Por Mário Almeida, especial para o blog
Nunca fui muito simpático à decisão de organizar a Copa do Mundo no Brasil. No entanto, diante das críticas de parte dos manifestantes, relacionando a (má) qualidade da educação e saúde pública públicos aos gastos com estádios, decidi escrever este texto para defender algo óbvio: Copa do Mundo e serviços públicos de qualidade não estão em contradição!
Os gastos, ou investimentos (palavra mágica para alguns), com a Copa devem alcançar a cifra de R$28 bilhões, que estão sendo executados em, aproximadamente, 03 anos. Modernização de portos e aeroportos, renovação da infraestrutura hoteleira, obras de mobilidade urbana e fortalecimento da rede de telecomunicações deverão receber aproximadamente R$ 22 bilhões. Com estádios, alvo preferido dos manifestantes, serão R$ 7,6 bilhões.
Parece muito, mas não é. Essas obras, que já foram finalizadas ou estão em andamento, têm impacto positivo sobre a economia brasileira, gerando empregos, aumentando o consumo e atraindo outros investimentos. Ademais, deixarão um legado importante de aumento da produtividade, modernização do setor de turismo, melhora da infraestrutura urbana e- por que não?- estádios novos, modernos e seguros. Quem não se lembra das tragédias em São Januário (2000, 150 feridos) ou na Fonte Nova (2007, 7 mortos)? Nos últimos dias, quase ninguém...
Talvez, todo esse dinheiro fosse mais bem aplicado em outras áreas, como educação e saúde; talvez, esses recursos fossem utilizados apenas para pagar os juros da dívida. Independente de seu destino, é importante notar que os gastos para a Copa do Mundo não ocorreram em detrimento da educação. Pelo contrário, desde 2005, os gastos públicos com educação crescem seguidamente, não importando qual o critério adotado:
Fonte: INEP- Elaboração própria
A tabela acima indica também que os gastos com os
estádios são ínfimos diante do orçamento público anual para educação. Em
2011, por exemplo, foram gastos R$ 252 bilhões, 100 vezes mais do que o
gasto "médio" anual com estádios.
O que explica, então,
a baixa qualidade da educação pública brasileira? Ineficiência
estatal, corrupção? Também, mas essas não parecem as razões essenciais.
Apesar dos R$ 252 bilhões gastos pelo setor público com educação, o que
falta, essencialmente, são mais, muito mais recursos. A tabela abaixo
mostra o quanto o setor público gastou com cada aluno por nível de
ensino:
Fonte: INEP
Percebe-se que os gastos públicos anuais por estudante
nos níveis básico e médio estão longe do custo de um estudante em uma
escola particular razoável, que custa, ao menos, R$ 13 mil/ano. Já no
nível superior, os gastos públicos anuais por estudante são da ordem de
R$ 20.600,00 mil reais, valores próximos aos cobrados pelas melhores
instituições privadas do país (mensalidade R$ 1.500,00). Não por acaso
as melhores universidades do Brasil são públicas; não por acaso o ensino
público fundamental e médio no Brasil é muito ruim, apesar das tímidas
melhoras observadas na última década.
Embora não tenha encontrado dados tão completos para a
saúde, a situação parece semelhante. Entre 2000 e 2010, o gasto público
per capita por ano com saúde saiu de US$ 107 para US$ 466; nesse mesmo
período, a porcentagem do orçamento público destinado à saúde foi de
4,1% para 10,7%. Novamente, percebe-se que os gastos com a Copa são
insignificantes perto do que o setor público brasileiro já despende com
saúde. A insatisfação com os serviços ocorre porque, mesmo assim, os
recursos são insuficientes. Só para comparar: os EUA despendem US$ 3,7
mil ano/habitante; a Noruega, US$ 6,8 mil.
A Copa do Mundo pode ser criticada por uma séria de
razões- custos de algumas arenas, privatizações mal explicadas, remoções
forçadas, desmandos da FIFA etc.-, mas ela não explica a qualidade
atual da saúde e da educação pública no Brasil. De qualquer modo, as
críticas podem ajudar a fomentar o debate sobre o subfinanciamento
dessas duas áreas. A renovada pressão para que se destinem mais recursos
advindos da exploração do petróleo a essas duas áreas já é um resultado
das manifestações. Não creio, no entanto, que será suficiente para
equacionar a questão. O debate está apenas começando e a reivindicação
por escolas e hospitais “padrão FIFA” não é só justa, como necessária.
Mário Almeida é economista e cientista social, com
mestrado em desenvolvimento econômico pela UNICAMP. Desde 2009, é
diplomata. As opiniões expostas texto são exclusivamente do autor e não
refletem, necessariamente, a visão do Ministério sobre o assunto.
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