Da Agência Brasil
Paulo Virgilio
Brasília – A relação dos 100 locais mais significativos da memória do
tráfico negreiro e da história dos africanos escravizados no Brasil
será apresentada na próxima quarta-feira (25), no Centro Cultural Banco
do Brasil (CCBB) do Rio de Janeiro, durante a quarta edição do Festival
Internacional do Filme de Pesquisa sobre História e Memória da
Escravidão Moderna.
Elaborada com base em uma pesquisa iniciada no ano passado, a lista é
uma iniciativa do projeto Rota do Escravo: Resistência, Herança e
Liberdade, criado em 1994 pela Organização das Nações Unidas para
Educação, Ciência e Cultura (Unesco).
Com uma programação de oito filmes, o festival é
uma mostra itinerante realizada anualmente em mais de dez cidades, de
três continentes. O evento é organizado por uma rede internacional de
pesquisa, da qual fazem parte as universidades de York e Laval, do
Canadá, a École de Hautes Études em Sciences Sociales e o Centre
National de la Recherche Scientifique, da França, e o Laboratório de
História Oral e Imagem, da Universidade Federal Fluminense (UFF), do
Brasil.
Um dos destaques da mostra, que tem curadoria das historiadoras Hebe Mattos e Martha Abreu, é o filme Os Escravos de Ontem, Democracia e Etnicidade no Benin,
ganhador do prêmio do júri da edição festival realizada no ano passado
no Museu do Quai Branly, em Paris. Também será lançada a caixa de DVDs Passados Presentes,
com quatro filmes de pesquisa realizados com descendentes de
escravizados das antigas áreas cafeeiras do Vale do Paraíba, no sul
fluminense.
Convidado do evento, o fotógrafo e antropólogo Milton Guran,
representante brasileiro no Comitê Científico do projeto Rota do
Escravo, fará a apresentação dos locais de memória, escolhidos pelo
laboratório da UFF a partir de contribuições não só de acadêmicos, mas
também de representantes da sociedade civil vinculados às diversas
manifestações da cultura afrobrasileira.
“São os portos de desembarque, os mercados de escravos, as irmandades
fundadas por africanos no Brasil, que tiveram um papel fundamental no
diálogo da massa escravizada com o poder político da época e na busca
pela compra da liberdade, os quilombos e algumas manifestações culturais
que foram efetivamente fundadas por africanos depois de chegarem ao
Brasil”, explica Guran. “Não se trata de toda a cultura afrobrasileira,
mas daqueles lugares que marcam a ação do tráfico e as estratégias
iniciais daqueles africanos que chegaram ao Brasil”, esclarece o
antropólogo.
De acordo com Guran, a intenção do projeto é que os lugares de
memória sejam reconhecidos pelos seus respectivos municípios, com pelo
menos uma placa sinalizando o local. “Nós consideramos como o mais
emblemático lugar de memória do tráfico no Brasil e nas Américas o Cais
do Valongo, na zona portuária do Rio. Lá, funcionou o maior porto de
entrada de escravos africanos das Américas”, destaca.
Para o antropólogo, as obras de revitalização da zona portuária
carioca, o chamado Porto Maravilha, vão proporcionar, pela primeira vez
na história, a devida proteção aos locais de memória da escravidão. “O
sítio arqueológico do Cais do Valongo vai ficar, após a conclusão das
obras, no meio de um grande monumento em homenagem aos afrodescendentes
do Brasil”.
Milton Guran espera que os locais da Rota do Escravo sirvam de
estímulo para o turismo de memória. “A Unesco identificou, a nível
planetário, um movimento importante, por parte dos afrodescendentes, de
buscar as referências. E isto tende a aumentar, na medida em que hoje
temos uma classe média de descendência africana bastante significativa.
No Brasil nem tanto, mas nos Estados Unidos, onde as políticas
afirmativas já existem há décadas, muitos afroamericanos preferem
conhecer um lugar ligado à sua origem do que visitar Florença, Veneza ou
Paris”, afirma.
Edição: Lana Cristina
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