2/10/2012, Dan Hind,
Al-Jazeera
Traduzido
e comentado pelo pessoal da Vila
Vudu
Entreouvido
na Vila Vudu: Se
o jornalismo tido como melhorzinho já se dá por falido e morto... Imaginem só em
que situação está hoje o Grupo GAFE (Globo-Abril-FSP-Estadinho), que faz, no
Brasil-2012, o PIOR JORNALISMO DO MUNDO! \o/ \o/ \o/
A maioria dos leitores “não terá consciência dos subsídios públicos” que os jornais já desfrutam |
“...
no dia em que os jornais pararem de vez de circular, será um desastre para a
democracia”.
Entreouvido
na Vila Vudu:
Isso, talvez, e na Grã-Bretanha. No Brasil, no dia em que pararem de circular de
vez as publicações do Grupo GAFE (Globo-Abril-FSP-Estadão) a democracia talvez
tenha, afinal, alguma chance real de prosperar por aqui .
“Os
magros lucros que os jornais obtêm dos anúncios publicados em páginas online de acesso gratuito pagam só
uma mínima fração dos custos do jornalismo investigativo de alta qualidade que
os jornais geram”.
Entreouvido
na Vila Vudu:
“jornalismo investigativo de alta qualidade gerado por jornais”?!... Sóssifô na
Grã-Bretanha! kkkkkkkkk]
“Ficaríamos
só com a tímida BBC, de um lado; e com jornalismo-lixo, do
outro”.
David Leigh |
Ante
desastre de tais proporções, David Leigh propõe o que, para ele, seria “meio
perfeitamente fácil para recuperar jornais, garantir a pluralidade de opiniões:
monetarizar a web” -- acrescentar £2 ($3,2 dólares, R$ 7,4) mensais no
que se cobra pelo uso da banda larga e, assim, obter, no total, cerca de £500
milhões ($807 milhões de dólares, R$1,77 bilhão) por ano. O dinheiro seria então
distribuído para operações jornalísticas “segundo o número de leitores
online na Grã-Bretanha”.
Os
grupos The Telegraph, Guardian e associados (i.e., Daily
Mail) seriam os grandes beneficiados nesse arranjo, cada um deles embolsando
cerca de £100 milhões ($161 milhões de dólares, R$ 398 milhões) ao ano. O
Sun receberia metade disso, cerca de £50 milhões ($80 milhões de dólares,
R$ 160 milhões) e o grupo Independent, £40 milhões.
Em
tempos normais, os jornais jamais discutem a economia política da mídia. A
publicação do artigo de Leigh sugere que não estamos vivendo tempos normais.
As
perdas provocadas pela transferência de leitores para as mídias online
acumulam-se hoje em ritmo tal que já obrigam a romper os velhos padrões de
silêncio “midiático”. A maioria dos leitores não sabe da quantidade de subsídios
públicos que os jornais já recebem (o artigo de Leigh também fala deles, embora
muito rapidamente). Interessante será observar se, doravante, o Guardian
ou qualquer dos grupos concorrentes começarão a publicar também propostas que
não combinem tão exatamente com o que mais interesse ao Guardian.
Dan Hind |
Jornalismo
Investigativo
Deixando
isso de lado, nos concentremos no principal problema que há na proposta de
Leigh. O mecanismo de distribuição de dinheiro que ele propõe não atingirá o
objetivo declarado. Leigh propõe um meio espetacularmente ineficaz de usar
dinheiro público para produzir “jornalismo investigativo de alta qualidade”.
Longe de impedir um desastre para a democracia, só conseguirá dar sobrevida ao
desastre já em andamento.
Embora
vez ou outra ainda se encontre jornalismo investigativo nos jornais britânicos
[nos jornais brasileiros, nunca, never, jamais, jamais,
jamás], não passa de ínfima porção do total de conteúdo publicado. Dá-se
sempre espaço muito maior a fofocas sobre celebridades, diz-que-disse
diretamente saído do prédio do Parlamento (ou diretamente produzido dentro das
próprias redações), comentário-futrica sobre estilos de vida, cobertura de
esportes, histórias assustadoras em que imigrantes são sempre “culpados”,
bobajol semicru e palpitaria sobre economia e outros temas equivalentes que se
reúnem sob a tag “superficialidades e lixo”. Antigamente, esse tipo de
“matéria” gerava manchetes hipnóticas e/ou pornô-sedutoras que turbinavam a
venda de jornais. Ainda atrai internautas à caça de ver gente super, semi, ou
totalmente despida, surubas e/ou pregação “ética” e “indignação”
falso-moralista. Mas já não vende como nos bons tempos.
O
plano de Leigh visa a turbinar as operações jornalísticas já em curso, com
grande número de “seguidores” e/ou “visitantes” e/ou leitores online,
independente da quantidade de “jornalismo investigativo de alta qualidade” que
encomendem ou publiquem. O plano visa a recompensar, preservando, o que há hoje.
Também
estimulará os editores a se dedicar ao sensacionalismo e ao escândalo, ainda
mais do que já se vê hoje. A página online do Daily Mail receberia
rios de dinheiro. O editor do já defunto The News of the World dos
Murdoch poria as mãos em dezenas de milhões de dinheiro limpo e novinho, para
pagar investigações privadas sobre mais vidas privadas de mais gente e para
pagar despesas que podem ser mais ou menos, mas são, todas, sinistras.
Leigh
chega a sugerir que só os sites que atraiam mais de 100 mil
visitas/leitores recebam fundos públicos, o que é meio bem estranho para
promover alguma pluralidade de opiniões.
A
vida pública afundaria de vez na mediocridade, mantendo no poder e nos jornais
“os suspeitos de sempre”, jogando sempre pelas mesmas regras.
Até
recentemente, havia vozes influentes que defendiam o conteúdo e a conduta atuais
das empresas comerciais de jornalismo, a partir do pressuposto de que essas
práticas seriam indispensáveis para atrair o interesse do consumidor, gerar
vendas, as quais, assim, sustentariam a pluralidade de opiniões. A Baronesa
Hale, por exemplo, das mais longevas juízas da Suprema Corte
britânica:
“Os
jornais devem ter assegurada suficiente latitude para intrometer-se no
sofrimento privado, para que mantenham os números de venda e a circulação, e
todos nós possamos continuar a nos beneficiar da ampla diversidade de jornais e
outros meios massivos de informação acessíveis nesse
país”.
Na
minha avaliação, difícil encontrar doutrina mais repugnante. Os que desejem e
possam continuar a produzir escândalos sobre escândalos e hectares de páginas de
fofoca e futrica ficam assim autorizados a continuar a submeter os públicos
consumidores à divulgação massiva de sua, só deles, específica ideia sobre o que
seja a vida pública.
Como
se vê hoje, o discurso público é privilégio reservado, sem qualquer cuidado com
manter alguma proporcionalidade entre opiniões divergentes – e com, na prática,
garantia de exclusividade –, para os que mais se interessem por atacar qualquer
princípio, por mínimo que seja, de tolerância ou decência humana. É praticamente
uma nova Constituição, produzida por juíza da Suprema Corte britânica, que
assegura direitos de chantagem a todos os jornalistas!
Na
caça à futrica mais comercialmente valiosa, os jornais e os jornalistas ficarão
autorizados a reunir montanhas de qualquer tipo de “indício” de qualquer coisa
que possa ser usado para destruir reputações de políticos e outros, e “indícios”
que tanto poderão ser publicados quanto poderão ficar “reservados” para uso em
chantagens futuras, tudo deixado entregue ao critério de editores, jornalistas,
empresários “da mídia”.
Baronesa Hale |
O
problema é que, como se vê hoje, a autorização que a Baronesa Hale da Suprema
Corte britânica garante aos jornais, “para intrometer-se no sofrimento privado”,
já não é tão lucrativa. Então... Leigh, do Guardian, propõe que se crie
um taxa... para subsidiar aquela intrusão!
Poder-se-ia,
talvez, com algum sentido, considerar a criação de novos impostos que
subsidiassem a produção de jornalismo investigativo. Talvez. Mas... criar uma
nova taxa, sobre o uso da banda larga... para financiar os jornais e os
jornalistas que operam os jornais que há hoje?!
O
dinheiro correria lépido para os bolsos dos mais capazes de atrair os mais
pervertidos! Claro que alguns sites jornalísticos poderiam alocar alguma
fração do que recebessem e comprar jornalismo investigativo de alta qualidade...
Mas, pode-se dizer, seria “problema deles”... Poderiam também comprar a produção
do tal “jornalismo investigativo de boa qualidade” e jamais publicar coisa
alguma de boa qualidade, como já fazem hoje.
Não
há dúvida de que garantir subsídios públicos para apoiar a produção de
jornalismo investigativo é solução altamente desejável. É, de fato, necessária,
se se está buscando meio para sair do estarrecedor emaranhado de problemas que
hoje enfrentamos. Mas é solução que só se justifica se, sobre a alocação dos
tais “subsídios públicos”, houver eficiente controle público.
Criar
novos impostos ou aumentar a taxa que os britânicos já pagamos para ter
televisão pública seria boa ideia, se cada um de nós recebesse uma quantia de
dinheiro para usar “em comunicação pública”, como melhor aprouvesse a cada um. E
com o direito assegurado aos cidadãos, para exigir restituição do imposto pago,
no caso de absolutamente não interessar a alguém apoiar qualquer tipo de empresa
jornalística.
Quanto
aos demais cidadãos, alguém pode ter algum interesse específico num determinado
tipo de investigação jornalística. Outros, se quisessem, poderiam delegar a uma
ou outra empresa jornalística o direito de falar em seu nome, ou de publicar,
autorizadamente em nome “do leitor”, o que desse na telha de um ou outro
jornalista, autorizando assim, também, um ou outro jornalista a investigar ou
deixar de investigar o que bem entendesse.
Assim
feito, os cidadãos poderiam decidir quais os temas sobre os quais querem saber
mais. Quem desejar escândalo e mais escândalo, que entregue o seu dinheiro ao
Sun e ao Daily Mail. (Embora, pensem bem: encontram-se na
internet, perfeitamente gratuitos, todos os mais escabrosos escândalos reais e
imagináveis!). Quem quisesse saber sobre o que acontece no mundo, poderia dar o
próprio dinheiro diretamente aos que tenham conseguido convencer um ou outro
cidadão de que merecem receber o seu rico dinheirinho, ou porque sejam
confiáveis ou porque mentem talentosamente, do jeito que melhor apraza ser
mentido, a um ou outro destinatário. O que importa, em todo esse processo, é que
todos temos de poder discutir todas as propostas e todos os resultados.
Indivíduos
e pequenos grupos de opinião teriam, assim, meios para continuar a produzir o
noticiário que lhes interesse, recebendo dinheiro diretamente da parcela do
público que se interessa por um ou outro tipo de informação: pequenos jornais
para pequenos públicos. Que grande diferença faria, se vários milhares de
pequenos jornais adequadamente financiados e sob eficaz controle público
pudessem, todos, produzir jornalismo investigativo de boa qualidade! Que
espantosa quantidade de informação pública de boa qualidade haveria disponível
para todos, conhecimento público publicamente produzido e publicamente
consumido, para esclarecimento público da opinião pública.
O
jornalismo-empresa que vende jornais impressos que há hoje não passa de máquina
de ensinar preconceitos, superstições e argumentação desejante, incansavelmente
repetida, a favor do desejo de uns poucos. Sensacional seria se, todos os dias,
alguém lançasse luz sobre alguma parte da realidade que, há tanto tempo, é
cuidadosamente mantida na obscuridade, além de nos, também pelos
jornais que conhecemos!
Num
sistema bem projetado, se inventariam meios para dar ampla divulgação à
informação que grande número de cidadãos considerassem interessante, valiosa. E,
nos grandes números, tudo, afinal, acabaria por ser adequadamente investigado.
Encomendar matérias de jornalismo investigativo e avaliar o significado público
de uma ou outra descoberta passaria a ser rotina diária, parte da vida. Como
foi, antigamente, quando se comprava o jornal do dia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário