quarta-feira, 9 de abril de 2014

Eu e você temos nosso voto, mas o dono do banco, além do voto dele, tem mais R$ 150 milhões 09/04/2014

Por Equipe do Blog



Defensor de uma efetiva reforma política que reduza a influência do poder econômico no processo eleitoral do país, o deputado Henrique Fontana (PT-RS), em entrevista exclusiva a este blog, analisa a decisão da maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) que julgou o financiamento empresarial inconstitucional e, também, a nova proposta de reforma política que se encontra na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Acompanhem a entrevista:

Deputado, qual a sua avaliação sobre a decisão do STF considerando inconstitucional o financiamento de campanha pelas empresas?

[ Henrique Fontana ] Uma questão importante é deixar claro que o STF está agindo de forma correta como legislador negativo. A OAB entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) – ela tem, realmente, essa prerrogativa – e pediu que seja analisado se é constitucional ou não o financiamento de campanha pelas empresas. E a maioria dos ministros (sete até a sessão ser suspensa pelo pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes) está definindo que o financiamento pelas empresas é inconstitucional. Consideram que com ele se quebra preceitos fundamentais da Constituição.

Em síntese, o financiamento pelas empresas vai contra a ideia, o princípio de que “um homem, um voto” e de que todos têm de ser iguais dentro do processo democrático. A questão é que eu e você temos o nosso voto, mas o dono de banco além do voto tem mais R$ 150 milhões. Isso desequilibra o pleito. Recomendo que vocês ouçam os votos dos ministros Luís Roberto Barroso e Marco Aurélio Mello, que foram fantásticos. Tratam-se de leituras para a vida.

Eu entendo como inaceitável que o ministro Gilmar Mendes fique com um julgamento dessa magnitude na gaveta dele. Já está seis a um, portanto, está decidido, mesmo que os outros quatro ministros votem pela continuidade do financiamento empresarial. O ministro Gilmar não pode, então, submeter o país inteiro a aguardar esse julgamento. Até porque é um julgamento que muda muito os rumos do debate da reforma política.

Depois dessa votação o que acontece?

[ Fontana ] Definido que (o financiamento empresarial) é inconstitucional, cabe ao Congresso Nacional votar uma nova lei. Não há, portanto, nenhum conflito do Supremo ou acusação de legislar no lugar do Câmara. Neste caso, ele não está judicializando, mas agindo dentro dos legítimos preceitos da Lei. Obrigatoriamente, quando terminar, e o financiamento pelas empresas for julgado inconstitucional, nenhum partido pode receber dinheiro de empresa. Aí, o Congresso vai dizer como podemos então financiar uma eleição.

Eu estava em um debate e fui questionado: “De onde vai sair dinheiro para a campanha?” A primeira grande consequência dessa decisão é que vai sair bem menos dinheiro; a segunda, é que a campanha vai ser bem mais barata e ao invés de uma produção cinematográfica, teremos um programa mais barato. O marqueteiro não vai mais receber R$ 20 milhões, mas entre R$ 1 milhão a R$ 2 milhões por campanha.

Aí, dizem: “Mas vai continuar o caixa 2″. E eu respondo: alegar que se uma ilegalidade pode continuar te leva a não votar uma lei, é como propor o absurdo de que se revogue a Lei Maria da Penha porque apesar dela, uma lei muito positiva que coíbe e pune os agressores de mulheres, continua havendo agressão no país.

A solução seria revogar a Lei Maria da Penha? É evidente que não. Mas, reforçá-la e intensificar as punições. A mesma coisa vale para a política. A lei precisa coibir o Caixa 2 e a influência do poder econômico nas campanhas eleitorais. Ele é o centro do problema da política brasileira que está cada vez mais dominada pelo poder econômico. A PEC que estão querendo votar agora, inclusive, vai aprofundar o papel do poder econômico por adotar o voto facultativo e, assim, constitucionalizar o financiamento de empresas.

Qual sua avaliação desta PEC? Ela passa ou não?

[ Fontana ] A PEC 352/2013 proposta pelo presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), acaba tornando constitucional o financiamento das campanhas eleitorais pelas empresas ao permitir, em um dos seus artigos, a possibilidade de o financiamento facultativo de campanhas, ao permitir que seja público ou privado, ou as duas opções, de acordo com a escolha de cada partido. É o que eu chamo de financiamento facultativo, ou seja, um partido pode concorrer com financiamento privado, outro com o público… Na cultura política brasileira isso é uma piada.

Com esse artigo você constitucionaliza o financiamento privado. Hoje precisamos de 257 votos para mudar, ou seja, para coibir o financiamento das empresa ou aprovar o financiamento público, caso essa PEC seja aprovada, nós vamos precisar de 308 votos. Aí será muito difícil mudar.

Outra questão grave desta PEC é a proposta do voto facultativo, prejudicial para o nosso sistema político. Evidentemente, os mais pobres é que vão deixar de votar.

A sociedade é contra o financiamento pelas empresas?

[ Fontana ] Nós já temos uma maioria substancial a favor da proibição do financiamento pelas empresas. Recentemente, em um programa de debate da Rádio Gaúcha de Porto Alegre, com pesquisa interativa, o índice de pessoas que defendiam o fim do financiamento pelas empresas era de 96%. Um resultado muito significativo.

E em relação ao personalismo na escolha dos candidatos, ainda hoje vigente nos partidos…

[ Fontana ] No projeto de reforma política, sob minha relatoria (Fontana foi o relator da proposta de reforma política de Comissão Especial montada na Câmara), eu fiz as mediações e no último sistema de votação que redigi – já sem o voto em lista, uma coisa que a cultura brasileira infelizmente não aceita – a sugestão foi de que os partidos apresentassem uma lista de candidatos, escolhido pelos filiados, para o cidadão votar. No dia da votação, o eleitor poderia votar no partido e/ou nominalmente no candidato de sua preferência. Se o PT, por exemplo, fizesse 10 deputados em São Paulo e 20% dos eleitores votassem na sigla (PT) no Estado, os dois mais votados seriam eleitos e os oito deputados obedeceriam a ordem de maior votação. Seria um primeiro passo, ainda tímido, para avançarmos na cultura da lista.

Existe uma proposta muito inteligente da sociedade civil que está no projeto da CNBB, MCCE, CUT, UNE e outras entidades. Nela, o partido organiza a lista e a ordem dos deputados é definida pelos filiados em votação secreta. Aí no primeiro turno, dia 05 de outubro, o eleitor vota no presidente da República e no partido – um voto partidário. Vamos para o nosso exemplo: o PT em São Paulo conquistou 10 vagas de deputados. Então, você pega os primeiros 20 da lista (o dobro das vagas) e, no segundo turno, é que tem a campanha individual desses candidatos e o eleitor vota nominalmente no candidato de sua preferência.

Com isso, fica neutralizado o discurso de que vamos tirar o direito de voto do eleitor. A proposta concebe a separação do voto em dois momentos, primeiro você vota no presidente, no governador e no prefeito (vota nos candidatos majoritários) e no programa partidário que você quer eleger para o Parlamento. Depois, você define os deputados que se elegerão nas vagas daquele partido. Assim, você torna o voto mais transparente.

Do nosso ponto de vista progressista, isso é fundamental porque a discussão é de programa. Evidentemente que, aqueles que gostam de personalismo, não vão apoiar esse projeto. Mas, nós vamos. Estamos defendendo uma proposta que tem um respaldo social bastante forte.

Hoje, quando o cidadão vota em Henrique Fontana, ele esta votando no Henrique Fontana e no PT. Isso fica mais claro neste sistema que propomos porque ele é separado em dois momentos.

Essa proposta também incide sobre o financiamento?

[ Fontana ] Sim, nesta proposta do Eleições Limpas, há três componentes: primeiro, proíbe completamente o financiamento pelas empresas. Segundo, limita o cidadão, pessoa física que quiser contribuir a um teto de R$ 700,00. Você pode contribuir como quiser, com R$ 100 reais para o deputado federal X; mais R$ 200,00 para o y; mais R$ 100,00 para o presidente. Só não pode ultrapassar os R$ 700,00. E um terceiro componente, há uma parcela de financiamento público com teto de gasto, proporcional ao tamanho do partido. No caso do deputado, por exemplo, ele recebe R$ 600 mil e pode arrecadar mais R$ 400 mil nessa base dos R$ 700,00 como limite por pessoa física.

Veja que neste sistema, tudo tem um teto. Com isso nós vamos baratear as campanhas. Empresa não paga, pessoa física pode contribuir até R$ 700,00 e entra outra parcela de investimento público.
Considerando que o presidente da Câmara coloca a proposta em votação no mês que vem, qual sua agenda agora, em termos de reforma política?
[ Fontana ] Hoje, eu estou trabalhando para impedir a votação dessa nova PEC e pelo fortalecimento do movimento Eleições Limpas. E, também, pelo plebiscito sobre a reforma política. Eu, particularmente, entendo que a presidenta Dilma Rousseff deve apresentar como uma das grandes prioridades para o seu próximo mandato a reforma política, que deve ser feita no 1º semestre de 2015. E, aí fazer desta reforma uma disputa política definitiva.

http://www.zedirceu.com.br/eu-e-voce-temos-nosso-voto-mas-o-dono-do-banco-tem-mais-r-150-milhoes/

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