quarta-feira, 3 de maio de 2017

Coletivo do Ministério Público repudia delação premiada 03/05/2017




Escrito por Miguel do Rosário, Postado em Redação

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Bem, ainda há esperança.

Um grupo de destemidos procuradores, hoje organizados numa associação de cunho progressista, o coletivo Transforma MP, deu início a uma heroica batalha para restituir dignidade cidadã ao Ministério Público.

O MP custa caro demais ao povo brasileiro para continuar sendo essa instituição corporativista, submetida aos interesses mesquinhos da plutocracia e da mídia oligárquica.

Segue um dos primeiros grandes textos do coletivo, assinado por um de seus mais ilustres membros, o procurador de justiça Rômulo de Andrade Moreira.

É um texto corajoso, contra a delação premiada, essa excrescência importada do sistema norte-americano, e que apenas deu ao MP ainda mais poder de conspirar politicamente contra governos, elevando exponencialmente a capacidade do MP de produzir instabilidade e injustiça.

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A delação premiada no Brasil – ontem e hoje: razões jurídicas, éticas e constitucionais pelas quais a repudiamos

por Rômulo de Andrade Moreira, procurador de Justiça*

No ano de 1990, mais precisamente no dia 26 de julho, publicava-se no Diário Oficial da União o texto de uma nova lei, vinda como uma resposta aos anseios populares de diminuição da violência urbana. Sancionada pelo então Presidente da República tentava em seus treze artigos (dois destes vetados) resolver por intermédio do Direito Penal um problema que definitivamente não é dele.[1] Exasperaram penas de determinados crimes, impossibilitando-se, também, a concessão de benefícios aos sentenciados, tais como a anistia, a graça e o indulto, além de proibir o gozo de direitos subjetivos individuais (mesmo estando presentes os requisitos específicos para a sua fruição) como a fiança e a liberdade provisória, tudo a atender “ao contagiante clima psicológico de pavor criado pelos meios de comunicação social e aos interesses imediatos de extratos sociais privilegiados”, como acentuou Alberto Silva Franco.[2]

Estamos a falar da Lei nº. 8.072/90 que dispõe “sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5o., XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências”, cujos defeitos não iremos aqui abordar, pois não é este o nosso escopo no momento.[3]

Ali está a gênese da delação premiada no Brasil (ou, na expressão feliz de José Carlos Dias, extorsão premiada), como causa obrigatória de diminuição da pena em favor de autor, coautor ou partícipe nos crimes de extorsão mediante sequestro e associação criminosa (este última quando a societas sceleris tiver sido formada com o intuito de praticar os crimes considerados hediondos e outros a eles assemelhados).

Mais tarde, em 03 de maio do ano de 1995 foi sancionada a Lei nº. 9.034/95, já revogada, dispondo “sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas.” Tal como a anterior esta lei, criada para definir e regular “meios de prova e procedimentos investigatórios que versarem sobre crime resultante de ações de quadrilha ou bando“, também considerava causa compulsória de diminuição da pena a delação de um dos participantes na organização criminosa.

Aliás, na lei dos crimes hediondos o legislador foi mais explícito e utilizou o verbo denunciar como sinônimo de delação, enquanto que nesta segunda norma preferiu a expressão colaboração espontânea, como que para escamotear a vergonhosa presença da traição premiada em um diploma legal.

Depois, no dia 19 de julho de 1995 foi sancionada a Lei nº. 9.080/95, prevendo, igualmente, a delação como prêmio ao coautor ou partícipe de crime cometido contra o sistema financeiro nacional ou contra a ordem tributária, econômica e as relações de consumo quando cometidos em quadrilha ou coautoria. Agora se preferiu a expressão confissão espontânea, o que resulta no mesmo.

Já no ano de 1998, entrou em vigor a Lei nº. 9.613/98, a chamada lei de “lavagem de dinheiro”, disciplinando, outrossim, a diminuição de pena para o “colaborador espontâneo”.

Temos, ainda, como exemplo a Lei nº. 9.807/99, de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, que também prevê a delação premiada, além da Lei nº. 8.137/90 (art. 16, parágrafo único). Faz-se referência também à Lei nº. 11.343/06 (a Lei de Drogas), que no art. 41 dispõe de forma semelhante e ao art. 159, § 4º. do Código Penal.

Também o art. 86 da Lei nº. 12.529/2011, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, estabelece que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica poderá celebrar acordo de leniência com pessoas físicas e jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte: a identificação dos demais envolvidos na infração e a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob investigação. Tal acordo, segundo o art. 87 da mesma lei, nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei nº. 8.137/90, e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel, tais como os tipificados na Lei nº. 8.666/93, e os tipificados no art. 288 do Código Penal, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao agente beneficiário da leniência, mitigando, portanto, a regra da obrigatoriedade da ação penal. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se automaticamente a punibilidade dos referidos crimes.

Por fim, veja-se o art. 4º. da Lei nº. 12.850/13 (Organização Criminosa) que prevê também uma exceção à regra da obrigatoriedade da ação penal pública quando houver a delação (§ 4º.). Segundo esta lei, os “prêmios” de um acordo de delação podem ir desde a diminuição da pena até o perdão judicial. Cabe ao Magistrado decidir qual medida deve ser aplicada ao caso. Em relação a essa discricionariedade, o art. 4º, parágrafo primeiro, da Lei nº. 12.850 disciplina que o Magistrado deve levar em consideração “a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração”. Qualquer que seja a opção do Juiz, entretanto, essa decisão deverá ser fundamentada. Assim, por exemplo, no julgamento do Habeas Corpus nº. 97.509, também na Quinta Turma, o Colegiado entendeu que “ofende o princípio da motivação, consagrado no artigo 93, IX, da Constituição Federal, a fixação da minorante da delação premiada em patamar mínimo sem a devida fundamentação, ainda que reconhecida pelo juízo monocrático a relevante colaboração do paciente na instrução probatória e na determinação dos autores do fato delituoso”.

No julgamento do Habeas Corpus nº. 90.962, realizado pela 6ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça, consignou-se o seguinte conceito:

“O instituto da delação premiada consiste em ato do acusado que, admitindo a participação no delito, fornece às autoridades informações eficazes, capazes de contribuir para a resolução do crime.” Neste julgamento, o Colegiado firmou o entendimento que não basta o investigado confessar a sua participação no crime. Ainda que conte detalhes de toda a atividade ilícita e incrimine seus comparsas, ele só fará jus aos benefícios da delação premiada se suas informações forem efetivamente eficazes para a resolução do delito. No caso apreciado, o Colegiado entendeu não haver nos autos nenhuma informação que atestasse que a contribuição do paciente foi utilizada para fundamentar a condenação dos outros envolvidos. Assim, foi reconhecida apenas a atenuante da confissão espontânea.

Pois bem.

Diríamos que, “no espectro do recrudescimento da legislação processual penal, visto como um reflexo da expansão tresloucada da cultura da emergência, ganhou vigor a figura da delação premiada, sobretudo com a sua propagação no processo criminal italiano e estadunidense.”[4] Isso é fato!

Segundo Damásio de Jesus, “a origem da “delação premiada” no Direito brasileiro remonta às Ordenações Filipinas, cuja parte criminal, constante do Livro V, vigorou de janeiro de 1603 até a entrada em vigor do Código Criminal de 1830. O Título VI do “Código Filipino”, que definia o crime de “Lesa Majestade”, tratava da “delação premiada” no item 12; o Título CXVI, por sua vez, cuidava especificamente do tema, sob a rubrica “Como se perdoará aos malfeitores que derem outros á prisão” e tinha abrangência, inclusive, para premiar, com o perdão, criminosos delatores de delitos alheios.”[5]

Aliás, já na Inquisição, “um filho delator não incorre nas penas fulminadas por direito contra os filhos dos hereges e este é o prêmio pela sua delação. In proemium delationis.”[6]

A delação premiada, para além de outras questões adiante suscitadas, comporta uma análise acerca de sua compatibilidade ética com o Estado Democrático de Direito. Sem dúvidas, “o tema da delação premiada desafia diversos questionamentos: desde sua conveniência político-criminal, passando por sua apreciação sob o ponto de vista da quebra da ética ínsita ao proceder dentro de um Estado Democrático de Direito, ou pelas questões relativas ao seu valor probatório, até sua natureza jurídico-penal, sua função processual penal e as implicações daí decorrentes para o postulado do devido processo legal em nosso direito positivo.”[7] Como diz Hassemer, “não é permitido ao Estado utilizar os meios empregados pelos criminosos, se não quer perder, por razões simbólicas e práticas, a sua superioridade moral.”[8]

Também a propósito, veja-se a opinião de João Baptista Herkenhoff: “A meu ver, a delação premiada associa criminosos e autoridades, num pacto macabro. De um lado, esse expediente pode revelar tessituras reais do mundo do crime. Numa outra vertente, a delação que emerge do mundo do crime, quando falsa, pode enredar, como vítimas, justamente aquelas pessoas que estejam incomodando ou combatendo o crime. Na maioria das situações, creio que o uso da delação premiada tem pequena eficácia, uma vez que a prova relevante, no Direito Penal moderno, é a prova pericial, técnica, científica, e não a prova testemunhal e muito menos o testemunho pouco confiável de pessoas condenadas pela Justiça. Ao premiar a delação, o Estado eleva ao grau de virtude a traição. Em pesquisa sócio-jurídica que realizamos, publicada em livro, constatei que, entre os presos, o companheirismo e a solidariedade granjeiam respeito, enquanto a delação é considerada uma conduta abjeta (Crime, Tratamento sem Prisão, Livraria do Advogado Editora, página 98). Então, é de se perguntar: Pode o Estado ter menos ética do que os cidadãos que o Estado encarcera? Pode o Estado barganhar vantagens para o preso em troca de atitudes que o degradam, que o violentam, e alcançam, de soslaio, a autoridade estatal?”[9]

Se considerarmos que a normatividade de um Estado Democrático de Direito é o último bastião do seu povo (e não o Poder Judiciário, como se diz, que cumpre apenas observá-la, sem ativismos e decisionismos populistas), no sentido de que as proposições enunciativas nela contidas representam um parâmetro de organização ou conduta das pessoas (a depender de qual norma nos refiramos se, respectivamente, de segundo ou primeiro graus, no dizer de Bobbio), definindo os limites de suas atuações, é inaceitável que este mesmo regramento jurídico preveja a delação premiada em flagrante incitamento à transgressão de preceitos éticos intransigíveis que devem estar, em última análise, embutidos nas regras legais exsurgidas do processo legislativo/constitucional.

Obviamente que poderemos aqui estar entrando em terreno movediço, é dizer, o limite entre o Direito e a Moral. Mas não é o caso. São conceitos distintos. Estamos falando de Direito e Ética. É o caso!

Ademais, a traição demonstra fraqueza de caráter, como denota fraqueza o legislador que dela abre mão para proteger seus cidadãos. A lei, como já foi dito, deve sempre e sempre indicar condutas sérias, eticamente relevantes e aceitáveis, jamais ser arcabouço de estímulo a perfídias, deslealdades, aleivosias, ainda que para calar a opinião pública (ou publicada) ou satisfazer aos setores economicamente privilegiados da sociedade.

Não podemos arriscarmo-nos ao perigo, já advertido e vislumbrado pelo poeta Dante Alighieri, lembrado por Miguel Reale, quando afirmou que o “Direito é uma proporção real e pessoal, de homem para homem, que, conservada, conserva a sociedade; corrompida, corrompe-a.“[10] Como se pode exigir do governado um comportamento cotidiano decente, se a própria lei estabelecida pelos governantes permite e galardoa um procedimento indecoroso? Como fica o homem de pouca ou nenhuma cultura (o que não o diminui, por evidente, muito ao contrário) ou mesmo aquele desprovido de maiores princípios/valores, diante dessa permissividade aética ditada pela própria lei, esta mesma lei que, objetiva e obrigatoriamente, tem de ser respeitada e cumprida sob pena de sanção? Estamos ou não estamos diante de um paradoxo?

Como afirma Paulo Cláudio Tovo, “a delação premiada de comparsa nos parece uma violação ética com perigosas consequências no mundo do crime (…). Este não é o verdadeiro caminho da Justiça, importa, isto sim, na confissão que o Estado não tem capacidade científica de chegar à verdade.”[11]

É certo que em outras legislações, inclusive em países desenvolvidos economicamente (embora possuidores de uma sociedade em desencanto, como, por exemplo, a americana), a figura da delatio já existe há algum tempo (diga-se de passagem, assegurando-se inquestionavelmente a vida do denunciante), como ocorre nos Estados Unidos (bargain) e na Itália (pattegiamento), entre outros países. São exemplos, contudo, que não deveriam ser seguidos, pois o que é bom para eles, não é, necessariamente bom para nós. Aliás, esta coisa odiosa de copiarmos o “que vem de fora”, “só porque vem de fora”, assusta-nos, principalmente quando são institutos e categorias importados de sistemas jurídicos completamente distintos, como o norte-americano.

Aliás, Mangabeira Unger, afirma que a “a nossa academia está vidrada nas formas de idealização sistemática do direito que importamos dos Estados Unidos e da Alemanha. Então, ao invés de ser solução, faz parte do problema. É a realidade prática, o imperativo da transformação e do desenvolvimento que impõe essa agenda. Então, pode vir da prática o desafio e aí, se bate na porta da academia, talvez interrompa os devaneios da idealização sistemática que prevalece na elite do pensamento jurídico e constitucional brasileiro. (…) O pensamento jurídico brasileiro, em seu conjunto, rendeu-se a onda da racionalização idealizante que prevalece nas culturas jurídicas mais influentes do Atlântico Norte, sobretudo a dos Estados Unidos e da Alemanha. (…) O que é a vida, né, é a ideia do pensamento, do sonho, interagindo com a experiência. A experiência traz em sua tarefa o enigma. A experiência revela a superficialidade das nossas ideias e nos surpreendem. Qual é o objetivo maior? O bem supremo é a vida, a vitalidade. O inimigo são os preconceitos, as abstrações mortas, as práticas dogmáticas. O que eu estou pregando, o tema central da nossa conversa, é o triunfo da vida sobre o dogma e sobre as prisões em que nós nos acorrentamos voluntariamente. O direito pensado corretamente é a única alternativa à servidão voluntária.”[12]

Tão somente para se argumentar, pode-se dizer que o fim visado pela delação (o interesse público, a segurança pública), justificaria a sua utilização, ou, em outras palavras, o fim legitimaria o meio. Ocorre que tal afirmação é de toda aética, aliás, próprio do sistema político defendido pelo escritor e estadista florentino Niccolò Machiavelli (1469-1527), sistema este dito de um realismo satânico, na definição de Frederico II em seu Antimaquiavel, tornando-se sinônimo, inclusive, de procedimento astucioso, velhaco, traiçoeiro, etc., etc… Chega de eficiência no Processo Penal!

O próprio Rui Barbosa já afirmava “não se dever combater um exagero” (no caso a violência desenfreada) “com um absurdo” (a delação premiada). Não esqueçamos a lição de Hegel, para quem, a ética é filosofia do Direito, entre outras coisas porque o Estado é a expressão máxima de eticidade, ou seja, a substancialização da moralidade nas instituições históricas que a garantem.[13]

Em uma de suas crônicas, João Ubaldo Ribeiro, após lembrar que as expressões “dedo-duro” e “dedurismo” surgiram ou generalizaram-se após o golpe militar de 1964, escreveu:

“Os próprios militares e policiais encarregados dos inquéritos tinham desprezo pelos dedos-duros – como, imagino, todo mundo tem, a não ser, possivelmente, eles mesmos. E, superado aquele clima terrível seria de se esperar que algo tão universalmente rejeitado, epítome da deslealdade, do oportunismo e da falta de caráter, também se juntasse a um passado que ninguém, ou quase ninguém, quer reviver. Mas não. O dedurismo permanece vivo e atuante, ameaçando impor traços cada vez mais policialescos à nossa sociedade.” E, conclui: “Sei que as intenções dos autores da idéia são boas, mas sei também que vêm do desespero e da impotência e que terminam por ajudar a compor o quadro lamentável em que vivemos, pois o buraco é bem, mas bem mesmo, mais embaixo.”[14]

Óbvio que o Sistema Jurídico deve se revestir de toda uma estrutura e autonomia, a fim de poder realizar seu trabalho a contento, sem necessitar de expedientes escusos na elucidação dos delitos. A Polícia e o Ministério Público, por exemplo, têm a obrigação de, por outros meios (menos eficientes, é bem verdade…), valer-se de meios efetivos para a consecução satisfatória de suas finalidades (que não são as mesmas do Sistema Social, Econômico e Político, diga-se de passagem), não sendo necessário, portanto, que uma lei ordinária use do prêmio ao delator como expediente facilitador da investigação policial e da efetividade da punição.

Ademais, no próprio Código Penal já existe a figura da atenuante genérica do art. 65, III, b, onde a pena será sempre atenuada quando o agente tiver “procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano”, que poderia muito apropriadamente compensar (por assim dizer) uma atitude do criminoso no auxílio à autoridade investigante ou judiciária.

Além da atenuante referida há o instituto do arrependimento eficaz que, igualmente, beneficia o agente quando este impede voluntariamente que o resultado da execução do delito se produza, fazendo-o responder, apenas, pelos atos já praticados (art. 15 do Código Penal).

Pode-se, ainda, referir-se ao preceito do art. 16, arrependimento posterior, bem verdade que este limitado àqueles crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, mas, da mesma forma, compensador de uma atitude favorável por parte do delinqüente, reduzindo-lhe a pena.

Vê-se, destarte, que o ordenamento jurídico existente e consubstanciado no Código Penal já permitia beneficiar o réu em determinadas circunstâncias, quando demonstrasse “menor endurecimento no querer criminoso, certa sensibilidade moral, um sentimento de humanidade e de justiça que o levam, passado o ímpeto do crime, a procurar detê-lo em seu processo agressivo ao bem jurídico, impedindo-lhe as conseqüências”, como já acentuou o mestre Aníbal Bruno.[15] Não necessita, portanto, o legislador, em lei extravagante, vir a prever a delação premiada, como causa de diminuição da pena. Também por isso é inoportuno.

Em nome da segurança pública, falida devido à inoperância social do Poder e não por falta de leis repressivas, edita-se um sem número de novos comandos legislativos sem o necessário cuidado com o que se vai prescrever. Incita-se, então, à traição, este mal que já matou os conjurados delatados pelo crápula Silvério dos Reis; que levou Jesus à cruz por conta da fraqueza de Judas e deu novo alento aos invasores holandeses graças à ajuda de Calabar.

Aliás, como bem lembrado por Sérgio Rodas, “Autos da Devassa”, foi uma delação premiada a responsável pela morte de Tiradentes, há 223 anos:

“No final do século 18, os mineiros estavam descontentes com a Coroa Portuguesa. Em 1785, a rainha d. Maria I proibiu que fossem produzidos na colônia manufaturas de ouro, prata, seda, algodão, linho e lã. Quatro anos depois, a metrópole resolveu compensar a queda na arrecadação — resultado do declínio econômico de Minas Gerais — instituindo uma forma mais eficiente de recolher o Quinto, imposto que garantia aos portugueses 20% de todo minério extraído até o teto de cem arrobas anuais (1,5 tonelada). Conhecida como “derrama”, a prática consistia em confiscar bens e objetos de ouro para garantir que a meta tributária não seria descumprida.Essas medidas inflamaram a elite da época. Inspirados pela independência dos Estados Unidos da América e pelo movimento intelectual que culminaria na Revolução Francesa, um grupo de bacharéis, militares, comerciantes e fazendeiros passou a se reunir rotineiramente nas casas dos poetas Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, que também era desembargador e foi apontado como o líder do movimento. A principal ideia deles era se livrar do domínio lusitano e tornar Minas Gerais um país independente, que seria organizado sob a forma de república.Quando soube do movimento, Silvério dos Reis vislumbrou uma oportunidade de obter os benefícios do parágrafo 11 do Título VI das Ordenações Filipinas (lei vigente na metrópole e em todas as colônias na época) e se livrar das pesadas dívidas que possuía junto à Coroa Portuguesa. De acordo com o livro O Processo de Tiradentes, escrito pelos advogados Ricardo Tosto e Paulo Guilherme Mendonça Lopes e editado pela ConJur, o dispositivo “previa não só o perdão, mas também favores do Reino para quem primeiro delatasse a existência de atos de crime de Lesa Majestade”. Este delito, tipificado no Título VI da mesma norma, era aplicado em caso de “traição cometida contra a pessoa do Rei, ou seu real Estado”.Visando à sua redenção, Silvério dos Reis resolveu abrir o bico – mas por livre e espontânea vontade, e não devido à coação de uma prisão preventiva. Ele então procurou o visconde de Barbacena e governador da Capitania de Minas Gerais na época, Luís Antônio Furtado de Mendonça, e contou tudo o que sabia. Depois de um mês, o nobre pediu que o dedo-duro formalizasse a denúncia por escrito, para que ela fosse enviada ao vice-rei, D. Luis de Vasconcelos.Na carta, Silvério dos Reis relatou que, certa vez, fora convidado a participar da conjuração pelo sargento-mor Luís Vaz. Este, segundo o delator, contara que Tomás Antônio Gonzaga liderava um grupo que iria mandar mais de 460 “pés-rapados”, “que haviam de vir armados de espingardas e facões, e que não haviam de vir juntos para não causar desconfiança; e que estivessem dispersos, porém perto da Vila Rica, e prontos à primeira voz”.Prontos para quê? Para fazer cabeças rolarem. E “a primeira cabeça que se havia de cortar era a de V. Excia. [visconde de Barbacena] e depois, pegando-lhe pelos cabelos, se havia de fazer uma fala ao povo que já estava escrita pelo dito Gonzaga; e para sossegar o dito povo se havia levantar os tributos”. E o suposto massacre não terminaria aí: os conjurados também decapitariam o ouvidor de Vila Rica, Pedro José de Araújo, o escrivão da Junta, Carlos José da Silva e o ajudante de Ordens Antônio Xavier – e talvez o intendente – “porque estes haviam de seguir o partido de V. Excia. [visconde de Barbacena]”.Conforme contou Silvério dos Reis, os inconfidentes o convidaram para participar do levante por saberem que ele devia dinheiro para a Coroa Portuguesa. Porém, logo deixaram claro que, se ele divulgasse os planos deles às autoridades, seria assassinado.O vigário da Vila de São José, Carlos Correia, disse ao delator que, para a conjuração, “trabalhava fortemente o alferes pago Joaquim José”, o qual já tinha vários seguidores nessa cidade e planejava angariar mais sujeitos no Rio de Janeiro, “pois o seu intento era também cortar a cabeça do Senhor Vice-Rei”. O relato do padre foi posteriormente confirmado por Silvério dos Reis quando ele encontrou Tiradentes, que lhe “fez certo o seu intento e do ânimo que levava”.Após ler a denúncia, o vice-rei determinou a abertura da devassa – uma mistura de inquérito criminal e processo judicial – para apuração dos fatos e julgamento dos culpados. Ao final, os juízes da Alçada culparam todos os inconfidentes pelo crime de Lesa Majestade.No entanto, só Tiradentes foi condenado à morte. Uns dizem que foi por ele ser o único réu confesso. Outros, por ser o mais pobre dos acusados. Controvérsias à parte, o fato é que a rainha d. Maria I converteu a pena dos demais conjurados em exílio para a África.Em 21 de abril de 1792, Tiradentes foi enforcado em praça pública no Rio de Janeiro. Depois de morto, seu corpo foi esquartejado.Atualmente, o delator que colaborar com as investigações e tiver comprovadas as informações que prestou pode ter a pena reduzida em dois terços, substituída por penas restritivas de direitos, como prestação de serviços à comunidade, ou até receber perdão judicial.Contudo, no Brasil Colônia, dedurar criminosos valia (ainda) mais a pena. Por ter denunciado os agitadores da Inconfidência Mineira, Silvério dos Reis recebeu, em Lisboa, o foro de fidalgo da Casa Real e o hábito da Ordem de Cristo. Além disso, suas dívidas com a Coroa Portuguesa teriam sido perdoadas, e ele teria recebido ouro, uma mansão e o cargo público de tesoureiro da bula de Minas Gerais, Goiás e Rio de Janeiro.A partir daí, Silvério dos Reis adicionou “Joaquim” a seu nome e se mudou para Campos dos Goytacazes, que fazia parte da Capitania de São Tomé e hoje integra o estado do Rio de Janeiro. Lá, o novo-rico, junto com seu sogro, passou a cobrar foros indevidos dos locais e expulsar das terras os que não aceitavam a extorsão, de acordo com o livro O Processo de Tiradentes.Empolgado pelas recompensas que recebeu por denunciar os conjurados, mas querendo ganhar mais prêmios da metrópole, Silvério dos Reis planejou uma nova delação premiada, dessa vez contra o alferes Joaquim Vicente dos Reis, que combatia as arbitrariedades dele e de seu sogro na região. Como não havia crime a denunciar, o chantagista inventou uma denúncia e acusou o militar ter aberto duas cartas lacradas endereçadas ao vice-rei. Para corroborar sua tese, ele apresentou duas testemunhas, com quem havia previamente combinado o teor de seu depoimento.Porém, uma dela falou mais do que devia, gerando contradição com o depoimento de Silvério dos Reis. Por essa razão, a devassa foi arquivada, sepultando seu plano de obter mais recompensas. Pior ainda: os moradores de Campos dos Goytacazes denunciaram à Coroa Portuguesa os abusos de Silvério Reis e seu sogro. Embora o processo não tenha sido concluído, a ofensiva dos locais acabou forçando o delator dos inconfidentes a se mudar para a Baixada Fluminense.Silvério dos Reis morreu em 1819, no Maranhão, não tão rico quanto gostaria, mas certamente com melhores condições de vida do que as que tinha antes de delatar Tiradentes e os demais líderes da Inconfidência Mineira.”[16]

Esses traidores históricos, e tantos outros poderiam ser citados, são símbolos do que há de pior na espécie humana; serão sempre lembrados como figuras desprezíveis. Advirta-se, que não estamos a fazer comparações, pois sequer são neste caso cabíveis. Apenas tencionamos mostrar a nossa indignação com a utilização da ordem jurídica como instrumento incentivador da traição, ainda que se traia um sequestrador, um corrupto, um latrocida ou um estuprador.

Do jeito que as coisas estão indo, far-se-á como um professor pernambucano o fez, no “governo” do Marechal Humberto Castello Branco: instituiu uma agenda para delatores, “informando que aceitaria denúncias às segundas, quartas e sextas, das oito ao meio-dia.”[17]

Não podemos nos valer de meios esconsos, em nome de quem quer que seja ou de qualquer bem, sob pena, inclusive, de sucumbirmos à promiscuidade da ordem jurídica corrompida. Esta nossa posição, sem sombra de dúvidas, sofre forte contestação; de toda maneira, valhemo-nos da lição de Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, segundo a qual “autores sofrem o peso da falta de respeito pela diferença (o novo é a maior ameaça às verdades consolidadas e produz resistência, não raro invencível), mas têm o direito de produzir um Direito Processual Penal rompendo com o saber tradicional, em muitos setores vesgo e defasado (…).”[18]

Como diria Graciliano Ramos, já nos anos 30, estamos agora cheios de “energúmenos microcéfalos vestidos de verde a esgoelar-se em discursos imbecis, a semear delações.”[19] Em nosso caso, seriam “energúmenos microcéfalos” engravatados ou embecados!

E o que dizer do mau vezo de se prender provisoriamente com o manifesto fim de obter a delação premiada? Hoje no Brasil, especialmente em Curitiba, decreta-se a prisão provisória sem absolutamente nenhuma necessidade. Deixa-se o sujeito (de direitos) preso por meses, torturando-o portanto, até que ele sucumbe e resolve falar, denunciando “Deus e o mundo” para escapar da punição e obter os “prêmios” os mais estapafúrdios, ilegais mesmo, como se viu na “Operação Lava Jato”. A propósito, vejamos o que disse o Ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio, durante o programa Espaço Público, da TV Brasil, ao ser questionado a respeito da postura do Juiz Federal Sérgio Moro na “Operação Lava Jato”: “Não posso desconhecer que se logrou um número substancial de delações premiadas e se logrou pela inversão de valores, prendendo para, fragilizado o preso, alcançasse a delação. Isso não implica avanço, mas retrocesso cultural. Imagina-se que de início a delação premiada seja espontânea e surja no campo do direito como exceção e não regra. Alguma coisa está errada neste contexto.”[20]

E, já concluindo, lembremos:

1) O art. 5º., LVI da Constituição Federal, estabelece expressamente que são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.

2) O mesmo art. 5º., LIV, impõe a observância do devido processo legal para que alguém seja privado da sua liberdade.

3) O devido processo constitucional exige a obediência aos princípios da República Federativa do Brasil (que se constitui em um Estado Democrático de Direito), estabelecidos expressamente na Constituição, dentre os quais, o respeito à cidadania, à dignidade da pessoa humana e a prevalência dos direitos humanos (arts. 1º., caput, II e III e 4º. da Constituição).

4) Ademais, constitui um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil e do Estado Democrático de Direito, constituir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º., I, da Constituição).

5) O art. 157 do Código de Processo Penal (alterado em 2008, pela Lei nº. 11.690) estabelece que deve ser entendida como prova ilícita aquela obtida em violação a normas constitucionais, devendo ser desentranhada dos autos.

6) Se a delação premiada, por tudo quanto foi dito acima, fere aqueles princípios e objetivos da Constituição Federal, ela é uma prova ilícita.

7) “O Estado, enquanto reserva ética, não pode assumir este papel vingativo”[21] de incentivador de delações, e ainda premiar os delatores autores de crimes gravíssimos. Isso “somente serve para gerar mais violência e degradação dos valores éticos mínimos para a coexistência social”.[22]

Portanto, será mesmo a delação premiada compatível com a Constituição Federal? Mutatis mutandis, podemos seguir este raciocínio de Juarez Cirino dos Santos, quando trata da possibilidade da interceptação telefônica:

“Se um procedimento clandestino de investigação criminal, autorizado por exceção à regra da inviolabilidade das comunicações, lesiona os princípios constitucionais superiores (a) do devido processo legal, mediante radical negação da igualdade de armas entre acusação e defesa, (b) do contraditório, que define o espaço exclusivo de produção da prova válida no processo penal, indispensável para avaliação crítica da legalidade da prova pela acusação e defesa, (c) da ampla defesa, excluída da produção de prova criminal clandestina, da qual não pode participar, (d) da proteção contra autoincriminação, mediante invasão enganosa ou ardilosa das esferas garantidas da privacidade e da intimidade do cidadão, (e) da presunção de inocência, substituída por odiosa presunção de culpa contra o cidadão, então o procedimento da interceptação de comunicações telefônicas, instituído em direta oposição a garantias constitucionais superiores do cidadão no processo penal, é inconstitucional.”[23]

* Autor: Rômulo de Andrade Moreira – Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia e Professor de Direito Processual Penal da Faculdade de Direito da Universidade Salvador – UNIFACS. Pós graduado em Direito Processual pela UNIFACS e pela Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca.

***

Notas:

[1] Em conferência realizada no Brasil, em Guarujá, no dia 16 de setembro de 2001, Zaffaroni contou a parábola do açougueiro: “El canicero es un señor que está en una carnicería, con la carne, con un cuchillo y todas esas cosas. Si alguien le hiciera una broma al canicero y robase carteles de otros comércios que dijeran: ‘Banco de Brasil’, Agencia de viages’, ‘Médico’, ‘Farmacia’, y los pegara junto a la puerta de la carnicería; el carnicero comenzaria a ser visitado por los feligreses, quienes le pedirían pasajes a Nueva Zelanda, intentarían dejar dinero en una cuenta, le consultarían: ‘tengo dolor de estómago, que puede hacer?’. Y el carnicero sensatamente responderia: ‘no sé, yo soy carnicero. Tiene que ir a otro comercio, a otro lugar, consultar a otras personas’. Y los feligreses se enojarían: ‘Cómo puede ser que usted está ofreciendo un servicio, tiene carteles que ofrecen algo, y después de no presta el servicio que dice?’. Entonces tendríamos que pensar que el carnicero se iría volviendo loco y empezaria a pensar que él tiene condiciones para vender pasajes a Nueva Zelanda, hacer el trabajo de un banco, resolver los problemas de dolor de estómago. Y puede pasar que se vuelva totalmente loco y comience a tratar de hacer todas esas cosas que no puede hacer, y el cliente termine con el estómago agujereado, el otro pierda el dinero, etc. Pero si los feligreses también se volvieran locos y volvieran a repetir las mismas cosas, volvieran al carnicero; el carnicero se vería confirmado en ese rol de incumbencia totalitaria de resolver todo.” Conclui, então, o mestre portenho: “Bueno, yo creo que eso pasó y sigue pasando con el penalista. Tenemos incumbencia en todo.”

[2] Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 5a. ed., 1995, p. 2.074.

[3] Por todos, leia-se a obra de Alberto Silva Franco, Crimes Hediondos, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 4a. ed., 2000.

[4] Natália Oliveira de Carvalho, A Delação Premiada no Brasil, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, p. 78.

[5] https://secure.jurid.com.br/new/jengine.exe/cpag?p=jornaldetalhedoutrina…

[6] Manual da Inquisição, por Nicolau Eymereco, Curitiba: Juruá, 2001, (tradução de A. C. Godoy).

[7] Heloísa Estelita, “A delação premiada para a identificação dos demais coautores ou partícipes: algumas reflexões à luz do devido processo legal”, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim: São Paulo, ano 17, n. 202, p. 2-4, set. 2009. Para nós é tremendamente perigoso que o Direito Positivo de um país permita, e mais do que isso incentive os indivíduos que nele vivem à prática da traição como meio de se obter um prêmio ou um favor jurídico.

[8] Apud Paulo Rangel, in Direito Processual Penal, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 7ª. ed., 2003, p. 605.

[9]https://secure.jurid.com.br/new/jengine.exe/cpag?p=jornaldetalhedoutrina&ID=14287&Id_Cliente=10487

[10] Lições Preliminares de Direito, São Paulo: Saraiva, 19a. ed. 1991, p. 60.

[11] Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Ano 13, nº. 154, setembro/2005, p. 9.

[12] Disponível em http://jota.info/critica-ao-pensamento-juridico-brasileiro-segundo-manga….

[13] Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Princípios da filosofia do direito (tradução de Orlando Vitorino), 2ª. edição, Lisboa: Martins Fontes, 1976, § 258, p. 216.

[14] Publicada no jornal O Globo, na edição do dia 17 de dezembro de 1995

[15] Direito Penal, 4a. ed. Tomo. III, p. 140, 1984.

[16] http://www.conjur.com.br/2015-mai-02/delacao-premiada-foi-responsavel-mo…, acessado dia 02 de maio de 2015, 10h44.

[17] Revista Civilização Brasileira nº. 1, março de 1965, p. 243 (apud Elio Gaspari, in “A Ditadura Envergonhada”, São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2002, p. 221 (1ª. reimpressão).

[18] O Núcleo do Problema no Sistema Processual Penal Brasileiro, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, nº. 175, junho/2007, p. 11.

[19] Memórias do Cárcere, Vol. 1, p. 51.

[20] http://www.conjur.com.br/2015-jun-03/financiamento-privado-custara-caro-…, acessado no dia 05 de fevereiro de 2016.

[21] Como diria Aury Lopes Jr., Direito Processual Penal, São Paulo: Saraiva, 2013, 10ª. edição, p. 850.

[22] Rogério Schietti Machado Cruz, Prisão Cautelar – Dramas, Princípios e Alternativas, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 8.

[23] http://justificando.com/2015/05/13/interceptacoes-telefonicas-sao-consti…

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http://www.ocafezinho.com/2017/05/03/coletivo-ministerio-publico-repudia-delacao-premiada/

ZÉ Dirceu está em liberdade 03/05/2016


DIRCEU ESTÁ EM LIBERDADE



O ex-ministro José Dirceu acaba de deixar o Complexo de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, onde ficou preso por dois anos; o juiz Sergio Moro determinou que ele use tornozeleira eletrônica e permaneça na cidade onde reside, Vinhedo, no interior de São Paulo; a medida foi tomada um dia após a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal revogar prisão preventiva de Dirceu na Operação Lava Jato



247 - O ex-ministro José Dirceu deixou na tarde desta quarta-feira 3 o Complexo Médico-Penal (CMP) em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, onde ficou preso preventivamente por quase dois anos.

Sua saída ocorre um dia depois da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal revogar sua prisão preventiva, sob protestos de procuradores da República que integram a força-tarefa da Operação Lava Jato.

Nesta quarta-feira 3, questionados sobre o assunto, os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello negaram que a decisão de soltar Dirceu possa trazer prejuízos à investigação, que segundo eles é 'realidade irreversível' no País.

O juiz Sergio Moro determinou que ele use tornozeleira eletrônica e permaneça na cidade onde reside, Vinhedo, no interior de São Paulo. Da saída da prisão, Dirceu seguiu para a Justiça Federal em Curitiba para colocar a tornozeleira, e depois será liberado.

Por meio de petição, o advogado de Dirceu, Roberto Podval, informou a Moro que seu cliente já entregou seu passaporte ao STF, uma das condições impostas para a soltura, e pediu que o endereço de domicílio seja mantido em sigilo.

Leia mais na Agência Brasil:

Moro determina que Dirceu deixe prisão com tornozeleira eletrônica

Daniel Isaia - O juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, decidiu hoje (3) que o ex-ministro José Dirceu deverá deixar a prisão com o uso de tornozeleira eletrônica e permanecer na cidade onde reside, Vinhedo, no interior de São Paulo. A medida foi tomada um dia após a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) revogar prisão preventiva de Dirceu na Operação Lava Jato.

"Há um natural receio de que, colocado em liberdade, [Dirceu] venha a furtar-se da aplicação da lei penal", avaliou Moro no despacho, ao lembrar que o ex-ministro já foi condenado a cerca de 32 anos de prisão. "A prudência recomenda então a sua submissão à vigilância eletrônica e que tenha seus deslocamentos controlados", completou o juiz, que havia decretado a prisão preventiva do ex-ministro.

José Dirceu também não poderá deixar o país e terá de entregar seus passaportes brasileiros e estrangeiros à Justiça. Moro também o proibiu de se comunicar com outros acusados e testemunhas nas ações penais a que responde, com exceção das testemunhas de defesa arroladas pela defesa do ex-ministro.

Saiba Mais
Supremo revoga prisão preventiva de Dirceu na Lava Jato
Lava Jato: MPF oferece nova denúncia contra José Dirceu
O juiz federal não exigiu pagamento de fiança para que Dirceu deixe a prisão por entender que já há ação de sequestro de bens proposta contra ele.

A prisão domiciliar também foi descartada por Moro porque, segundo ele, não cabe esse tipo de prisão neste processo.

José Dirceu está preso no Complexo Médico-Penal, em Pinhais, região metropolitana de Curitiba, desde agosto de 2015.

Em maio do ano passado, Dirceu foi condenado a 23 anos de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Na sentença, Moro decidiu manter a prisão preventiva. Posteriormente, o ex-ministro da Casa Civil teve a pena reduzida para 20 anos e 10 meses. Ele foi acusado de receber mais de R$ 48 milhões por meio de serviços de consultoria, valores que seriam oriundos de propina proveniente de esquema na Petrobras, de acordo com os procuradores da Lava Jato.

Na manhã de ontem (2), o Ministério Público Federal (MPF) ofereceu nova denúncia contra o ex-ministro José Dirceu pelo suposto recebimento de propina de empreiteiras entre 2011 e 2014.




http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/293599/Dirceu-est%C3%A1-em-liberdade.htm

José Dirceu livre, mas ainda assim injustiçado, por Fábio de Oliveira Ribeiro 03/05/2017





Foto: Marcello Casal/Agência Brasil

Por Fábio de Oliveira Ribeiro
Várias pessoas comemoraram a soltura de José Dirceu a mando do STF. Não farei isto por dois motivos.

1o. - A votação do HC de José Dirceu não foi unânime. Portanto, uma parcela significativa da cúpula do judiciário segue dando apoio incondicional às ilegalidades cometidas por Sérgio Moro.

É de fato preocupante a cumplicidade entre o STF e um juiz de primeira instância que se comporta como se fosse a única fonte da Lei que é, por dever funcional, obrigado a fielmente cumprir e fazer cumprir. Enquanto as decisões de Moro continuarem a ser referendadas por alguns Ministros, ele se sentirá absolutamente livre para continuar a impor sua vontade como se ela fosse a única Lei que ele está obrigado a respeitar.

2o. - José Dirceu ficou preso injustamente. A soltura dele após tanto tempo não irá remediar esta injustiça.

De todos os ramos do Direito, o Direito Penal é aquele que lida com o bem jurídico mais valioso para o cidadão: a liberdade. Ele não deve ser exercido de maneira leviana, pois a liberdade é a regra e a restrição dela é uma exceção que só deveria ser imposta após cuidadosa apreciação do caso pelo juiz. A fim de obter novas delações, Sérgio Moro tem mandado prender quem ele quer pelo tempo que bem entender.

Nas instâncias intermediárias (TRF e STJ), as prisões abusivas impostas pelo juiz da Lava Jato raramente são desfeitas. Melhor do que ninguém, ele sabe que um HC do réu levará bastante tempo para chegar ao STF. É óbvio que a demora entre o abuso e sua revogação funciona como uma tortura ilegalmente imposta ao cidadãos que não deveria ter sido preso. O excesso de rigor, em se tratando do Direito Penal, é exatamente isto: um excesso e, como tal, deveria ser evitado logo na primeira instância.

Quem vai indenizar o sofrimento que o José Dirceu sofreu? O juiz, o Estado, Deus todo poderoso? O que quer José Dirceu tenha feito - supondo que ele realmente tenha feito algo - não justifica a “terra em transe” em que ele está sendo obrigado a viver. Ele não cometeu nenhum crime de sangue. E muitos que cometeram crimes de sangue bem mais graves do que ele estão nas ruas a mando do próprio Judiciário como se fossem cidadãos de bem.

Digo e repito, a tardia decisão do STF no caso de José Dirceu não me impressionou. Ela apenas reafirmou duas impressões que eu tenho. A primeira é de que os juizes brasileiros se transformaram em caçadores de cabeças http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/sergio-moro-e-os-.... A segunda é que José Dirceu está sendo sacrificado porque é um ativo político para a direita quando está preso http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/jose-dirceu-sacrificado-ao-deus-mercado-no-altar-da-midia-por-fabio-de-o-ribeiro.

José Dirceu é um forte. Ele tem sofrido o que poucos aguentariam sofrer sem perder a dignidade, a sanidade mental e até mesmo a vida. Eu francamente gostaria de ver como aqueles o perseguem ficariam se - em virtude dos excessos de crueldade e abusos reiterados que repugnam à CF/88 e devem ser duramente reprimidos pelo Direito Penal - eles fossem obrigados a ficar presos por metade do tempo que o líder petista já cumpriu.

Livre, José Dirceu deve se tornar um arauto eloquente da nova Lei contra os abusos cometidos por juízes e promotores. Isto é o mínimo que devemos esperar dele. Força, companheiro. A luta apenas começou.


http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/jose-dirceu-livre-mas-ainda-assim-injusticado-por-fabio-de-oliveira-ribeiro

As tropas do Departamento de Justiça dos EUA, por André Araújo 03/05/2017


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Imagem: montagem com fotos de Heather Bell/USFWS e Petty Officer/U.S. Navy
 
Por André Araújo
 
Não é preciso mais Marines para invadir e ocupar países emergentes. Os EUA descobriram um método muito mais barato de imperialismo, que atende pelo nome de Acordos de Cooperação Judiciária, onde o lado MAIS FORTE comanda os outros pela lógica de quem tem o poder real manda em que tem apenas um poder formal. Um acordo entre países absolutamente desiguais jamais seria um acordo equilibrado, a balança vai sempre pender para a parte contratante mais forte.
 
Os EUA aplicam multas de US$ 2,6 bilhões ao Credit Suisse, US$900 milhões ao UBS Union des Banques Suisses, US$ 14 bilhões ao Deutsche Bank, US$ 230 milhões à Embraer, US$2,6 bilhões à Odebrecht, fecharam o banco suíço bicentenário Wegelin & Cie.,  prenderam o brasileiro José Maria Marin na Suíça, tudo com base nos Acordos de Cooperação Judiciária, MAS alguém ouviu falar de um País aplicar multas a empresas americanas nos EUA e prender americanos dentro dos EUA? 
 
Claro que não, os Acordos são a FAVOR dos EUA e contra outros países. A Chevron vazou óleo nas águas brasileiras da bacia de Campos?  O governo do Brasil pensou em processar a Chevron NOS EUA? Jamais  se atreveria a pedir a cooperação do Departamento de Justiça para tal atrevimento, mas o Brasil  ofereceu servilmente entregar a Petrobras e a Odebrecht  ao Departamento de Justiça, para lá serem processadas e multadas e, no caminho, terem que contratar caríssimos advogados americanos, depois disso o Departamento de Justiça indica fiscais americanos (“Monitors”) para ficarem DENTRO  da Petrobras e da Odebrecht por 10 anos, controlando todos os contratos, obras, investimentos para ver se as empresas atendem aos padrões americanos de COMPLIANCE.
 
Parece um delírio? Não, é a PURA REALIDADE que está acontecendo agora.
 
Nessas duas empresas, os fiscais (“Monitors”) já estão no Brasil dentro das empresas, também estão na EMBRAER acompanhando todo seu programa de venda de aviões. E quem paha esses fiscais, seus honorários e manutenção? Ora, que pergunta, somos nós, os brasileiros, NÓS pagamos tudo, as multas, os advogados, os fiscais e ainda ficamos contentes com o privilégio de sustentar esse circo de horrores. E, atenção, os honorários dos fiscais são ALTÍSSIMOS.
 
O pior não é o fato, o pior são funcionários do governo brasileiro acharem isso normal a até prazeroso, batem palmas em homenagem aos senhores americanos de quem também recebem “homenagens” orgulhosamente noticiadas por nossa imprensa servil e ignorante.
 
Ninguém, nem as autoridades brasileiras e muito menos a imprensa ignorante, vê a aberração da AFRONTA A NOSSA SOBERANIA, somos tratados abaixo do Haiti e acham isso ótimo.
 
A nossa mídia idiota noticia com orgulho que somos cumprimentados pelas autoridades de outros países como EXEMPLO de combate à corrupção, nos automutilamos e ficamos felizes.
 
Os Acordos de Cooperação Judiciária são para os EUA agirem contra e em outros Países, NÃO é para outros Países agirem dentro e contra os EUA, deu para entender?
 
Se existe uma cláusula histórica nos EUA é essa,  eles NÃO ACEITAREM, EM HIPÓTESE ALGUMA, jurisdição estrangeira em seus assuntos e sobre seus nacionais, todos os Tratados onde os EUA são parte destacam como CLÁUSULA PÉTREA que cidadãos americanos NÃO SE SUBMETEM À JURISDIÇÃO ESTRANGEIRA, nunca e em nenhuma hipótese.
 
Então os Acordos são um INSTRUMENTO de intervenção do Governo dos EUA dentro de outros países, atingindo suas empresas e cidadãos, MAS não é para esses Países se imiscuirem nos EUA contra suas empresas e cidadãos, é preciso que isso fique bem claro.
 
Não é preciso desembarcar tropas nem tanques, os procuradores  de cada País funcionam como prepostos do controle sobre empresas que estão se lançando nos mercados externos concorrendo com as americanas e em outro patamar vetam ou prendem políticos que não estão no figurino de colaboração com os EUA, portanto esses Acordos que nascem de uma boa intenção servem para o poder geopolítico dos EUA, foram desenhados para isso.
 
OS EUA são campeões mundiais na ciência e aplicação de instrumentos de poder A REBOQUE DE BOAS CAUSAS. Ninguém é a favor da corrupção, da lavagem de dinheiro e do terrorismo, MAS essas boas causas podem também ser usadas como cobertura para projeção de poder dos EUA sobre o mundo. Os americanos são PERITOS nisso, é o “faz de conta” que fez Hollywood ser a meca do cinema e a Disneyworld ser o mundo da fantasia encantada.
 
A montagem de cenários de “make believe”, faz de conta, é uma invenção americana.
 
Logo depois do fim da Primeira Guerra Mundial, a antiga Rússia Imperial transformada em União Soviética conheceu um período de FOME pavoroso, porque, com a Grande Guerra, os campos deixaram de ser cultivados e os estragos da guerra provocaram uma completa escassez de alimentos até a agricultura ser reconstituída sobre a terra arrasada.
 
O futuro presidente Herbert Hoover,  ao fim da Grande Guerra e morando em Londres, era um rico engenheiro de minas, coordenou uma comissão para ajuda à Bélgica e norte da França, levando alimentos a essa área especialmente devastada pela ocupação alemã. A chamada Comissão Hoover para Socorro à Bélgica se transformou em grande ampliação em um ente oficial, a Comissão Americana de Socorro (American Relief Commission), já com dinheiro público, mandou alimentos aos hospitais de São Petersburgo, e em um novo programa, ofereceu ajuda à União Soviética para suprir o País de alimentos, visando atravessar o período negro da fome nas cidades. Foi uma oferta generosa, Lenin agradeceu mas ao ver as “condições” da Comissão recusou o auxílio. Porque? As “condições” significariam entregar o domínio de vasto território da Rússia europeia, incluindo São Petersburgo e Moscou,  ao “controle” da Comissão  Americana de Socorro, quer dizer, eles entregavam alimentos mas controlariam todo o transporte, a logística,  a rede ferroviária, a forma de distribuição e armazenamento, o sistema de cadernetas de entrega para cada família, os pontos de entrega da farinha, a propaganda implícita nos anúncios de distribuição.
 
Lenin educadamente recusou a proposta de ajuda, porque viu que por trás da filantropia havia um mecanismo de governo paralelo do território através da doação de alimentos.
 
A narrativa está detalhadamente contada no livro A RÚSSIA E O OCIDENTE, de George Kennan, o diplomata mais importante dos EUA no Século XX, Embaixador em Moscou na década de 50 e chefe do planejamento estratégico do Departamento de Estado. Esse livro existe em português (Editora Forense) e sugiro a leitura, também em português, da primeira parte das memórias de Kennan, em dois volumes, 1915-1950, editora Top Books, publicado no Brasil entre outras razões por minha sugestão. Vê-se então que já naquela longínqua época os EUA usavam a capa das CAUSAS NOBRES para mascarar  ações geopolíticas de primeira grandeza.
 
Hoje essas CAUSAS NOBRES se escondem atrás dos Acordos de Cooperação Judiciária, que permitem ao Departamento de Justiça INTERVIR dentro de Países como se os EUA fosse um poder soberano universal, sempre em nome de boas causas, combate ao tráfico de drogas, ao terrorismo, à lavagem de dinheiro, à corrupção, todas são bons disfarces para a intervenção descarada e muito bem aceita por seus parceiros locais, que se julgam honrados em tal papel.
 
Mas porque os Países aceitam esses Acordos? Em grande parte  por IGNOR NCIA das reais intenções dos EUA,  por subserviência, por vontade de agradar, por falta de percepção intelectual. O General De Gaulle, por exemplo, sempre  astuto e com sexto sentido, jamais confiou nos americanos e nunca quis saber de seus programas de “cooperação” porque percebia a mão do gato por trás desses acordos aparentemente a favor de boas causas.
 
A ação do Departamento de Justiça é altamente seletiva e tem pontaria geopolítica.
Quando o País alvo colabora e se submete voluntariamente aos EUA o Departamento de Justiça não precisa gastar esforços, queimar energia e mão de obra, o território “já está na rede”, a cooperação “está´no papo”, já é território conquistado.
 
O Brasil como ESTADO NACIONAL tinha obtido extraordinária projeção de poder na América Latina e na África através de suas empreiteiras e marqueteiros políticos, operando e influenciando governos que se ligavam dessa forma ao Brasil. Era um esquema azeitado e operacional, conjugando obras e verbas para campanhas políticas, Talleyrand não faria melhor, o Brasil usando todas as armas para se posicionar no jogo do poder, o dinheiro era uma dessas armas, assim como a capacidade de infiltração nas esferas de poder de países emergentes, tudo dentro do figurino de grandes potências, que usam as mesmas armas há séculos.
 
Entra então o moralismo e DESTRÓI todo o esquema vitorioso, expulsando o Brasil desses países onde o nosso bom mocismo também desgraçou políticos locais amigos do Brasil e que nos foram benéficos em obras e projeção política. O Brasil foi varrido como potência influente em mais de 15 países para que nosso moralismo fosse glorificado no Departamento de Justiça, a custa dos interesses financeiros e políticos do Estado brasileiro. E ainda nossa mídia acha isso bonito, reparando depois que o Brasil “está em crise”. Quebram a locomotiva e depois se queixam que o trem não anda, não tem QI para ver que uma coisa tem ligação com outra ,as empreiteiras brasileiras abrem negócios para o Brasil em continuidade de sua presença.
 
Só um país completamente desmiolado joga fora o trabalho de décadas em nome da implantação da moralidade franciscana, mas aonde pensam que estão? Em que mundo?
 
Ora, o Brasil vai tornar Angola e Peru livres de corrupção, purificamos esses países ímpios porque nossos promotores denunciaram nossas empreiteiras e estas por sua vez denunciaram os políticos corruptos  desses países, onde éramos bem recebidos, como somos inteligentes, ora pois, Angola estava cada vez mais “abrasileirada”, agora entregamos Angola aos americanos e chineses, brasileiro lá nem como turista, entramos na casa e sujamos a cozinha.
 
Os cursos de “compliance” dos mais admirados pelos jovens advogados e executivos dos países colonizados, são uma invenção americana. Fazendo os cursos as mentes desses alunos já ficam formatadas para achar pelo em ovo em negócios e contratos, só servem se estão no figurino americano e dentro dos padrões da justiça e da advocacia pregada pelos americanos, mas que são mais um “faz de conta” que uma realidade, uma espécie de Disneyworld onde se recria um mundo de fantasia , lá tudo é bonito e limpinho, um mundo só do bem com alguns pecadilhos, como a Halliburton pagar US$150 milhões de propina na Nigéria, isso coisa bem recente, de 2011, na cara do “compliance” e do Departamento de Justiça, depois pegaram a corrupção, impuseram multa de US$ 456 milhões, a Halliburton pagou mas a empresa não foi nem tocada, nem chegou a arranhar seu valor de bolsa, a Halliburton seguiu poderosíssima, amparada por um de seus lordes, o ex-Vice Presidente Dick Cheney, é atuante no Brasil, um dos maiores fornecedores da Petrobras, bonitinha mas ordinária.
 
Se um país cheio de malvados for bonzinho com os EUA não precisa de “compliance”, as “boas causas” somem. O ruim vira bom, o corrupto vira santo, o lixão vira perfumaria.
 
A EXXON MOBIL, empresa símbolo dos EUA,  anteriormente conhecida como Standard Oil Co.of New Jersey, assinou em 2016 um contrato de exploração do pré-sal angolano com a SONANGOL, cuja fama  de empresa corrupta é lendária, sua presidente do Conselho, Isabel dos Santos, filha do Presidente vitalício, José Eduardo dos Santos, é a mulher mais rica da África, segundo a revista americana FORBES. 
 
Como a simpática,  charmosa e bonita Isabel dos Santos nunca foi empresária por seus próprios esforços e sim herdeira do pai, portanto a corrupção  no caso é  auto explicável, não precisa de “compliance”. Ora, se nos padrões americanos a corrupção é repulsiva, como o Departamento de Justiça aprovou o contrato da EXXON MOBIL com a SONANGOL, cadê o COMPLIANCE?  Os famosos ex-Ministros de Angola são quase todos bilionários, alguns bem conhecidos no Brasil, com apartamentos na Vieira Souto, o dinheiro deles veio da SONANGOL, de onde sumiram em um exercício contábil US$32 bilhões, segundo a imprensa econômica americana. Mas evidentemente a SONANGOL, ao contrário da Petrobras, jamais teve problemas com o Departamento de Justiça.
 
A ODEBRECHT é corrupta mas e a SONANGOL? Há uma diferença substancial, a Odebrecht concorre com empresas americanas mas a Sonangol COLABORA com uma empresa americana, o que explica tudo não é mesmo? Aos amigos tudo, aos inimigos COMPLIANCE.
 
O  pior da história é que tem gente no Brasil que acha ótima essa interferência do Departamento de Justiça no País. Quando Marin foi preso na Suíça por agentes do FBI, um ato de arrogância único, o governo do Brasil não defendeu Marin, portador de passaporte brasileiro e aqui no Brasil comentaristas esportivos como Juca Kfouri e Flávio Prado elogiaram a ação dos EUA, “agora a coisa é séria” dizia Prado no seu programa Mesa Redonda, Kfouri também ficou exultante, SEM PERCEBER o absurdo e a ilegitimidade de um governo estrangeiro prender um cidadão brasileiro em um terceiro País por delitos que não foram cometidos nos EUA, o fato de Marin ter ficha ruim é problema do Brasil e não dos EUA.
 
Quer dizer, a jurisdição americana se fazendo valer na Suíça para prender um brasileiro por delitos que não foram cometidos nem nos EUA e nem na Suíça, o FBI agindo como uma “ polícia do Mundo” e brasileiros achando isso normal e até elogiando SEM PERCEBER a aberração do ataque à soberania brasileira sem nenhuma cerimônia, o que demonstra uma completa alienação e desconhecimento do conceito de Estado nacional por parte de muitos brasileiros que não dão valor à nacionalidade e ao valor e prestígio de seu Estado protetor.
 
Na ÚNICA vez em que o Brasil poderia invocar o Acordo de Cooperação Judiciária de 2001 a seu favor, no caso dos pilotos americanos do Legacy que derrubaram no Brasil um jato da GOL causando 183 mortes, nesse caso o Acordo de Cooperação Judiciária NÃO FUNCIONOU, os EUA não entregaram os pilotos americanos condenados no Brasil e jamais entregarão, aliás o Brasil nem pediu porque já sabe que esse Acordo só funciona A FAVOR DOS INTERESSES AMERICANOS. Para completar o erro em cima do equívoco do Acordo, a autoridade brasileira que devia operar o Acordo, segundo estipulado no próprio Acordo, seria o Ministro da Justiça, titulado como AUTORIDADE CENTRAL no texto do Acordo. Pois no limite do absurdo o Ministério da Justiça ABDICOU desse poder e terceirizou a operação do Acordo na Procuradoria Geral da República, algo NÃO previsto no Acordo. A PGR não tem formalmente a representação diplomática no Acordo porque no Brasil a PGR não é um ente do Poder Executivo, único poder que representa no exterior o Estado brasileiro. Já a PGR é um organismo autônomo e jamais poderia se projetar fora do País, capacidade que é exclusiva e indelegável do Ministério da Justiça. Porque este abdicou desse poder?
 
Na minha visão por ignorância sobre a importância do Acordo e em segundo lugar por preguiça, vamos deixar esse trabalho para a PGR, que inclusive montou um setor para cuidar desses acordos. Portanto um acordo dessa importância não conta com a supervisão nem do Ministério da Justiça e nem do Ministério das Relações Exteriores. E o Brasil ainda pretende ter uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU, um País que não cuida nem de seu quintal quer patrulhar o mundo, é uma piada de mau gosto.
 
Mas porque a PGR não deve ser o operador do Acordo no Brasil? Porque o Acordo NÃO é apenas um mecanismo judicial, o Acordo TEM IMPLICAÇÕES POLÍTICAS , é assunto de Estado, não é assunto de uma burocracia jurídica apenas, questões econômicas de grande envergadura transitam SOB esse acordo, não é só uma questão de  processos e inquéritos, há interesses que afetam todos os aspectos do Estado, muito além de réus individuais.
 
Para fins de registro, o Acordo do Cooperação Judiciária Brasil-EUA de 2001  foi assinado pelo do Governo FHC e tem tudo a ver com a ideologia subserviente desse governo, mas o governo do PT nada fez para operar com visão nacional esse acordo, ao contrário, entregou sua gestão à burocracia judiciária,  quando o eixo desse acordo no Brasil é o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Desde sua assinatura, em 2001, NUNCA se viu na imprensa uma única manifestação do MINISTRO DA JUSTIÇA sobre esse acordo que coloca em xeque a SOBERANIA do Estado brasileiro sobre seus cidadãos e suas empresas, NEM UMA PALAVRA, COMENTÁRIO, OBSERVAÇÃO, o Acordo corre solto, as multas ainda sem a Petrobras já atingem BILHÕES DE DÓLARES a serem pagas ao Tesouro dos EUA, como se tudo isso fosse normal e aceitável.


 http://jornalggn.com.br/fora-pauta/as-tropas-do-departamento-de-justica-dos-eua-por-andre-araujo