embaixadas brasileiras em território africano; atualmente, são 37.
Marca Brasil
Um dos motivos que facilitam a expansão da presença brasileira é o atual status que a imagem do Brasil alcançou no continente. Os produtos brasileiros, por mais que enfrentem a China, ainda provocam o interesse em muitos países africanos. Prova disto é o abastecimento do mercado africano com produtos asiáticos que colocam a marca “Brasil” ilegalmente, aproveitando a popularidade brasileira na África. Isso porque, por mais que os produtos chineses invadam a região, o Brasil ainda é o país-modelo para os africanos, por ter conseguido, nos últimos anos, retirar milhões de pessoas da situação de miséria, com programas como o Bolsa Família, de transferência de renda, e ter conseguido superar momentos críticos da crise econômica mundial com medidas que fortaleceram o mercado interno.
“O reflexo de uma empresa brasileira no exterior é sentido no campo político e diplomático, e o Itamaraty acompanha isso”, disse o ministro. Uma caracteristica que favorece a imagem brasileira na África é a maneira como as empresas daqui se fixam no território estrangeiro. Quando uma empresa brasileira vai para a África, contou Nedilson, ela acaba interagindo com moradores e pequenas empresas locais, com os funcionários brasileiros exercendo papel fundamental, ao promover festas, churrascos e confraternizações com os colegas africanos. “É exatamente o contrário de empresas de outros países, que acabam se isolando”. Além disso, o Brasil tem a maior parte dos recursos nacionais que existem na África, facilitando a exploração dos recursos pelo país, já que tem conhecimento prévio.
Questionado sobre possíveis irregularidades trabalhistas que possam ser praticadas por companhias brasileiras na África, o representante do Itamaraty disse que a atuação delas tem sido acompanhada pelo governo. “Não temos problemas significativos. As empresas são demandadas pelos próprios africanos”, ponderou.
As cooperações
Os setores com mais demandas de investimentos nas África são mineração, infraestrutura, construção civil, psicultura e agropecuária. De acordo com Abel Domingos, não faltam investimentos do BNDES para quem queira ir para o continente africano. “Precisa sim é ter disposição. A África está ávida para formar parcerias”, argumentou.
No caso do agronegócio, a Embrapa tem dado conta desta sede por desenvolvimento. A empresa brasileira criou o Portal África, em março deste ano, em parceria com a Abimaq (Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos), para disponibilizar um banco de dados, em tempo real, sobre as tecnologias agrícolas e os equipamentos desenvolvidos pela Embrapa voltados para a agricultura tropical. A idéia é que os produtores africanos possam conhecer as ferramentas e também as condições de uso.
“A Embrapa pode ser um braço para levar a iniciativa nacional para a África”, disse Arraes, completando que no continente também existem instituições capacitadas, mas que necessitam de melhor prepara técnico e de projetos estruturantes.
Outro exemplo do trabalho da Embrapa na África é o chamado Projeto Norte-Sul-Sul, uma parceria entre Japão, Brasil e Moçambique, para a instalação de agricultura de médio padrão. Os japoneses vão entrar com as obras de infraestrutura e o Brasil com a tecnologia e experiências de políticas públicas. Em Mali, país localizado na África Ocidental, a Embrapa também já realizou a transferência de tecnologia para o cultivo de algodão, por meio da instalação de um centro de pesquisa.
Em termos de gestão da inovação, a empresa brasileira desenvolveu, junto a bancos e instituições internacionais, como o Banco Mundial, uma plataforma eletrônica para que pesquisadores do mundo inteiro conversem sobre pesquisas agrícolas. Como resultados, 114 propostas foram selecionadas e 50 pesquisadores africanos virão, em agosto, para o Brasil, com a finalidade de desenvolverem seus projetos. Arraes afirmou que o modelo já tem sido copiado por outros países.
“No ano passado, recebemos mais de 500 africanos para aprender nossas técnicas agricolas e também como gerir recursos humanos. Assim, eles podem voltar e assumir as pesquisas na África”, explicou.
O Itamaraty também mantém a Agência Brasileira de Cooperação, que atua em projetos de cooperação técnica na África, envolvendo 45 países e mais de 300 projetos nas áreas de saúde, educação, agricultura e fortalecimento institucional.
Sobre possíveis parcerias entre Embrapa e China, Arraes disse que ainda não há nada em vista. “Mas com o Reino Unido temos uma parceria de US$ 12 milhões, para treinamentos em nosso centro de treinamentos”.
“Não devemos singularizar a China como único competidor”, salientou Nedilson Ricardo Jorge, do Itamaraty. No caso da China, disse ele, não há colisão com os interesses brasileiros. Há, sim, visões semelhantes sobre o desenvolvimento do continente africano, e se há competição, “é apenas nas licitações, no campo diplomático há muito diálogo”.
De fato, a atuação brasileira tem o objetivo claro de ir além do intercâmbio comercial, destacando-se mais como um “exportador de desenvolvimento”, fundamentado na inovação e na tecnologia. Para isso, tem um conjunto de grandes empresas, que vão de Petrobras, Vale, Odebrecht, Camargo Corrêa até a própria Embrapa, e outro grupo, formado por empresas de médio e pequeno porte - cerca de 400 - que também mantém relações comerciais com a África.
A maior barreira, no entanto, não é de competência tecnológica ou científica. Continua sendo o Custo Brasil e os problemas de taxa de câmbio elevada. A Angola, por exemplo, principal parceiro comercial do Brasil na África, possui um modelo essencialmente de agricultura familiar e que anseia pelo know how brasileiro. isso significa poder oferecer produtos e máquinas mais baratos para esse mercado.
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