SP e Rio querem acabar com a máfia do transporte
Está em curso na Câmara dos Vereadores das duas capitais a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a relação entre as empresas de ônibus e o poder municipal; autores das propostas falam em "caixa-preta" quando se referem às planilhas de custos das companhias, conhecidas por serem grandes doadoras em campanhas políticas; gastos não são revelados, apesar de o transporte ser uma concessão pública, e a qualidade do serviço, reivindicado em protestos em todo o País, continua péssimoOs autores das propostas nas duas cidades falam em "abrir a caixa preta". Isso porque, geralmente, não há transparência quanto à relação das companhias com o poder municipal: as planilhas de custos das empresas não são divulgadas, assim como a forma como os empresários empregam recursos no serviço, de má qualidade nos dois lugares. Há ainda a menção de uma relação promíscua entre Prefeitura e empresas, que são conhecidas por serem as grandes doadoras de campanha.
"Nós só vamos conseguir lidar com esse colapso se tivermos a coragem de mergulhar fundo naquilo que orientou o atual sistema e nos vícios que esse sistema tem", diz o vereador Ricardo Young (PPS), autor do pedido da CPI paulista. "Queremos investigar a relação promíscua entre o executivo municipal e as empresas de ônibus e dar transparência a todos os dados e informações sobre o sistema, de modo que a sociedade possa ter um retrato fiel de como se organiza o serviço para, a partir de então, discutirmos o modelo de transporte público que queremos", afirmou Eliomar Coelho, que protocolou ontem o pedido de abertura da CPI no Rio.
São Paulo
O procurador-geral da Justiça de São Paulo, Márcio Fernando Elias Rosa, disse que o Ministério Público já solicitou as planilhas de composição dos custos das tarifas do transporte público do município à Prefeitura. Segundo ele, o objetivo não é colocar em cheque a composição das tarifas, e sim conhecer como ela é composta e, se necessário, solicitar esclarecimentos para que se defina melhor a questão. Rosa informa que já existe um inquérito civil na Promotoria de Habitação e Urbanismo da capital sobre esse tema.
De acordo com reportagem da Folha de S.Paulo, uma investigação do MP revela que o balanço de empresas de ônibus que operam na cidade apresenta prejuízo, mas que seus proprietários praticam movimentações milionárias. Algumas delas, até, consideradas atípicas pelo Coaf – Conselho de Controle de Atividades Financeiras –, órgão federal que apura lavagem de dinheiro. "Suspeita-se que os donos das companhias estejam envolvidos em desvio de recursos, troca de veículos novos por velhos e até venda de linhas de ônibus que não poderiam ser comercializadas, pois são uma concessão da prefeitura", lembra editorial de terça-feira.
Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, Lucas Monteiro, integrante do Movimento Passe Livre – que iniciou os protestos que ocorrem no País há cerca de duas semanas – ressaltou a dificuldade que se tem, na Câmara dos Vereadores de São Paulo, para se conseguir essas planilhas. Segundo ele, existe uma blindagem por parte dos políticos com as empresas de ônibus da capital. Na sessão desta terça-feira, a oposição acusou a base de Fernando Haddad de praticar uma "manobra" para adiar a instalação da Comissão.
Rio de Janeiro
Na capital fluminense, a situação parece ser ainda mais obscura. Enquanto em São Paulo os gastos do setor são controlados pela Prefeitura, no Rio as planilhas de custos das empresas ficam por conta da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado (Fetranspor) e a Rio Ônibus, que repassam os números para o executivo municipal. Mesmo o transporte sendo uma concessão pública, não se tem ideia de quanto é o lucro das companhias, que não dão satisfação de seus gastos e ganhos.
O serviço, claro, é péssimo, assim como as condições de trabalho de motoristas e cobradores. O polêmico é que não há pressão alguma do governo nem da Prefeitura sobre a situação: ônibus sempre superlotados, quebrados, fora de horário e com segurança precária. O mês passado, por exemplo, foi marcado por atropelamentos de pedestres e de dois ciclistas, durante treinamento. Deu-se início, então, a uma operação do Procon-RJ, que começou a verificar, nas garagens, a conservação, segurança e a documentação dos veículos. Em dias de fiscalização, dezenas de ônibus são impedidos de circular. A operação será expandida por todo o Estado.
Umas das principais críticas na cidade é a indicação do Secretário estadual de Transportes pelos donos das empresas de ônibus. Num vídeo publicado no início de maio, em protesto contra os frequentes atropelamentos ocorridos na capital, o deputado federal Anthony Garotinho fez uma dura crítica sobre o assunto. Segundo ele, o transporte no Rio "virou um caos" principalmente porque o atual secretário, Júlio Lopes, "não entende absolutamente nada" do assunto, uma vez que foi "imposto" pelos donos das empresas. Segundo o líder do PR, "Júlio Lopes não é Secretário de Transporte, é Secretário dos empresários". Em seu discurso, Garotinho faz um apelo ao governador, Sérgio Cabral, e ao prefeito, Eduardo Paes, para que a situação mude.
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