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terça-feira, 22 de novembro de 2016
Defesa de Lula diz na cara de Moro que ele age como acusador e afronta as leis 22/11/2016
Cíntia Alves
Advogados disseram na cara de Moro que ele é processado justamente por fazer coisas que um juiz de primeira instância não deveria fazer, como ser permissivo e produzir provas em favor do Ministério Público, impedir a defesa de usar a palavra e questionar sobre crimes que não são objeto da ação ou que estão fora de sua alçada
Jornal GGN – A primeira audiência do caso tríplex contra Lula, realizada nesta segunda (21), em Curitiba (PR), foi marcada por um intenso bate-boca entre o juiz federal Sergio Moro e os advogados do ex-presidente. A maioria dos veículos da grande mídia reportaram o episódio de maneira discreta e sem apontar os “erros” e “arbitrariedades” cometidos por Moro durante o depoimento do senador cassado Delcídio do Amaral.
A defesa não se intimidou diante das decisões de Moro e disse, na cara do magistrado, que ele é “suspeito” para julgar Lula justamente por adotar uma postura que beneficia o Ministério Público Federal em suas acusações, além de ser muito subjetivo na interpretação do Código Penal – chegando a extrapolar suas funções e afrontar o Supremo Tribunal Federal – o que significaria um "cerceamento do direito de defesa".
Os advogados de Lula também denotaram que estão certos em processar Moro por seu comportamento permissivo e por produzir provas para a acusação, por induzir as respostas da testemunha contra o ex-presidente e por fazer seus questionamentos depois da defesa – sem permitir novos esclarecimentos em favor da defesa. Um dos defensores chegou a dizer que o magistrado não respeita a Constituição.
Além disso, Moro também foi acusado de produzir provas contra Lula para outros processos ao fazer questões que não estão na ação sobre o tríplex – como a suposta tentativa de obstrução da Lava Jato pelo ex-presidente em conluio com Delcídio, investigada pelo Supremo.
Já no primeiro vídeo da audiência, divulgado pelo Estadão, o clima esquentou entre Moro e os advogados de Lula, entre eles Cristiano Zanin Martins e Roberto Batochio.
Tudo começou porque Moro impediu a defesa de produzir uma série de provas que, analisadas num contexto mais amplo, mostrariam, por exemplo, que Lula, enquanto presidente, não favoreceu a OAS em detrimento de outras empresas e que, na Petrobras, o ex-presidente não atuava diretamente no processo de contratação de obras e serviços. Entre os requerimentos rejeitados estava o levantamento de todas as licitações da estatal nos últimos 13 anos.
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O juiz negou esses procedimentos à defesa alegando que a acusação do Ministério Público contra Lula se resume a três contratos entre OAS e Petrobras para obras nas refinarias de Abreu e Lima e Getúlio Vargas, que somariam R$ 87 milhões em propinas pagas aos ex-diretores Paulo Roberto Costa e Renato Duque.
Os procuradores alegam que Lula se beneficiou desse esquema na Petrobras de três maneiras: primeiro, garantiu governabilidade, pois a propina abastecia o caixa de partidos aliados. Depois, recebeu da OAS, como contrapartida pessoal e de maneira oculta, o tríplex no Guarujá e pouco mais de R$ 1 milhão que foram gastos pelo grupo na manutenção do acervo presidencial.
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Mas, durante a inquirição de Delcídio do Amaral, a Procuradoria da República começou a ampliar o escopo da acusação e fazer perguntas genéricas, chegando, até mesmo, a abordar o caso do sítio de Atibaia, que nada tem a ver com o processo em questão.
Quando o MP questionou, de maneira ampla, a relação de Lula com empresários, Zanin – que já havia dito a Moro que não era "razoável” que a acusação pudesse produzir provas fora do escopo da acusação, e a defesa, não – interrompeu a audiência com uma questão de ordem.
Zanin: Vossa Excelência, pela ordem, estamos falando de três contratos celebrados com uma empreiteira.
Moro: É o contexto. Vamos colocar uma coisa assim: existe uma dinâmica na audiência, a defesa pode perguntar, mas se houver interferência da defesa toda hora na inquisição... Vamos encerrar no final do dia!
Zanin: Eu gostaria que vossa excelência me ouvisse...
Moro: Existe um contexto, doutor, e essa pergunta está dentro do contexto.
Zanin: Vossa Excelência permite que eu faça uma ponderação sem ser interrompido? Eu gostaria de fazer uma questão de ordem. Quando nós pedimos a produção de provas, a vossa Excelência foi muito claro ao dizer que a acusação se restringia a três contratos...
Moro: A defesa exigiu a cópia de todas as atas de licitações dos contratos da Petrobras em 13 anos. É diferente de o Ministério Público fazer uma pergunta à testemunha nesse momento.
Zanin: Excelência, nós pedimos...
Moro: Está indeferida, doutor, essa questão.
Zanin: É que eu gostaria de, pelo menos, fazer as ponderações sem que Vossa Excelência interferisse...
Moro: No momento próprio, a defesa pode fazer as ponderações. Agora estamos ouvindo as testemunhas e a palavra está com o Ministério Público.
Zanin: Mas é uma questão de ordem, Excelência, e Vossa Excelência tem que me ouvir! É uma questão de ordem!
Moro: A defesa, pelo jeito, vai ficar levantando questão de ordem a cada dois minutos! É inapropriado, doutor. Está tumultuando a audiência!!!
Batochio: Pode ser inapropriado, mas é perfeitamente jurídico e legal. O juiz preside, o regime é presidencialista, mas o juiz não é o dono do processo. Aqui os limites são a lei. A lei é a medida de todas as coisas. E a lei, no processo, disciplina esta audiência. A defesa tem direito de fazer uso da palavra pela ordem para arguir questão de ordem. Ou, se Vossa Excelência quiser eliminar a defesa - e eu imaginei que isso tivesse sido sepultado em 1945 (...). Se Vossa Excelência quiser suprimir a defesa, acho que não tem necessidade nenhuma de continuarmos essa audiência.
Moro: Doutor, a defesa está tumultuando, apresentando questão de ordem atrás de questão de ordem, não permitindo que o Ministério Publico produza a prova. Tanto o Ministério Público tem direito de produzir a prova, quanto a defesa.
Terceiro advogado: Na verdade, o que queremos impedir é o induzimento da resposta. Que o doutor faça perguntas que não tem relação com a causa. A causa está delimitada a três contratos.
Moro: Doutor, essa questão já foi apreciada. Há um contexto, e o Juízo está permitindo.
Terceiro advogado: Contexto? Que contexto?! Esse contexto só existe na cabeça de Vossa Excelência! O contexto, para nós, é a denúncia. Pedimos que o Ministério Público se restrinja à denúncia...
A discussão começa a partir dos 21 minutos do vídeo abaixo.
O clima continou tenso durante a fase em que a defesa fez questionamento a Delcídio, momento em que o senador cassado não apresentou provas materiais das alegações que faz contra Lula. Ao Ministério Público, ele também afirmou que nunca conversou com o ex-presidente sobre ilicitudes e que tudo que sabe e relatou em sua delação premiada, ele "ouviu dizer" de pessoas com acesso à Petrobras.
Moro, o procurador-juiz
Ao final da audiência, Moro decidiu fazer questionamentos a Delcídio. A banca de advogados de Lula reclamou porque, dessa maneira, o juiz impediu a ampla defesa, já que não poderiam ser feitas novas perguntas em favor do ex-presidente. Batochio chegou a dizer que isso era uma aberração diante da devida interpretação do Código Penal. Moro rebateu dizendo que a interpretação cabe a ele fazer. Os advogados também apontaram que o magistrado “colocou palavras na boca da testemunha”, induzindo o interrogatório sobre corrupção na Petrobras.
“A suspeição de Vossa Excelência [apresentada em ação no TRF-4] resulta exatamente disso. É que Vossa Excelência se coloca na posição do Ministério Público. Vossa Excelência, que não pode produzir provas na audiência, quer produzir provas! Está trazendo para o processo questões que não foram objeto de questionamentos nessa audiência. É por isso que Vossa Excelência continua sendo suspeito”, exclamou um dos advogados.
O confronto voltou a ser explosivo quando Moro quis ouvir Delcídio sobre a participação de Lula na tentativa de comprar o silêncio de Nestor Cerveró. A defesa do senador cassado e do ex-presidente pediram que isso não fosse abordado porque é um caso que corre sob batuta do Supremo. “O Supremo disse que Vossa Excelência não tem competência para tratar desse caso. Vossa Excelência está afrontando o Supremo agora”, comentou Zanin. “Mas há um contexto que o Juízo reputa relevante e por isso estou fazendo a pergunta”, rebateu Moro.
A resposta de Delcidio foi que Lula, "uma vez", comentou com ele que estava preocupado com a situação de José Carlos Bumlai na Lava Jato, inclusive quanto à possibilidade de ele ser delatado por Cerveró. À Procuradoria, ele já havia dito que tentou comprar o silêncio de Cerveró a mando de Lula. Mas há uma série de indícios demonstrando que, na verdade, Delcídio, que atuava na Petrobras desde FHC, estava tentando salvar a si próprio e, pego em flagrante, centrou sua delação em Lula para sair da prisão.
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Ao final da audiência, a defesa de Lula se disse "satisfeita" com o fato de todas as cinco testemunhas ouvidas (além de Delcídio, empresários) não terem apresentado provas de que ele é dono do triplex.
Batochio, porém, avaliou que tudo indica que Moro vai condenar o ex-presidente “pelo contexto probatório", embora a "prova incriminadora", no processo, seja "zero".
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