Por Miguel do Rosário
A grande mídia continua fazendo um excelente trabalho de contra-informação quando o assunto é Henrique Pizzolato e mensalão. Os leitores têm de tomar muito cuidado. O mensalão sempre foi uma operação eminentemente midiática. E continua sendo. Os mesmos grupos que fizeram o que fizeram, não só durante o julgamento da Ação Penal 470, mas antes, durante a montagem da peça de acusação, continuam agindo. Eles vão usar todas as suas armas agora para desmoralizar Pizzolato porque entendem que isso será necessário para minimizar os contra-ataques que podem vir da Justiça italiana.
Diariamente os jornais trazem notícias pretensamente “bombásticas” sobre Pizzolato. O importante é desconstruir, ao máximo, a sua figura, e criar uma agenda negativa para se contrapor à campanha de solidariedade aos réus petistas que vem constrangendo profundamente a mídia.
Matéria do Globo hoje, por exemplo, desinforma muito mais do que qualquer outra coisa. O subtítulo é genial: “Extratos encontrados na Itália apontam operações em muitos países europeus”. Qual a intenção agora? Pintar Pizzolato como um grande criminoso internacional, chefe das máfias em vários lugares do mundo?
O que há de concreto sobre o fugitivo é o seguinte:
1 – Sua fuga foi completamente atabalhoada. Apesar de, supostamente, tê-la planejado desde 2008, quando renovou os documentos do irmão, Pizzolato fugiu pela Argentina usando o cartão de crédito da própria mulher. O fato de usar os documentos do irmão também não pressupõe nenhuma sofisticada mente criminosa. Não quero justificar, mas temos que manter as proporções. Tudo que Pizzolato fez se deu após a constatação de que a guilhotina de uma Justiça falsa iria desabar fatalmente sobre seu pescoço.
2 – Pizzolato foi preso na casa de seu sobrinho, e todo mundo sabia que ele tinha um sobrinho na Itália, o que mostra uma total falta de cuidado. Parecia que Pizzolato queria ser pego. Ao apresentar os documentos de seu irmão à polícia, Pizzolato também se mostrou uma pessoa completamente despreparada. É o anti-criminoso por excelência. É prova também que não havia “nenhum grupo forte” por trás de Pizzolato, conforme se aventou meses atrás. Até agora tem sido defendido por um advogado indicado pela polícia, ou seja, se não é um advogado público ou gratuito, é o mais barato possível. Aliás, espero que seja um bom advogado, ou então que Pizzolato tenha condições de contratar o melhor advogado criminal possível.
3 – Ele ficou no Brasil até o último dia possível, trabalhando 24 horas em sua defesa. Não se escondeu. Foi a diversos eventos do PT onde explicava o que acontecia. Fazia reuniões com jornalistas, militantes, curiosos, tentando mostrar a sua versão dos fatos. Não era, nem de longe, o comportamento de um criminoso. Sempre teve o comportamento de um cidadão angustiado para provar sua inocência.
4 – Até agora, a polícia italiana, encontrou extratos que falam de somente de 30 mil euros, quantia irrisória para um alto executivo do Banco do Brasil e sua esposa arquiteta. No entanto, é possível que Pizzolato tenha mais dinheiro guardado, dinheiro seu, próprio, acumulado em mais de 40 anos de trabalho, conforme explicarei mais abaixo.
5 – A matéria do Globo fala de contas em “vários países”. No subtítulo, troca-se “vários” por “muitos”. Uma mudança sutil, mas importante e maliciosa. A única informação concreta da polícia italiana é que Pizzolato e sua esposa tinham contas na Espanha. Pizzolato praticamente morou na Espanha entre 2006 e setembro 2012. Se quisesse fugir, aliás, teria fugido nesse período. Provavelmente abriu uma ou mais contas na Espanha nessa época. Quando fugiu, deve ter raspado todo o dinheiro que possuía. Daí as “várias operações”.
6 – A irmã de Pizzolato era (ainda é, pelo que eu sei) diarista em hospital e casas de famílias há muitos anos na Espanha. Pizzolato a ajudava financeiramente sempre que podia, e também a ajudou a resolver alguns problemas familiares que aconteceram por lá nos últimos anos.
7 – Até o momento, portanto, Pizzolato tinha contas na Espanha, onde sua irmã residia, e na Itália, onde mora desde que para lá fugiu. Os “muitos países” do subtítulo, até o momento, são apenas dois, com explicações concretas para tal.
8 – Reproduzo abaixo um comentário que publiquei, há alguns dias, como resposta a um internauta que me fez perguntas sobre a tal conta na Suíça de Pizzolato, sobre a qual não há, até o momento, nenhum rastro.
“Não sei, Luis. Pode ser mentira, pode ser uma verdade mal contada. Também desencanei dessa história. O fogo é saber que a mídia jamais vai querer explicar as coisas direito. Sempre haverá essa terrível má-intenção deliberada, que é uma coisa sinistra nessa história do mensalão. O interesse político está muito acima do interesse pela verdade.
Pizzolato é hoje o brasileiro com a vida mais devassada do mundo. Não conheço tanto assim o Pizzolato, mas pelo descobri, dele mesmo e de terceiros, ele vendeu tudo que tinha e deu pra mulher. Pizzolato não era pobre. Algumas vezes eu uso demais a mim mesmo como referência e acabo esquecendo que nem todo mundo é duro. Ele era de família tradicional do Paraná, de imigrantes trabalhadores e poupadores como ainda vemos no interior do sul do país. Começou a trabalhar muito cedo no Banco do Brasil e se tornou graduado por eleições internas. Foi o primeiro sindicalista eleito pelos próprios funcionários. Antes, só os funcionários indicados pelo alto galgavam postos na empresa. Um amigo dele me contou que Pizzolato era um dos raros funcionários do BB que nunca usou cheque especial. Ele e a esposa sempre foram muito disciplinados com dinheiro. A esposa era arquiteta e fazia projetos. Em 30 ou 40 anos de Banco do Brasil, ele morou em umas 10 cidades, em todas sempre adquiria a casa ou apartamento onde residiu. Sem contar que Pizzolato trabalhou por bastante tempo no Conselho da Previ (sempre indicado democraticamente pelos funcionários), e ganhava muito bem por essa função.
Uma jornalista do Correio Braziliense descobriu e publicou reportagem há alguns dias trazendo todos os dados fiscais de Pizzolato até 2005. No imposto de renda, ele tinha cerca de dez imóveis, todos adquiridos antes do governo Lula. Parece que tinha uma bela casa de praia em camboriu, Santa Catarina. Esse imóveis eram avaliados pela receita, em números não atualizados, em 2 milhões de reais. Com o preço desses imóveis atualizados, esse valor pode dobrar ou triplicar. Ou quadruplicar, sei lá.
Se ele mandou esse dinheiro para o exterior, não sei. Pizzolato já sabia que estava lascado. O caso dele, juridicamente, é o mais difícil de virar, porque ele foi condenado por todos, até mesmo pelo Lewandoswki, que embarcou na onda do Visanet.
Se tudo que eu penso que aconteceu, realmente aconteceu, se Pizzolato foi vítima de uma armação jurídica, então eu serei o último a culpá-lo por planejar sua fuga, que naturalmente envolve segurança financeira no lugar para onde você vai. Eu nunca recriminarei a busca pela liberdade. Se um indivíduo acredita realmente na sua inocência, ele tem todo o direito de fugir, se achar que é a única saída que possui para continuar lutando por sua dignidade.”
9 – A campanha de solidariedade aos petistas tem um limite. Ela representa uma postura de enfrentamento. Mas um enfrentamento (paradoxalmente) passivo, quase desesperado, estéril. A verdadeira luta contra as arbitrariedades da Ação Penal 470 se dá no debate sobre o mérito das acusações. E aí é que Pizzolato constitui uma figura central, porque a sua condenação se deu contra as provas. Pizzolato tinha provas de que ele não era responsável pelo Visanet, que o Visanet era 100% privado, e que não foi desviado. Mais ainda, Pizzolato foi o réu mais prejudicado pela ocultação de provas feita por Joaquim Barbosa. O laudo 2828 foi escondido. O inquérito 2474 foi escondido. Tudo isso prejudicou profundamente a defesa de Pizzolato e outros réus. Além disso, Pizzolato não era parlamentar, nunca foi, e foi julgado diretamente no STF, sem direito a um segundo grau de jurisdição, contrariando a Constituição e os tratados internacionais de direitos humanos assinados pelo Brasil. Outros réus foram vítimas da mesma arbitrariedade, já que apenas dois ou três, de um total de 39, tinham mandato parlamentar.
10 – Pizzolato foi vítima ainda da estratégia de “fatiamento”, essa jogada de gênio (do mal) de Barbosa, feita em cima da hora, pegando de surpresa até mesmo o relator do processo, Lewandowski. A estratégia forçou os réus, seus advogados e a militância a se aferrarem aos casos individuais, ao invés de discutir o todo, o mérito de todo o processo. Com isso, os réus se isolaram em suas próprias defesas. Os militantes e amigos de Dirceu se apegaram somente a seu caso, e assim por diante. Pizzolato, que nunca fez parte de nenhuma corrente do PT, ficou totalmente isolado, só com um ou dois amigos a seu redor. O caso Pizzolato só irá ganhar notoriedade junto a seu próprio campo após as reportagens de Raimundo Pereira na Retrato do Brasil. Mas aí já era tarde demais.
11 – Não sei que espécie de inteligência esteve por trás de tantas maquinações. Mas sei que houve maquinação. Conversando com um deputado federal que viveu intensamente aqueles primeiros anos do mensalão, ele me contou algumas coisas interessantes. Ele me contou, por exemplo, que o então presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, foi convidado a ir a São Paulo por um grupo de empresários. Lá, fizeram-lhe uma proposta. Que ele renunciasse à presidência. Em seu lugar, entraria o deptuado Thomaz Nonô, do então PFL-AL, o qual aceitaria o pedido de impeachment do presidente Lula. Mesmo que o Congresso não aceitasse, o pedido serviria para desgastar politicamente o presidente. Cavalcanti não aceitou, em nome da afinidade que sentia com um homem de sua própria terra, vindo da mesmas origens populares como ele próprio. O que pode ter salvado o país, portanto, foi a velha honra pernambucana.
12 – O mesmo deputado (o que conversava comigo, não o Severino) fez a seguinte avaliação de conjuntura. “Não sei quem esteve por detrás disso, Miguel, mas eles tiveram sucesso em sua estratégia: que era evitar a construção de uma hegemonia de esquerda no parlmento, sobretudo do Partido dos Trabalhadores. Não fosse o mensalão, o PT elegeria mais deputados. Não haveria a cisão que criou o PSOL. E o governo ficaria menos dependente de acordos com a direita para garantir a governabilidade.”
13 – Eu complementei e o deputado concordou: “Naquela época, Dirceu vinha dando entrevistas fazendo uma defesa da união da América do Sul. Lembro-me de uma entrevista que Dirceu falou inclusive da criação de uma moeda única para todo o continente. Falou em instituir espanhol nas escolas públicas. Isso com certeza apavorou alguns poderosos lá do norte.”
14 – Eu continuei, ainda com anuência do parlamentar: “Apesar de ser considerado, dentro do PT, representante de uma vertente mais conservadora, Dirceu era o quadro mais temido pela direita, por causa de seu entendimento sobre a conjuntura global. Dirceu era o quadro intelectualmente mais bem preparado do Partido dos Trabalhadores, e seria um perigo que ele ganhasse a presidência, porque poderia iniciar ações concretas para realizar o seu objetivo de unir a América do Sul num só bloco político e econômico.”
15 – Tenho mais documentos e informações sobre o caso Pizzolato, que destróiem mais ainda a farsa. Mas antes de entrar nessa seara, eu precisava fazer uma marcação política, quase semiótica, sobre o caso. Volto ao assunto em breve.
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