Rillo: No mesmo dia em que assessor de Capez confessa ter feito parte do esquema da Máfia da Merenda, mesa diretora da Assembleia aposenta-o com todos os direitos
por João Paulo Rillo, especial para o Viomundo
Em um ano de retrocessos, perdas de direitos, de liberdades, aprofundamento das desigualdades, uma comemoração é possível.
As lideranças estudantis de São Paulo, disputando espaço em um estado pródigo em movimentos de extrema direita, protagonizaram um dos mais coerentes atos políticos de 2016.
Em 2015, com as ocupações dos colégios, essa galera conseguiu sepultar a infeliz “reorganização” escolar do governador Geraldo Alckmin (PSDB).
É dessa galera também o crédito pela instalação, em maio deste ano, da CPI da Merenda.
Diante da resistência dos aliados de Alckmin em criar uma comissão para investigar o poderoso esquema de fraudes na merenda das escolas estaduais, os estudantes ocuparam a Assembleia Legislativa no início de maio.
Eles foram alvo de iniciativas violentas de desocupação, rechaçadas por apoios de uns poucos deputados (veja PS 1) ao lado de artistas comprometidos, como os músicos Edgard Scandurra, Chico César, Fernando Anitelli, e os atores Gero Camilo e Pascoal da Conceição.
O movimento, reforçado pela sociedade, acuou os parlamentares da base do governador e, em 25 de maio, foi aprovada a instalação da CPI da Merenda.
A vitória dos estudantes enfrentou o primeiro desafio durante a composição da comissão formada, na maioria, por deputados aliados do governo.
Mais uma vez, os estudantes e a sociedade fizeram o contraponto às manobras e articulações da base aliada comprometida em blindar o governo Alckmin.
A cada reunião, uma batalha. De um lado, parlamentares preocupados basicamente em preservar o governador. Do outro, em bem menor número, os dispostos a apurar responsabilidades.
Um dos principais momentos desse embate entre duas posições antagônicas se deu durante o depoimento da figura central do escândalo: o deputado tucano e ex-promotor Fernando Capez, presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).
O próprio Capez experimentou essa dualidade ao ver-se limitado a se defender sem envolver os altos escalões do governo, com margem estreitíssima de manobra.
Esforço em vão. Um esquema tão extenso, instalado há tanto tempo, jamais passaria despercebido ou seria viabilizado apenas com a atuação das cooperativas e de lobistas.
Só que, ao contrário do que alardeia, o governo Alckmin não foi ludibriado, não. Ele é parte central do esquema.
Em 19 de janeiro, vale relembrar, funcionários da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf), foram presos na Operação Alba Branca, deflagrada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público Estadual.
Eles disseram que os servidores públicos Jeter Rodrigues Pereira, José Merivaldo dos Santos e Luiz Carlos Gutierrez teriam atuado como intermediários no recebimento de propinas que seriam pagas a Capez por integrantes da Máfia da Merenda. Na época do suposto pagamento, em 2015, os três estavam lotados no gabinete do deputado tucano.
Em 22 de janeiro, o esquema veio a público em matéria do Estadão intitulada “Investigados ligam Capez a propinas”.
No mesmo dia, Augusto Eduardo de Souza Rossini, então Secretário Geral de Administração da Alesp, propôs a criação de uma Comissão de Sindicância para apurar os indícios de participação dos três servidores citados.
De 22 de janeiro a 4 de outubro, quando a Comissão de Sindicância (constituída pela mesa diretora da Alesp, presidida por Capez) apresentou o seu relatório final, transcorreram 256 dias, ou seja: 8 meses e 16 dias.
Só que, na prática, desse período não houve trabalho durante 6 meses e 4 dias.
Em 17 de maio, Jeter Rodrigues Pereira, ouvido pela Comissão de Sindicância se autodeclarou réu confesso de práticas que ensejariam a sua demissão a bem do serviço público com base na legislação vigente (Estatuto do Funcionalismo Público do Estado de SP, lei nº 10.261, de 1968).
Curiosamente, nesse mesmo dia em que confessava sua participação no esquema de fraudes de merenda escolar, que caracteriza falta grave passível de demissão a bem do serviço público, Jeter recebeu um atestado de bons antecedentes: a mesa diretora da Alesp (veja PS2), numa atitude inexplicável, lhe concedeu o direito de se aposentar.
Em 25 de maio, foi aprovada então a CPI da Merenda, que só foi instalada em junho por pressão popular.
Apresentei à CPI (veja PS3) 59 requerimentos, dos quais 35 de convocação e 15 de quebra de sigilo.
Relacionei para serem convocados os deputados federais Baleia Rossi e Nelson Marquezelli, os deputados estaduais Fernando Cury e Luiz Carlos Gondim e os ex-secretários de Estado de Alckmin Arnaldo Jardim, Duarte Nogueira e Edson Aparecido, todos citados por testemunhas e delatores.
Como muitos, eles foram incluídos no vasto rol de negligências da comissão e poupados de explicações.
Assim como a Comissão de Sindicância, a CPI da Merenda trilhou trajetória previsível até o final, esquivando-se de investigações e aprofundamentos para honrar os compromissos partidários.
Foram provados os esquemas, os operadores e poupados os mandatários.
Capez permanece com o futuro incerto mais por seus próprios erros e de seus assessores do que pelos acertos da CPI.
E Alckmin, novamente, segue blindado.
Porém, desta vez, somente os pares do governador cerraram fileira.
A imprensa, normalmente dócil com os percalços do tucano, manteve o assunto na pauta estadual – apenas.
Uma mudança de comportamento cujo crédito não é de chefias repentinamente comprometidas com a verdade, mas de uma intolerância popular crescente, alimentada pelos sucessivos prejuízos causados por este governo neoliberal à Educação.
João Paulo Rillo é deputado estadual pelo PT-SP.
PS de Conceição Lemes:
1) Tanto nas ocupações das escolas de 2015 quanto na resistência na Alesp, no primeiro semestre de 2016, Rillo sempre esteve ao lado dos secundaristas, dando-lhes decidido apoio.
2) A mesa diretora da Assembleia Legislativa é constituída pelos seguintes deputados estaduais: presidente Fernando Capez (PSDB), 1º secretário Enio Tatto (PT) e 2º secretário Edmir Chedid (DEM).
3) Apesar de ser o autor de mais de 40 representações na Justiça contra o governo Alckmin e de questionamentos anteriores sobre qualidade e quantidade da merenda, Rillo não foi indicado pela bancada para integrar a CPI. O deputado, porém, exerceu o seu direito parlamentar de participar da CPI, mesmo sem direito a voto.
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