sexta-feira, 22 de julho de 2016

Começa uma nova etapa da luta de classes no Brasil 22/07/2016


– A oligarquia financeira, os oligopólios e o agronegócio tomaram a chave do cofre


por Edmilson Costa [*]





A crise econômica, social e política brasileira mudou de patamar com impeachment da presidente Dilma Rousself e a usurpação do poder por uma gang de oligarcas corruptos, cujos principais personagens dominam o Parlamento brasileiro, vários escalões da administração e representam o que há de mais reacionário e obscurantista na sociedade brasileira. Ao lado dessa gang, está uma quadrilha sofisticada de ladrões de casaca, que tomaram de assalto todos os ministérios da área econômica e social para impor aos trabalhadores uma violenta regressão social e a entrega do patrimônio público e das riquezas nacionais para os monopólios nacionais e internacionais. Essa conjuntura representa, ao mesmo tempo, o desfecho de uma crise política que se vinha arrastando desde as eleições presidenciais, além do fim de um longo ciclo de lutas sociais no País iniciado com as greves do final da década de 70 e início dos anos 80, quando emergiram na cena política o Partido dos Trabalhadores (PT) e a Central Única dos trabalhadores (CUT), [1] além de outras organizações do movimento social.

A crise brasileira também não está dissociada da crise mais geral do capitalismo e dos métodos que o grande capital internacional, especialmente a oligarquia financeira, vem executado em várias partes do mundo para colocar na conta dos trabalhadores todo o ônus da crise, visando recuperar suas taxas de lucro. Desesperado diante da crise sistêmica que o castiga por cerca de 10 anos, o capital vem realizando uma ofensiva mundial contra os fundos públicos, salários, direitos e garantias dos trabalhadores e, para atingir seus objetivos, não hesita em restringir as liberdades democráticas, ampliar a repressão e, discretamente, incentivar grupos fascistas como uma espécie de Plano B caso a situação fuja de seu controle. Se antes medidas dessa ordem ocorriam apenas nos países da periferia, agora o capital vem tirando a máscara e executando essa estratégia em vários países da Europa, onde tem colocado no poder governos fantoches ou representantes diretos do capital. Mas cada dia amplia-se a contradição entre os interesses da oligarquia financeira, que representa menos de 1% da população, e o conjunto dos trabalhadores e da população em geral, fato que prenuncia um acirramento da luta de classes de caráter global.

Aqui no Brasil a situação não é diferente. Desde 2003 os governos petistas conseguiram desenvolver uma política que, voltada fundamentalmente para satisfazer os interesses gerais do grande capital, também realizou algumas políticas de compensação social, como o Bolsa Família, o aumento do salário mínimo e medidas que incentivaram o ingresso da juventude nas universidades públicas através do programa de cotas e financiamento estudantil para jovens estudantes das universidades privadas, cujos recursos transformaram o setor num conglomerado de oligopólios educacionais. No entanto, a própria crise mundial, aliada à desaceleração do crescimento da China, com a consequente queda no preço mundial das commodities , além de um conjunto de medidas desastrosas de política econômica interna, produziram um impacto devastador na economia brasileira. O Produto Interno Bruto (PIB) médio dos últimos cinco anos foi reduzido aos menores níveis dos últimos 50 anos e o desemprego cresceu de maneira avassaladora, atingindo atualmente cerca de 12 milhões de trabalhadores.

É necessário ressaltar ainda que em 2013 ocorreram as extraordinárias jornadas de luta , nas quais a juventude, os trabalhadores precarizados e setores da baixa camada média urbana emergiram em grandes manifestações, reunindo milhões de pessoas em mais de 600 cidades do País, reivindicando educação, saúde, transporte e infraestrutura de qualidade. [2] Essa confluência de fenômenos (crise econômica, social, política e manifestações de massa) acendeu a luz vermelha para a grande burguesia: o PT já não estava mais conseguindo administrar o capital e, o que é mais grave para a burguesia, não tinha mais condições de cumprir o papel de controlador e apassivador das lutas sociais que vinha desempenhando nos últimos 13 anos de governo. Portanto, era chegada a hora de um governo puro sangue do grande capital, que executasse de maneira rápida e profunda os ajustes regressivos contra os trabalhadores, realizasse o processo de privatização do que ainda resta de empresas públicas e entregasse o pré-sal para as corporações transnacionais.

Desenvolveu-se assim no Brasil uma crise completa – econômica, social, política e ética, própria do fim de um longo ciclo. Esse quadro foi a base material e política que uniu todos os setores da burguesia brasileira – indústria, finanças, comércio, serviços em geral e agronegócio –, em aliança com a mídia corporativa e amplas áreas do judiciário, para descartar o Partido dos Trabalhadores e instalar um governo direto da burguesia, disposto a realizar os ajustes predatórios de maneira mais veloz do que o PT vinha implementando de maneira mais lenta. A gravidade da crise não deixava às classes dominantes espaço para qualquer vacilação em relação à urgência da implantação dessas medidas. À luz do dia, a burguesia manobrou as instituições da maneira mais inescrupulosa possível, articulou a mídia para criar um clima favorável ao impeachment, mobilizou seus agentes no judiciário e na Polícia Federal para dar ares de legalidade ao impeachment e finalmente colocou em movimento o Parlamento, dócil e subserviente instrumento das classes dominantes, para consumar o rearranjo institucional burlesco. Estava assim consumada a farsa, com aparência de legalidade, mas na verdade instalou-se um governo ilegítimo e usurpador. Primeiro, porque todo o processo envolveu uma manipulação vergonhosa; segundo porque o presidente interino não teve um voto sequer para ter legitimidade; e terceiro porque, como se comprovou posteriormente, formou-se um governo em que a maior parte de seus integrantes está envolvida até a medula em processos de corrupção e que realizaram o impeachment para salvar a própria pele em função das investigações em curso da Operação Lava a Jato. [3]

Quem são os personagens da trama?

A crise brasileira é tão profunda que produz impactos até mesmo no perfil dos representantes da burguesia no governo. As classes dominantes já tiveram quadros mais qualificados tanto no Parlamento quanto no Executivo, mas desde a eleição de Fernando Collor, no início da década de 90, que vem encontrando dificuldades para extrair de seus próprios funcionários um personagem à altura para representar seus interesses. No entanto, os personagens desse governo e seus representantes no Parlamento são tão desqualificados que mais se assemelham a uma gang mafiosa do que efetivamente a políticos com respeitabilidade social e política. Bom, mas a burguesia não tem muito escrúpulo nessa questão da representação: a burguesia é prática e objetiva, o que almeja de fato é a defesa de seus interesses. Nesse particular, apesar da imagem escandalosamente negativa dos parlamentares, estes senhores têm votado subservientemente todas as medidas de interesses da burguesia.

O governo foi tomado de assalto por duas quadrilhas: os ladrões de casaca, representantes da oligarquia parasitária das finanças, que ocuparam os ministérios da área econômica e social e vem buscando implantar o ajuste predatório e a entrega do patrimônio público à iniciativa privada. Esses senhores tentam passar à sociedade uma aura de respeitabilidade, mas na verdade são os principais responsáveis pela sangria dos recursos dos fundos públicos e sua transferência para o capital privado, em função do pagamento dos juros da dívida interna. Em paralelo, operam os ladrões de galinha, representados no Parlamento e em vários postos da administração pública, cuja prática é auferir recursos através da corrupção, das negociatas e do fisiologismo, tanto para manter o poder das oligarquias nas várias regiões do País quanto para seu enriquecimento pessoal. No Parlamento, têm a significativa denominação de baixo clero, em virtude de suas limitadas capacidades intelectuais e protagonismo político nas questões gerais do País, mas em compensação são vorazes em termos de esperteza quando se trata de roubar os recursos públicos através da corrupção. [4] Vejamos os seus principais representantes:

O impeachment, por exemplo, foi comandado por Eduardo Cunha, um político delinquente, que merecia estar muito mais numa cadeia do que na presidência da Câmara dos Deputados. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal o afastou dessa função e o Conselho de Ética já encaminhou sua cassação para o plenário da Câmara Federal. Os 357 deputados que votaram pelo impedimento da presidente (um terço deles com processos na justiça) proporcionaram um espetáculo tão bizarro que custa a acreditar que aquela trupe de boçais seja realmente representante da população brasileira no Congresso Nacional. As pessoas costumam argumentar que este Parlamento representa o povo brasileiro porque foi eleito pela própria população. Essa é apenas a aparência da questão: como as eleições no Brasil são dominadas pelo financiamento privado, um parlamentar só pode se eleger se fizer coligação com o governo e/ou receber dinheiro das empresas, nos dois casos perdendo inteiramente sua independência política. Portanto, esse Parlamento não representa o povo: é a cara das classes dominantes brasileiras, que o financiaram e o elegeram. A ironia é que alguns daqueles parlamentares que dedicaram seus votos aos pais, mães, filho e maridos poucos dias depois tiveram parentes presos pela Polícia Federal por corrupção em setores da administração pública. No Senado, apesar do espetáculo do impeachment não ter sido tão deprimente como na Câmara, mais de duas dezenas de senadores também são investigados pela Justiça.

Mas se o enredo e consumação do impeachment foram eivados de manipulações, trapaças e acordos espúrios, a formação do novo governo não ficou nada a dever ao espetáculo da Câmara e do Senado. Esse é um governo que abriga os principais acusados de corrupção da política brasileira, a começar pelo próprio vice-presidente de Dilma e agora presidente interino, Michel Temer. Recente delação premiada, de um ex-diretor da Transpetro (empresa ligada à Petrobrás), Sergio Machado, uma espécie de Caixa 2 do PMDB, caiu como uma bomba no cenário político: Machado denunciou que Temer foi intermediário de propina no valor de R$ 1,5 milhão (U$ 500 mil) para um apadrinhado seu, candidato a prefeito em São Paulo em pleito passado. Detalhe burlesco: tudo foi acertado longe das câmaras, numa base área de Brasília o que, convenhamos, é um local no mínimo pitoresco para esse tipo de negociata. Além disso, Temer foi condenado, em definitivo, pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, sua base eleitoral, a ficar inelegível por oito anos. Isso sem falar que seu nome consta em várias planilhas de doações fraudulentas apreendidas pela polícia com diretores de empreiteiras investigados na Operação Lava a Jato. Além disso, em uma troca de mensagem num celular de Leo Pinheiro, executivo da empreiteira OAS, também apreendido pela polícia, há um fato estarrecedor: o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, reclamava indignado que Pinheiro havia pago R$ 5 milhões (U$ 1,63 milhão) a Temer, então presidente do PMDB, e estava atrasando repasse para outros peemedebistas. Este é o homem que neste momento dirige a República.

Não é segredo para ninguém que Temer é uma espécie de refém de Eduardo Cunha, pois toda a articulação para a votação do impeachment na Câmara Federal foi organizada, articulada e consumada pelo então presidente da Câmara. Isso com certeza gerou compromissos, tanto que Cunha continua mantendo grande influência na Câmara e no governo Temer: o atual líder do governo na Câmara, André Moura, é um fiel aliado de Cunha. Após o Conselho de Ética aprovar e recomendar ao plenário a cassação do mandato de Cunha, este conseguiu (com a ajuda dos parlamentares governistas e anuência do governo) eleger o relator do recurso de Cunha na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, com o objetivo de inviabilizar a cassação do seu mandato, muito embora Cunha tenha sido recentemente derrotado nesta comissão. Mas o fato mais escandaloso das relações entre Cunha e Temer e que demonstra o poder de Cunha junto ao governo foi o próprio presidente interino ter se encontrado no Palácio, na calada da noite de um domingo, sem constar da agenda oficial, com Eduardo Cunha. Como a reunião vazou, o governo se apressou em dizer que era encontro institucional. É muito estranho um presidente da República recebe no palácio do governo um deputado afastado da presidência da Câmara, réu em dois processos pelo Supremo Tribunal Federal e condenado pelo Conselho de Ética, com incontáveis denúncias de corrupção e próximo a ser cassado. Só compromissos muito profundos explicam essa reunião. Mas Temer já disse em entrevista, para justificar que é um político forte, que estava acostumado a lidar com bandidos quando era secretário de Segurança Pública de São Paulo. Bom, essa declaração faz sentido.

O seu ministério se assemelha a um conglomerado de oligarcas corruptos, ladrões de casaca e fundamentalistas pentecostais. No sua equipe, por exemplo, sete integrantes são investigados pela justiça. Em menos de um mês, três ministros foram afastados em função das denúncias de corrupção: senador Romero Jucá, ministro do Planejamento e um dos principais articuladores de impeachment, denunciado por receber propina de empreiteiras; Henrique Eduardo Alves, ministro do Turismo, amigo de longa data de Temer, também acusado de receber propina; e Fabiano Figueiredo, ministro da Transparência. Ressalte- se que Jucá era o articulador político do governo no Congresso e antes do impeachment assumiu a presidência do PDMB para deixar Temer, então presidente, livre para realizar as articulações e as negociatas que levaram ao impeachment. Fabiano Silveira, ex-integrante do Conselho Nacional de Justiça e que deveria zelar pela transparência das ações do governo, caiu porque foi flagrado em conversas gravadas criticando a Lava a Jato e orientando o senador Renan Calheiros sobre como se comportar junto à Procuradoria Geral da República. O ministro da Justiça, conhecido por sua truculência quando secretário de Segurança de São Paulo, foi advogado de Cunha e da Transcooper, uma cooperativa de vans citada em investigações que apura crime do Primeiro Comando da Capital, um grupo de traficantes de drogas muito ativo nas grandes capitais, especialmente em São Paulo, isso para falar apenas nos principais acusados.

Na verdade, toda essa crise desvenda a podridão das instituições brasileiras. As gravações das delações premiadas que se tornaram públicas revelam que os senadores Renam Calheiros, Romero Jucá e José Sarney, ex-presidente da República, estavam se articulando para tirar a presidente Dilma e colocar em seu lugar Michel Temer, como forma de se conseguir, a partir da posse do novo presidente, a paralisação da Operação Lava a Jato, que eles consideravam que estava indo longe demais e que poderia atingir praticamente toda a cúpula política tanto do partido que estava no governo quanto os da oposição. O impeachment seria assim uma espécie de tábua de salvação de todos eles. A corrupção entre as altas cúpulas de todos os partidos da ordem é tamanha que recentemente o procurador geral da República pediu publicamente a prisão de Renam Calheiros, presidente do Senado, Romero Jucá, ex-ministro de Temer, José Sarney, ex-presidente do Brasil e Eduardo Cunha por estarem articulando manobras para atrapalhar as investigações. Foram salvos na bacia das almas pelo Supremo Tribunal Federal, que negou o pedido de prisão, sem antes deixar de registrar que o comportamento desses figurões não era adequado. Mas como a cada dia aparece uma denúncia nova, mais bombástica que a anterior, ainda vamos ter muitas surpresas nessa novela burlesca.

À sombra dessa conjuntura pantanosa estão os verdadeiros operadores da oligarquia financeira, do grande capital, do agronegócio e do imperialismo. Na área econômica ponteiam os delegados diretos do mercado financeiro, os mais radicais na ortodoxia neoliberal, a começar pelo ministro da Fazenda, Henrique Meireles. Ex-presidente do Banco de Boston, é um monetarista que fez carreira no sistema financeiro privado internacional. Quando esteve no governo, nos dois mandatos do período Lula, sempre se destacou por ser partidário ativo dos juros altos, sendo o mais ortodoxo da equipe ministerial. O Banco Central, o principal instrumento de execução da política monetária, foi capturado pela banca: Ilan Goldfajn, nomeado presidente, é banqueiro do Itaú e um ortodoxo militante. A diretoria que nomeou no Banco Central reúne a fina flor do rentismo institucionalizado: o diretor de política monetária é Reinaldo Le Grazie, do Bradesco, que antes era responsável no banco pela administração de fortunas dos clientes rentistas e que agora vai dar continuidade a essa política na administração pública. A área de política econômica e assuntos internacionais estão a cargo, respectivamente, de Carlos Viana e Thiago Berriel, ambos da PUC do Rio, uma espécie de pequena Chicago carioca. Na Petrobrás, a maior empresa estatal do País, está Pedro Parente, um privatista radical, foi o homem do apagão no governo FHC e atualmente está sendo processado por improbidade administrativa.

Além desses personagens do rentismo, pode-se destacar ainda um dos principais homens do imperialismo no Brasil, José Serra, que atualmente está no Ministério das Relações Exteriores para alinhar a política internacional do Brasil aos Estados Unidos, desmontar o processo de integração latino-americana e atrapalhar os BRICs. Na Casa Civil está uma espécie de primeiro-ministro, Eliseu Padilha, velha raposa política do PMDB, acostumado aos bastidores da pequena política de Brasília, tanto que era conhecido na era FHC como "Eliseu Quadrilha". Padilha está envolvido nas denúncias de corrupção e teve seus bens bloqueados pelo Ministério Público Federal. Também estão envolvidos em denúncias de corrupção o ministro da Educação, Mendonça Filho e Gedel Vieira Lima, ministro da Secretaria de Governo e velhos conhecidos nas denúncias de corrupção. O setor agropecuário é comandado por um grande latifundiário do setor de soja, Blairo Maggi e na Saúde está um conhecido lobista da medicina privada. Há ainda um aspecto bem singular da equipe de Temer: em seu ministério não há uma única mulher, nenhum negro, num País onde mulheres e negros são maioria na população brasileira.

Um ataque brutal contra os trabalhadores

Um dos motes estratégicos do programa desse governo para justificar os ataques aos trabalhadores e à soberania nacional é a balela que o Brasil não cabe na Constituição de 1988 e os direitos sociais também não cabem no orçamento, como sugere o documento-base do PMDB (Ponte para o Futuro), que orienta as ações governamentais: "Na forma como está desenhada na Constituição e nas leis posteriores (a sistemática orçamentária, EC), que resulta em excessiva rigidez nas despesas, torna o desequilíbrio fiscal permanente e cada vez mais grave ... Assim, a maior parte das despesas públicas tornou-se obrigatória, quer haja recursos ou não. Daí a inevitabilidade dos déficits quando os recursos previstos não se realizam, ou porque as receitas foram superestimadas, ou porque houve retração na atividade econômica, portanto perda de receitas". [5] Para estes senhores, as conquistas da Constituinte, elaboradas num duro embate após a queda da ditadura, atrapalham a competitividade das empresas, inviabilizam a economia de mercado e garantem direitos à população que o País não pode pagar. Ou seja, as conquistas sociais inscritas na Constituição estão em rota de colisão com o apetite voraz da oligarquia rentista e dos oligopólios e as liberdades democráticas são um empecilho à ordem neoliberal.

Em outras palavras, caso essa equipe se mantenha no poder após a consumação do impeachment no Senado, estaremos diante de um governo claramente antinacional e antipopular, um governo ilegítimo e usurpador, sem o respaldo do voto da população para exercer o poder político e sem legitimidade para reorganizar a economia no interesse das oligarquias regionais, dos rentistas e dos oligopólios nacionais e internacionais. Um governo frágil porque a qualquer momento seus ministros e o próprio presidente podem perder seus empregos em função das denúncias de corrupção, mas profundamente perigoso tanto porque não deve satisfações à população, tendo em vista que não pode se viabilizar eleitoralmente (o presidente está inelegível por oito anos), quanto principalmente porque poderá realizar qualquer tipo de medida antipopular para agradar as classes dominantes e ao imperialismo e se manter no poder. Para isso, tem o apoio de uma maioria parlamentar, da mídia corporativa e do mercado, apesar de rejeitado pela maioria da população, conforme recentes pesquisas de mercado. A continuidade desse governo, para os trabalhadores, significa um vôo cego para a barbárie.

Até agora já foram realizadas um conjunto de medidas regressivas nas áreas econômica e social, mas o pior ainda está por vir: o governo espera apenas o desfecho do impeachment para aplicar seu verdadeiro programa, porque aí estaria com as mãos livres para realizar o ataque direto aos trabalhadores e viabilizar a política entreguista. Vejamos as principais medidas tomadas até agora e aquelas já anunciadas e que estão em discussão no Parlamento. O governo extinguiu o Fundo Soberano e sacou todos os recursos (R$2 mil milhões) para abater a dívida interna. Também definiu que o BNDEs (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) deverá devolver ao Tesouro, em três anos, R$ 100 mil miilhões (U$ 33 mil milhões), recursos que foram repassados ao Banco para viabilizar investimentos empresariais. Estes recursos também servirão para abater a dívida. Ao colocar na presidência do Banco uma conhecida militante privatista, Maria Silvia Bastos, que já cumpriu funções no governo FHC, o objetivo é mudar radicalmente o papel da instituição, passando de agente de fomento do desenvolvimento industrial para operador e financiador do projeto de privatizações, como ocorreu no governo do PSDB, entre 1994 e 2002.

O governo também vai cortar 4 mil cargos de confiança na administração pública, como parte do chamado esforço para equilibrar as contas públicas e pretende acabar com a estabilidade do funcionalismo público e os acordos que levaram ao aumento real do salário mínimo. Quer também aumentar de 20% para 30% a Desvinculação das Receitas da União (DRU). Isso significa que agora o governo poderá utilizar livremente até 30% do orçamento da União, mesmo em relação às verbas de setores protegidos por dispositivos constitucionais, como saúde e educação. [6] Na prática, as autoridades econômicas podem remanejar livremente recursos da saúde e educação para pagar, adivinhem quem: os compromissos dos juros dívida interna. O governo também enviou ao Congresso projeto de emenda constitucional de ajuste fiscal de longo prazo, no qual fixa um limite rígido para os gastos públicos por cerca de 20 anos, podendo ser revisto após o nono ano de implementação, período no qual esses gastos se manterão inalterados, podendo ser corrigidos apenas pela inflação, o que na prática significa um congelamento dos gastos públicos. A ambição dos representantes do parasitismo financeiro e dos oligopólios nacionais e internacionais [7] é tão grande e às vezes bizarra que o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sugeriu que a jornada de trabalho fosse estendida para 80 horas semanais, algo muito próximo ao que era vigente no período da escravidão. Vale lembrar que esses balões de ensaio buscam amaciar a população, tornar corriqueira a barbárie, de forma a reduzir os impactos das medidas vindouras. Ao mesmo tempo é uma jogada esperta: eles sabem que esse é um governo que pode durar no máximo mais dois anos e meio, mas as reformas a serem aprovadas amarram todos os governos futuros a essa política ultraliberal. Ao mesmo tempo, significa uma importante sinalização para o mercado, que sempre desejou ter no governo uma equipe econômica que tivesse a coragem de defender abertamente seus interesses sem grandes necessidades de prestar contas à população.

Temer também anunciou que vai apoiar o projeto de Lei de Responsabilidade Fiscal para as estatais e fundos de pensão, pelo qual 25% dos membros dos Conselhos de Administração devem ser independentes. O governo justifica a medida alegando que esses dirigentes deverão ser nomeados por critérios técnicos e meritocráticos, sem vínculos políticos, de forma a poderem alocar de maneira eficiente os recursos dessas instituições. [8] Na prática, quer colocar gente da iniciativa privada e do mercado financeiro para gerir uma parcela significativa dos recursos públicos nacionais e os fundos dos trabalhadores (que atualmente possuem patrimônio de R$ 445 mil milhões – U$148 mil milhões) para servir aos interesses do mercado financeiro. Ou seja, a raposa cuidando do galinheiro: o mercado financeiro passará a gerir centenas de milhares de milhões de reais dos trabalhadores e do povo brasileiro. Há ainda a possibilidade concreta de ser aprovada a independência do Banco Central. Mas as joias da coroa que o governo Temer está preparando, caso se consuma o impeachment da presidente Dilma, é a entrega do Pré-Sal às petroleiras imperialistas, a reforma trabalhista, a reforma da previdência e o programa de privatizações.

Entrega do Pré-sal: O volume de petróleo até agora encontrado nas bacias do pré-sal está calculados em R$ 20 milhões de milhões (U$ 6,8 milhões de milhões), um botim bastante apetitoso para o capital internacional petroleiro. Temer já anunciou que vai apoiar um projeto que já foi aprovado no Senado, por proposta de Serra e com apoio de Dilma (agora está na Câmara Federal), que altera as regras de exploração do petróleo do pré-sal. Pelas normas atuais, a Petrobrás tem exclusividade na exploração de 30% em todos os poços de petróleo, mas se o projeto for aprovado na Câmara a companhia estatal perde a exclusividade e o petróleo brasileiro passará a ser explorado pelas multinacionais. Para realizar tal tarefa, nomeou para a presidência da Patrobrás, responsável por 13% do PIB, Pedro Parente, um privatista radical. Mal assumiu o posto, já pilota um projeto de venda de ativos que, mesmo ainda sigiloso, já se pode dizer que os estão de olho nas companhias subsidiárias da Patrobrás como a Liquigás, usinas térmicas, Transportadora Sudeste, Transpetro e BR Distribuidora, campos de petróleo em produção ou em fase de exploração, além das concessões de exploração de novos campos pelas multinacionais. Também está ainda na agenda a redução ou mesmo o fim da política de conteúdo nacional, pela qual a Petrobrás passou a comprar equipamentos de empresas nacionais, como forma de incentivar a indústria local. Como entreguistas contumazes, eles acusam essa política de compras como uma questão ideológica do governo anterior, que viola a competição e causa prejuízos à empresa. Se essa agenda se consumar, será um golpe duro na soberania nacional, tendo em vista que o monopólio estatal do petróleo foi uma conquista do povo brasileiro, após grandes manifestações de massas nas ruas, ainda na década de 50, e foi exatamente este monopólio que possibilitou ao País se tornar autossuficiente em petróleo. Com pré-sal, o País deverá se transformará num grande exportador petroleiro, tendo em vista os vastos depósitos descobertos nos últimos anos.

Reforma da Previdência: A questão da previdência no Brasil é um dos casos mais dramáticos no qual uma mentira repetida muitas vezes termina virando verdade. Diariamente, todos os meios de comunicação, jornalistas ignorantes ou a serviço do mercado financeiro, empresários e banqueiros repetem estridentemente que a Previdência é deficitária, que o déficit aumenta a cada ano, que a população está envelhecendo e, por isso, é necessário uma reforma da previdência para evitar uma insolvência no futuro. Com esse discurso, as classes dominantes tentam capturar parcela expressiva dos recursos da Previdência definidos pela Constituição de 1988. Nas discussões daquele período, os Constituintes decidiram incorporar à previdência os milhões de trabalhadores rurais que não pagavam a Previdência e, portanto, não recebiam os benefícios previdenciários. Para tanto, criaram a Seguridade Social, da qual fazem parte a Previdência, assistência social e saúde e definiram regras do financiamento, que inclui os recursos dos trabalhadores, dos empregadores e do governo, além de tributos específicos, como a CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido) e a CONFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), além de outras receitas, visando dar sustentabilidade de longo prazo à previdência brasileira. Ocorre que, desde meados da década de 90, as classes dominantes lutam para recapturar esses recursos mediante uma série de falsificações, desonestidade contábil e manipulação midiática. Nessa ofensiva já conseguiram realizar duas contra-reformas previdenciárias, uma no governo FHC e outra no governo Lula, sempre retirando direitos dos trabalhadores e desviando os recursos da seguridade social para pagamento dos juros da dívida interna. Eles alegam que a previdência é deficitária e, com o envelhecimento da população, seu financiamento se tornará insustentável. Para justificar essa inesperada e hipócrita preocupação com o futuro dos pensionistas, os oligarcas realizam um argumento falacioso ou uma conta pela metade, isolando a Previdência da Seguridade Social e comparando apenas os recursos arrecadados das contribuições de patrões e empregados com as despesas previdenciárias, sem levar em conta os recursos dos tributos da seguridade social, criados justamente para dar sustentabilidade ao sistema previdenciário. Por essa metodologia falsificada, a previdência se torna permanentemente deficitária. Mas quando as receitas da seguridade social são computadas, obtém-se um superávit nas contas previdenciárias. Por exemplo, o superávit foi de R$68 mil milhões (U$22 mil milhões) em 2013 e R$56 mil milhões (U$18 mil milhões) em 2014, [9] isso sem levar em conta que os recursos previdenciários foram reduzidos em função da política de desonerações e renúncias fiscais realizadas pelo governo, das diversas modalidades de sonegação previdenciária e da fuga de receitas em função do processo recessivo. Para se ter uma ideia de quanto o governo desvia da Seguridade Social para pagar a dívida interna, é importante observarmos os cálculos do economista Eduardo Fagnani, da Unicamp: "Só em 2012 a DRU retirou da Seguridade Social R$52,6 mil milhões (U$17 mil milhões). O acumulado, para o período 2005-2012 totaliza R$286 mil milhões (U$95 mil milhões)". [10] Mas nada disso é observado pela mídia corporativa. Como essas informações não são divulgadas para a população, permanece a versão fantasiosa dos déficits crescentes na previdência e, com essa farsa contábil, os rentistas vão reduzindo cada vez mais os direitos e proventos dos pensionistas. Também querem ainda desvincular os reajustes do salário mínimo dos reajustes dos aposentados. Na verdade, seu objetivo maior é a privatização da previdência, como ocorreu no Chile de Pinochet.

Reforma Trabalhista: Outro dos grandes objetivos desse governo é o desmonte da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que foi promulgada ainda na década de 40 pelo governo de Getúlio Vargas. Uma parcela expressiva dos direitos dos trabalhadores já foi retirada no período FHC (e outra flexibilizada nos governos petistas), mas ninguém teve força suficiente para desmontar a CLT, tarefa que agora o governo Temer busca atingir. O centro da questão é aprovar no Congresso uma reforma definindo que aquilo que for acordado entre trabalhadores e empresários se sobrepõe ao que está legislado. Ou seja, os acordos realizados em cada empresa ou cada setor de produção estão acima da legislação da CLT ou da Constituição. Numa conjuntura de recessão e desemprego, com a ofensiva patronal contra direitos e garantias dos trabalhadores, isso seria um prato cheio para a implantação da barbárie social. A que nível chegou o capitalismo brasileiro: desesperados diante da crise econômica, querem tirar dos trabalhadores direitos que foram conquistados por seus avós. Além do desmonte da CLT, as classes dominantes também querem a implantação das terceirizações, visando não só rebaixar os salários, mas também desorganizar o mercado de trabalho, destruir o movimento sindical e criminalizar as lutas sociais. Nessa ofensiva, não será surpresa se iniciarem ainda uma campanha contra o pagamento do 13º. salário, uma conquista que vem desde a década de 60; extinção do pagamento das férias com um terço a mais de salário, como determina a legislação atual; redução do período de férias para menos de 30 dias; e até mesmo cortes no pagamento do descanso semanal remunerado. Ate agora nenhuma autoridade do governo assumiu essas três ultimas agendas, mas os balões de ensaios estão circulando diariamente nas redes sociais. Como dizia minha avó, onde tem fumaça tem fogo.

Política de privatizações: Durante o governo FHC, o governo privatizou a grande maioria das empresas públicas, envolvendo quase todo o setor de telecomunicações, grande parte do setor elétrico, bancos estaduais, siderurgia, entre outros. E nos governos petistas operou-se as privatizações disfarçadas sob o rótulo de concessões à iniciativa privada. Pelo menos em relação às quatro grandes empresas estatais nenhum governo reuniu forças para entregá-las à iniciativa privada: a Petrobrás, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal e os Correios e Telégrafos. Mas essa equipe de Temer vai procurar de todas as formas realizar a tarefa não concluída por FHC. A ordem no governo é privatizar o que for possível o mais rápido que se puder. Temer já anunciou que vai adotar medidas para facilitar a venda das empresas do setor elétrico que não foram privatizadas na era FHC, ao mesmo tempo em que está transferindo para os consumidores a conta decorrente dos acordos realizados com o Paraguai ainda no governo Lula, através do qual o Brasil aumentou a remuneração paga pela energia fornecida ao Brasil pela Itaipu Binacional. Também já foi sancionada pelo presidente a abertura do setor aéreo, através do qual o capital estrangeiro pode adquirir as empresas nacionais. Mas o objetivo central do governo é a privatização das grandes estatais. Essa tarefa ainda não foi publicizada porque aguardam o desfecho do impeachment, mas é a missão desse governo usurpador. No entanto, essa é uma tarefa difícil: FHC ensaiou privatizar a Petrobrás, chegando inclusive a tentar mudar o nome da empresa para Petrobrax para facilitar sua venda, mas foi obrigado a recuar em função da grande reação de setores sociais e políticos do País. A privatização do Banco do Brasil também é uma tarefa difícil não só em função de seu tamanho (é o maior banco do País), mas porque se trata de uma instituição pública fundada ainda no período colonial. E a Caixa Econômica Federal também apresenta grandes dificuldades, em função do seu porte e também porque é gestora do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e dos financiamentos do programa de habitação. Da mesma forma, os Correios e Telégrafos têm grande prestígio junto à população pela qualidade dos serviços que proporciona. Portanto, qualquer movimento do governo no sentido da privatização dessas empresas vai gerar grandes conflitos sociais.

As elites estão brincando com fogo

Na verdade, as classes dominantes brasileiras, ao iniciarem o processo de impeachment, com as manobras e manipulações de todos conhecidas, em meio às denúncias de corrupção que atingem toda a institucionalidade, desencadearam um processo que podem não ter condições de controlar. Estão brincando com fogo. Numa conjuntura de elevada tensão social, com o descontentamento das massas em consequência do caos urbano, das precárias condições de saúde, dos baixos salários, do desemprego, da corrupção generalizada, da crise de representatividade e da desmoralização das instituições, querer implantar a ferro e fogo a agenda neoliberal predatória que esta sendo anunciada é como colocar gasolina na fogueira. Vai acirrar de tal maneira a luta de classes que não será surpresa para ninguém a emergência de conflagrações sociais em várias regiões do País, especialmente nas grandes metrópoles. Como registra recente nota política do PCB: com o impeachment da presidente Dilma e a ascensão do novo governo ilegítimo, a luta de classe mudou de patamar no Brasil, tornando mais aberto o conflito entre capital e trabalho, que era ofuscado pela política de apassivamento, cooptação e despolitização implementada pelo Partido dos Trabalhadores.

Vale recordar ainda que estamos vivenciando o dramático fim de um ciclo de lutas sociais que se iniciou no final da década de 70 com as greves do ABC, no qual a classe operária emergiu com força e combatividade, criando organizações próprias e contribuindo de maneira decisiva para o fim do regime militar. Também é fundamental compreender que a partir de 2013, com as extraordinárias jornadas de junho, a juventude e os trabalhadores precarizados emergiram na cena política com manifestações de massa, por fora das instituições sindicais e políticas, iniciando-se assim, ainda de maneira embrionária, um novo ciclo de lutas sociais no Brasil. Portanto, estamos vivendo na atual conjuntura aquele intervalo gramsciano no qual o velho está morrendo, o novo está emergindo mas ainda não se consolidou e, nesse vazio, surgem os monstros, entendido aqui como os elementos mais inesperados, imponderáveis ou bizarros da conjuntura, mas também esse é um período cheio de oportunidades. Como todo final de processo, o desfecho desse ciclo poderá parir um conjunto de fenômenos novos na realidade brasileira:


a) O primeiro deles é o esgotamento das organizações que cresceram e se desenvolveram durante o ciclo anterior, como o Partido dos Trabalhadores (PT) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), para falar apenas nos dois principais. Essas organizações poderão até ainda continuar vivas, como o MDB continuou vegetando na forma desse PMDB degenerado atual, mas perderão sua alma, sua capacidade de transformar, serão apenas caricatura do que foram no passado, sem possibilidade de se reinventarem porque serão incapazes de realizar uma autocrítica sincera dos erros estratégicos e táticos que cometeram durante o período de governo, tais como a renúncia à construção de uma nova correlação de forças baseada nos setores populares; a adesão ao modus operandi da velha política até se envolver abertamente com a corrupção; a cooptação e burocratização do movimento sindical e social; a conciliação de classe e as alianças com a escória da política; e o apassivamento e despolitização geral dos trabalhadores e da juventude. Essas organizações estão vinculadas de tal maneira à ordem e à institucionalidade que se torna praticamente impossível uma virada de mesa na atual conjuntura, pois os movimentos que realizaram durante o período de governo as tornaram prisioneiras de seu próprio destino.

b) A emergência do novo ciclo ainda não consolidado vai produzir uma conjuntura inteiramente nova na realidade brasileira. Como todo início de ciclo, em que ainda não se forjou uma organização catalisadora do novo processo, sua dinâmica é confusa e contraditória, mas as lutas de junho de 2013 estão produzindo um conjunto de atores e lutas sociais com enorme combatividade e originalidade. É só recordarmos as ocupações vitoriosas dos estudantes secundaristas paulistas contra o governo reacionário do PSDB, há mais de 20 anos no poder em São Paulo. Essas manifestações estão inspirando outras ocupações de secundaristas em várias regiões do País. Os estudantes secundaristas das escolas públicas são os filhos do proletariado brasileiro, porque só os filhos dos proletários estudam em escolas públicas, uma vez que os filhos da classe média alta e da burguesia estudam em colégios privados. Esses jovens estão debutando na luta social e trazendo formas de lutas e experiências novas de organização das lutas sociais. Vale ressaltar ainda que no Brasil a entrada em cena do proletariado na luta social e política sempre foi antecedida das lutas da juventude. Foram as lutas da juventude que anteciparam a abolição da escravatura e a proclamação da República; o movimento dos tenentes na revolução de 1930; o movimento estudantil nas lutas pelas reformas de base; e o movimento pela reconstrução da UNE antes das greves do ABC. Podemos dizer que as lutas atuais da juventude podem ser prenúncio da entrada em cena do proletariado, de forma a dar um novo rumo na história de nosso País. Ressalte-se ainda que o número de greves vem aumentando desde 2013, o que indica que algo está movendo no interior do proletariado brasileiro.

c) O terceiro dos fenômenos é o resultado da fusão dos dois anteriores e podemos dizer que está se expressando num complexo e doloroso processo de reorganização da esquerda. Ninguém pode errar nesse momento de crise: um erro pode custar caro às organizações sociais e políticas. Isso explica a implosão que ocorreu recentemente no PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado), quando mais de 700 militantes orgânicos se desligaram da organização. Processos mais reduzidos estão sendo verificados também em organizações menores. Mas o grande drama vai ocorrer com as bases do Partido dos Trabalhadores, que estão frustradas e confusas, não se sentem representadas pela cúpula do partido, mas em contrapartida não têm a menor possibilidade de ganhar por dentro a direção do partido. Vão procurar um novo rumo com o desfecho do impeachment. O PC do B se organiza mais como uma empresa que como uma organização política, dado o elevadíssimo número de profissionais burocratizados na organização e nas administrações públicas federais, estaduais e municipais, sendo este um fator limitador de dissidências. Em tempos de crise ninguém quer ficar sem trabalho. Mesmo assim, com o fim do ciclo, pagará caro sua opção pela institucionalidade eleitoral. E os militantes mais jovens das ocupações secundaristas irão amadurecer e buscar uma opção para se organizar politicamente. Com certeza o próximo ciclo que se abre será um desafio para a reconstrução da esquerda.

Realmente, o Brasil vive atualmente uma conjuntura complexa e difícil. Estamos diante de um governo impopular, desmoralizado, interessado a prestar bons serviços aos seus patrocinadores. Um governo que está disposto a implementar a agenda neoliberal a qualquer custo, no menor espaço de tempo possível, mesmo que para isso tenha que se utilizar da lei antiterrorismo, diga-se passagem aprovada pelo governo do PT, da criminalização dos movimentos sociais e da repressão aberta contra os trabalhadores e a juventude. Por outro lado, cresce a indignação na sociedade, muito embora ainda difusa, contra o governo, fato que se expressa nos protestos tanto das ruas quanto nas torcidas de futebol nos estádios, nos espetáculos musicais e teatrais e nos escrachos [11] de parlamentares e ministros do governo nos aeroportos, dentro de aviões, em eventos públicos. Se essas manifestações já ocorrem num momento em que o governo ainda não tomou as medidas mais duras, imaginem o que vai acontecer quando o governo mostrar sua verdadeira face, após a interinidade. Estamos nos aproximando de um momento de acirramento da luta de classes e possivelmente de uma repressão muito dura contra os trabalhadores e os movimentos sociais, pois dificilmente essas medidas serão realizadas sem luta, mas também poderemos estar diante da possibilidade da construção de uma nova correlação de forças favorável aos trabalhadores.

Na verdade, o desfecho dessa conjuntura complexa e volátil é uma obra aberta porque não está garantido a nenhuma das forças fundamentais da sociedade brasileira, a burguesia e o proletariado e as forças de esquerda, a vitória nessa conjuntura. Se a burguesia nesse momento tem a iniciativa, controla os poderes institucionais, o poder econômico e os aparatos militares, isso pode não significar grande coisa diante de levantes sociais de massa. Afinal, o outro lado, o proletariado e a juventude, também estão jogando e representam uma força avassaladora se colocados em movimento. Mas nesse processo de novas lutas é fundamental fugir da órbita das velhas organizações que estão morrendo com o ciclo em que se forjaram e, especialmente, das armadilhas do lulismo, que busca colocar as lutas das ruas a serviço da disputa eleitoral em 2018, na qual nem Lula sabe se será candidato. É fundamental buscar construir um caminho que rejeite tanto a conciliação de classe quanto a direita. A construção desse terceiro campo é o caminho mais difícil, mas é o único que pode construir uma alternativa dos trabalhadores para a crise. Tudo leva a crer que no médio prazo teremos uma disputa aberta entre o proletariado e a juventude contra a burguesia e todo o seu aparato. O resultado desse processo vai depender da capacidade das organizações políticas e sociais de encontrarem pontos em comum, tanto do ponto de vista orgânico quanto programático. Uma boa ideia nesse sentido é a proposta de construção de um grande Bloco de Lutas, a ser consolidado num encontro nacional dos trabalhadores e do movimento popular, que reúna as organizações políticas e os movimentos sociais classistas e seja capaz de forjar um programa mínimo que possa colocar em movimento os trabalhadores, a juventude e o povo pobre dos bairros na luta pelas transformações sociais e pelo poder popular a partir de suas reivindicações concretas contra o ajuste fiscal, o ataque aos direitos dos trabalhadores e pensionistas, o pagamento dos juros e amortizações da dívida interna, por terra, trabalho e moradia, em defesa do patrimônio nacional. Essas propostas, vinculadas à vida cotidiana dos trabalhadores, poderão colocar em movimento milhões de pessoas nas ruas, locais de trabalho, moradia e estudo e levar a um processo que nos tire da crise e abra possibilidade para uma transição no interesse dos trabalhadores. [1] O Partido dos Trabalhadores (PT) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT) foram fundados, respectivamente, em 1980 e 1983.
[2] Para maior compreensão das jornadas de junho de 2013, ver Costa, Edmilson. Brasil: extraordinárias jornadas de lutas . Constante em resistir.info.
[3] Investigação realizada pelo judiciário de Curitiba, sob a liderança do juiz Sergio Moro, cujos resultados até agora vem demonstrando a podridão das instituições brasileiras em praticamente todas as áreas. Parlamentares, executivos empresariais e dirigentes políticos em geral vêm sendo denunciados ou presos. A cada dia o País é surpreendido por uma nova delação premiada envolvendo novos personagens das instituições políticas e empresariais envolvidos em escândalos de corrupção. Caso as investigações continuem não será surpresa o envolvimento ou prisão dos principais personagens dos partidos da ordem, bem como do Executivo nacional.
[4] Essa classificação da equipe de Temer se assemelha ao que foi sugerido pelo jornalista Mauro Lopes, dos Jornalistas Livres, em artigo sobre os gestores da crise, no qual dividiu a equipe do governo em duas turmas: os barões de casaca e os barões das galinhas (21/5/2016). Optamos por ser menos sutil em relação à equipe governamental. Acesso em 20 de junho de 2016.
[5] PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro): Uma ponta para o futuro. Documento-Base com as propostas para a reforma econômica brasileira. Acesso em 20 de junho de 2006.
[6] A Constituição brasileira, aprovada na Assembleia Constituinte de 1988, definiu percentuais rígidos para gastos em saúde e educação, que teoricamente não poderiam ser modificados na proposta orçamentária. Mas no Brasil sempre se dá um jeitinho para burlar os direitos dos trabalhadores. No governo FHC foi aprovada uma emenda constitucional que permitiu ao Executivo poder utilizar livremente 20% do orçamento de acordo com seus objetivos políticos, sob o pretexto de criação de um Fundo de Social de Emergência (FSE). Posteriormente, esse processo foi institucionalizado com a aprovação da DRU (Desvinculação das Receitas da União), com o mesmo percentual de 20%. Agora este governo quer elevar o percentual para 30%. Isso significa que o governo poderá remanejar até 30% das verbas sociais (educação, saúde, etc) para pagar os juros da dívida interna.
[7] Apesar da política governamental ser gerida em função dos compromissos da dívida interna, portanto da oligarquia financeira, os monopólios nacionais e internacionais e o agronegócio, mesmo em períodos de recessão, não perdem dinheiro, pois os recursos ociosos que não podem ser destinados ao investimento produtivo são aplicados no mercado de títulos do governo com retornos bastante expressivos, dado as elevadas taxas de juros, funcionando assim como um colchão de proteção e uma válvula de escape para todos em tempos difíceis.
[8] Hoje, a representação nas direções dos fundos de pensão dos trabalhadores das estatais é paritária entre trabalhadores e governo
[9] Entrevista com Denise Gentil ao site da revista Brasileiros (15/2/2016), professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, estudiosa da Previdência Social e que em sua tese de doutoramento desmonta as falsidades dos o argumentos de que a Previdência brasileira é deficitária. Acesso em 20/5/2016.
[10] Fagnani, Eduardo. Artigo escrito para a Plataforma Política Social. Caminhos para o Desenvolvimento, em 21/2/2016. Acesso em maio de 2016.
[11] Manifestações, geralmente bem humoradas, realizadas pela juventude, inicialmente em frente à residência de torturadores, mas agora também em frente à casa de articuladores do impeachment, nos aeroportos e locais públicos.

[*] Doutorado em Economia pela Unicamp, com pós-doutoramento no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da mesma instituição. É autor, entre outros, de A globalização e o capitalismo contemporâneo (Expressão Popular) e A crise econômica mundial, a globalização e o Brasil (Edições ICP). É membro do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro (PCB), diretor do Instituto Caio Prado Junior e um dos editores da revista teórica Novos Temas.

O original encontra-se em pcb.org.br/portal2/11624

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/





http://resistir.info/brasil/gang_oligarquica_17jul16.html

quarta-feira, 13 de julho de 2016

O golpe ruralista e o preço do feijão 13/07/2016




Por Alan Tygel, no site Opera Mundi:



Na última semana, fomos bombardeados pelas notícias sobre a alta no preço do feijão. O povo, chocado em ver o quilo passando de R$10, ouviu as mais diversas explicações dos analistas: geada e muita chuva no sul, falta de chuva em outras regiões, e até o boato de que uma pequena doação para Cuba feita em outubro de 2015 teria sido a causa da escassez. A solução mágica apresentada pelo ministro interino da agricultura, o Rei da Soja, foi zerar a taxa de importação para facilitar a entrada de feijão estrangeiro.

O que estranhamente não saiu em lugar nenhum foi um elemento muito simples: o agronegócio brasileiro não se preocupa em produzir alimentos para o Brasil. E isso fica muito claro quando olhamos a mudança na utilização das terras no país. Nos últimos 25 anos, houve uma diminuição profunda na área destinada à plantação dos alimentos básicos do nosso cardápio. A área de produção de arroz reduziu 44% (quase metade a menos), e a mandioca recuou 20%.

A área plantada com feijão, o vilão do momento, diminuiu 36% desde 1990, enquanto a população aumentou 41%. Apesar de ter havido um aumento na produtividade, a diminuição da área deixa a colheita mais vulnerável e suscetível a variações como estamos vendo agora.

E o agronegócio?

Os grandes latifundiários do Brasil, aliados aos políticos da bancada ruralista, a multinacionais de agrotóxicos e sementes como Bayer, Monsanto e Basf, e às empresas que dominam a comunicação no país não estão preocupadas com a alimentação da população. Estes atores compõem o chamado agronegócio, que domina a produção agrícola no Brasil e vê o campo apenas como local para aumentar suas riquezas.

Isso significa, na prática, produzir soja e milho para alimentar gado na Europa e na China, enquanto precisamos recorrer à importação de arroz, feijão e até do próprio milho para as festas de São João. Exportamos milho, e agora precisamos importar o milho. Faz sentido?

No mesmo período em que a área plantada de arroz e feijão caiu 44% e 36%, respectivamente, a área de soja aumentou 161%, enquanto o milho aumentou 31% e a cana, 142%. Somados os três produtos, temos 72% da área agricultável do Brasil com apenas três culturas. São 57 milhões de hectares que ignoram a cultura alimentar e a diversidade nutricional do nosso país em favor de um modelo de monocultura, que só funciona com muito fertilizante químico, semente modificada e veneno, muito veneno.

No caso da cana e da soja, é fácil entender que não são alimentos, e sim mercadorias ou (commodities) que vão ser comercializadas nas bolsas de valores pelo mundo. No caso do milho, basta ver que em 2015 foram exportados 30 milhões de toneladas de milho, em relação direta com a alta do dólar. Com o preço da moeda americana em alta, vale mais a pena exportar do que vender aqui. Assim, o que sobra no Brasil não é suficiente para o nosso consumo, e por isso temos que importar, o que também irá pressionar o preço. Hoje é o feijão, logo será o milho que vai explodir de preço.

Outro aspecto importante é analisar que quem bota o feijão na mesa do povo é a agricultura familiar. Os dados ainda de 2006 mostram que 80% da área plantada de feijão (e 70% da produção) são da agricultura familiar. E esta agricultura não tem espaço no reino do agronegócio.

O agronegócio ameaça a soberania alimentar no Brasil. Ao deixar de plantar comida para plantar mercadorias, ficamos extremamente dependentes do mercado externo, e vulneráveis às mudanças climáticas.

O primeiro passo: reforma agrária para dar terra a quem quer plantar comida. Com a terra na mão, precisamos de incentivo à agroecologia, para produzir alimentos saudáveis. Finalmente, essa produção deve ser regulada pelo Estado, via Conab, para garantir o abastecimento interno antes de embarcar tudo para fora.

O governo interino já admite privatizar a Conab, e pode em breve aprovar leis que facilitam ainda mais o uso de agrotóxicos e o uso de pulverização aérea nas cidades.

É, de fato, também um golpe ruralista.

* Artigo publicado originalmente no site Brasil de Fato.

http://altamiroborges.blogspot.com.br/2016/07/o-golpe-ruralista-e-o-preco-do-feijao.html

Temer tira do ar Blog do Planalto; em resposta Dilma cria o Blog do Alvorada 13/07/2016

  Redação





Dilma Rousseff anunciou nesta terça-feira (12) o lançamento do Blog do Alvorada, uma plataforma onde a presidenta afastada irá expor as fragilidades do governo em exercício de Michel Temer e destacar suas atividades recentes de luta contra o golpe.


"O governo provisório acabou com o Blog do Planalto, nós, no meu site, criamos o blog do Alvorada. Nós iremos acompanhar todas as lutas e as atividades da resistência democrática", diz a presidenta em vídeo postado nas redes sociais.

Logo nas primeiras postagens o Blog do Alvorada apresenta uma lista de 60 ações do governo Temer em 60 dias no poder.


"Reduzir direitos, anunciar maldades e voltar atrás após a pressão da sociedade: essa tem sido a tônica do governo interino. As propostas incluem colocar teto para os gastos em saúde e educação, enquanto distribui aumentos de salário a quem ganha mais e vacila para pagar reajuste de programas sociais"

Confira aqui os 60 principais (mal)feitos



Para ir ao blog: http://dilma.com.br/




http://www.ocafezinho.com/2016/07/13/temer-tira-do-ar-blog-do-planalto-em-resposta-dilma-cria-o-blog-do-alvorada/

URGENTE: governo golpista quer “congelar” pelos próximos 20 anos gastos com programas sociais, previdência, saúde e educação 13/07/2016

Redação



Foto: Beto Barata/PR
Governo Temer faz nova ofensiva contra direitos sociais, desta vez na PLDO 2017

Votação do relatório do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias, que pretende antecipar e materializar os efeitos desastrosos da PEC 241/2016, será realizada nesta quarta-feira (13/7), longe dos holofotes por conta da eleição da presidência da Câmara dos Deputados.

no Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

A mais nova munição veio por meio de uma “sugestão” de alteração do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO 2017) que pretende antecipar e materializar os efeitos da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 241/2016), aquela que congela em termos reais os gastos primários por até 20 anos, e que ainda não havia sido sequer votada pela Comissão de Constitucionalidade e Justiça da Câmara dos Deputados.

Esta sugestão está registrada no Ofício N. 26 de 07 de julho no qual o governo interino prevê que o déficit primário passará de um rombo de R$ 65 bilhões, previsto pelo governo Dilma, para um rombo de R$ 139 bilhões, mais que o dobro. É nesse mesmo ofício que se aproveita para antecipar para 2017 os efeitos da PEC 241, congelando os gastos sociais, o que reduzirá e piorará os serviços públicos e a garantia de direitos. No momento a ênfase está na contenção de despesas referentes a Previdência Social e Assistência Social, mas diversas políticas públicas essenciais para a segurança e bem estar da população brasileira terão seus orçamentos afetados.

A emenda ao texto sugerida pelo governo interino já foi servilmente incorporada pelo relator, o Senador Wellington Fagundes (PR/MT), e pode ser aprovada como parte do texto a toque de caixa, sem debate e no apagar das luzes, já que a votação do relatório está agendada para as 14h30 desta quarta-feira (13/7) na Comissão Mista de Orçamento - longe dos holofotes, que estarão todos direcionados à eleição da presidência da Câmara.

Alguns poderão tentar relativizar os efeitos perversos desta medida alegando que estão preservados os gastos: com Educação e Saúde, por terem leis que vinculam receitas a esses direitos; com o Fundo de Participação dos Estados e Municípios; além de outras transferências vinculadas à educação básica e aos royalties do petróleo, gás, minérios e recursos hídricos, ou seja, o “grosso” da parte do bolo orçamentário que cabe aos demais entes federados.

Mas não se enganem. Esta medida afetará diretamente a função de Estado prevista na Constituição Cidadã, que em seu texto afirmava ser o Estado Democrático destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

Tanto essa nova redação do PLDO 2017 quanto a PEC 241/16 afetam estruturalmente a capacidade financeira do Estado de executar as políticas públicas que garantem os direitos e impactará na vida dos brasileiros e brasileiras de forma profunda. Um exemplo do que já está sendo colocado em prática é a Medida Provisória 739 de 07/07/2016 que implementou severas alterações na legislação previdenciária, explicitando o objetivo de restringir o acesso aos benefícios por incapacidade, bem como cessar os benefícios para aqueles segurados que já recebem os respectivos benefícios de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença. A ofensiva aos direitos previdenciários deixa nítido que o propósito do governo interino não é tão somente o de corrigir eventuais erros ou fraudes na concessão desses benefícios, mas exclusivamente reduzir gastos às custas de indivíduos tão vulneráveis da sociedade.

É ainda importante destacar que caso esse artigo que congela as despesas primárias seja mantido no texto da LDO de 2017 seus efeitos serão ainda potencializados pela Desvinculação de Receitas (DRU) ampliada a partir de 2017, que saiu de 20% para 30%. Isso quer dizer que dos recursos já congelados, 30% do Orçamento da Seguridade Social deixará de ser aplicado diretamente na Previdência, na Saúde e na Assistência.

No momento, a única possibilidade é que deputados e senadores que compõem a Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso Nacional se posicionem em defesa da população brasileira e façam destaques solicitando a exclusão do artigo que permite o teto para os gastos com direitos.

http://www.ocafezinho.com/2016/07/13/urgente-governo-golpista-quer-congelar-pelos-proximos-20-anos-gastos-com-programas-sociais-previdencia-saude-e-educacao/

terça-feira, 12 de julho de 2016

Alertas vermelhos: Sinais de implosão na economia global – O capitalismo global à deriva 12/07/2016



por Jorge Beinstein [*]

Em fins de Maio, durante a reunião do G7, Shinzo Abe, primeiro-ministro do Japão, anunciou a proximidade de uma grande crise global [1] . O comentário mais divulgado pelos meios de comunicação foi que era um alarmismo exagerado, reflexo da situação difícil da economia japonesa. De qualquer modo, não faltam os que admitem a existência de perigos mas em geral atribuem-nos aos desequilíbrios financeiros da China, à recessão no Brasil ou às turbulências europeias. A situação nos Estados Unidos costuma merecer comentários prudentes, distantes de qualquer alarmismo. Apesar de o centro motor da última grande crise global (ano 2008) ter sido a explosão da bolha imobiliária estado-unidense, agora os peritos não percebem ali bolhas em plena expansão a ponto de estourar e sim tudo ao contrário: actividades financeiras, industriais e comerciais estagnadas, crescimentos anémicos e outros sinais aparentemente tranquilizantes que afastam a imagem de algum tipo de euforia descontrolada.

Mas é impossível ignorar a realidade. Os produtos financeiros derivados constituem a componente maioritária decisiva da trama especulativa global. Só cinco bancos dos Estados Unidos mais o Deutsche Bank acumularam esses frágeis activos no montante de uns 320 milhões de milhões de dólares [2] , equivalente a aproximadamente 4,2 vezes o Produto Mundial Bruto (ano 2015). Isso representa 65% da totalidade dos produtos financeiros derivados do planeta registados em Dezembro de 2015 pelo Banco da Basileia. Essa hiper-concentração financeira deveria ser um sinal de alarme e o panorama agrava-se quando constatamos que a referida massa financeira está a desinchar de maneira irresistível: em Dezembro de 2013 os derivados globais chegavam a uns US$710 milhões de milhões, apenas dois anos depois, em Dezembro de 2015, o Banco de Basileia registava US$490 milhões de milhões... em apenas 24 meses evaporaram-se US$220 milhões de milhões, cifra equivalente a cerca de 2,8 vezes do Produto Global Bruto de 2015.

Não foi um acidente e sim o resultado da interacção perversa, a nível mundial, entre a especulação financeira e a chamada economia real. Durante um longo período esta última pode suster uma desaceleração gradual evitando a derrocada, graças à financiarização do sistema que permitiu às grandes empresas, aos estados e aos consumidores do países ricos endividarem-se e assim consumir e investir. O declínio da dinâmica económica dos capitalismos centrais pôde ser desacelerado (ainda que não revertido) não só com negócios financeiros. A entrada de mais de 200 milhões de operários industriais chineses mal pagos no mercado mundial permitiu abastecer com manufacturas baratas os países ricos e a derrocada do bloco soviético brindou ao Ocidente um novo espaço colonial: a União Europeia ampliou-se para Leste, capitais da Europa e dos Estados Unidos estenderam seus negócios.

Foi assim que os Estados Unidos e seus sócios-vassalos da NATO continuaram em frente com os gastos militares e as guerras. Enormes capitais acumulados bloqueados por uma procura que crescia cada vez menos puderam rentabilizar-se comprando papéis de dívida ou jogando na bolsa. Grandes bancos e mega especuladores incharam seus activos com complexas operações financeiras legais e ilegais. Os neoliberais assinalavam que se tratava de um "círculo virtuoso" em que as economias real e financeira cresciam apoiando-se mutuamente. Mas a festa foi-se esgotando enquanto se reduziam as capacidades de pagamento dos devedores esmagados pelo peso das suas obrigações.



A crise de 2008 foi o ponto de inflexão. Em Dezembro de 1998 os derivados globais chegavam a uns US$80 milhões de milhões, equivalente a 2,5 vezes o Produto Global Bruto desse ano. Em Dezembro de 2003 eles alcançavam os US$200 milhões de milhões (5,3 vezes o PGB) e em meados de 2008, em plena euforia financeira, saltaram para os US$680 milhões de milhões (11 vezes o PGB). A recessão de 2009 os fez cair: em meados desse ano haviam baixado para US$590 milhões de milhões (9,5 vezes do PGB). Acabara a euforia especulativa e a partir daí as cifras nominais estancaram ou subiram muito pouco, reduzindo sua importância em relação ao PGB. Em Dezembro de 2013 rondavam os US$719 milhões de milhões (9,3 vezes o PGB) e a seguir verificou-se o grande desinchar: US$610 milhões de milhões em Dezembro de 2014 (7,9 vezes o PGB) que em Dezembro de 2015 caiu para US$490 milhões de milhões (6,2 vezes o PGB).

O aparente "círculo virtuoso" havia mostrado o seu verdadeiro rosto: na realidade tratava-se de um círculo vicioso em que o parasitismo financeiro expandira-se graças às dificuldades da economia real à qual drogava enquanto a carregava de dívidas cuja acumulação acabou por arrefecer o seu dinamismo – o que por sua vez bloqueou o crescimento da esfera financeira.

A primeira etapa de interacção expansiva anunciava a segunda de interacção negativa, do arrefecimento mútuo actualmente em curso que por sua vez anuncia a terceira, de arrefecimento financeiro a marchar em direcção ao colapso e com crescimentos anémicos, estancamentos e recessões suaves da economia real aproximando-se da depressão prolongada – tudo isso como parte do provável desinchar entrópico do conjunto do sistema.



A financiarização integral da economia faz com que a sua contracção comprima a economia real, reduza o seu espaço de desenvolvimento. O peso das dívidas públicas e privadas, a crescente volatilidade dos mercados submetidos ao canibalismo especulativo, grandes bancos na corda bamba e outros factores negativos afogam a estrutura produtiva.

Por outro lado o sistema global não se reduz a um conjunto de processos económicos. Encontramo-nos perante uma realidade complexa que inclui uma ampla variedade de componentes inter-relacionados (geopolíticos, culturais, militares, institucionais, etc). Isso significa que a crise pode desencadear-se a partir de diferentes geografias e focos de actividade social. Exemplo: um facto político como a decisão do eleitorado da Grã-Bretanha de sair da União Europeia poderia ter sido o detonador, tal como antecipava George Soros que esperava uma "Sexta-feira negra" seguida por uma reacção em cadeia de turbulências fora de controle se na quinta-feira 23 de Junho triunfasse o Brexit [3] . O desastre não se verificou, mas podia ter ocorrido... ainda que a sacudidela fosse bastante forte [4] .

Poderia ser uma onda de protestos sociais na Europa, mais extensa e radicalizada do que a verificada recentemente em França, ou a derrocada do Deutsche Bank que acumula papéis voláteis num montante da ordem dos US$70 milhões de milhões, quase equivalente ao Produto Mundial Bruto [5] . Também a economia italiana apresenta a sua quota de riscos, afectada pela degradação acelerada dos bancos encurralados pelos não pagamentos dos seus devedores, que em Março de 2016 somavam uns 200 mil milhões de euros (equivalente a 12% do PIB italiano) [6] . E naturalmente o Japão surge como um importante candidato à derrocada com uma dívida pública de US$9 milhões de milhões que representa 220% do seu PIB, não tendo conseguido sair da deflação e com as suas exportações a perderem competitividade [7] .

Os Estados Unidos, centro da economia global (sobretudo da sua hipertrofia financeira), são naturalmente o motor potencial de futuras tormentas globais. Ali nos últimos meses acumularam-se sinais recessivos: desde a tendência persistente para a baixa na produção industrial a partir de fins de 2014 [8] até a ascensão contínua de dívidas industriais e comerciais não pagas (que já alcançaram o nível dos fins de 2008 – aumentaram quase 140% entre o último trimestre de 2014 e o primeiro trimestre de 2016) [9] , passando pela queda do conjunto de vendas (grossistas, retalhistas e industriais) ao mercado interno desde o último quadrimestre de 2014 [10] e das exportações desde Novembro do mesmo ano [11] .

A isto devemos acrescentar uma dívida pública nacional que continua a aumentar. Já superou a barreira dos US$19 milhões de milhões (quase 106% do PIB) que, somada às dívidas privadas, chega aos US$64 milhões de milhões (3,5 vezes o PIB de 2015) [12] – e também com sinais claros de deterioração social como o facto de que umas 45 milhões de pessoas actualmente recebem ajudas alimentares por parte do Estado [13] . A agência encarregada de monitorar os programa alimentares governamentais, FRAC na sua sigla em inglês, assinalava no seu últimos relatório que "mais de 48,1 milhões de estado-unidenses vivem em lares que lutam contra a fome" [14] .



Para um número crescente de peritos, sobretudo os especialistas em temas financeiros, a pergunta decisiva não é se a crise se vai verificar ou não e sim quando vai ocorrer. Para alguns poderia assumir a forma de uma explosão financeira no estilo da que se verificou em 2008 ou em eventos anteriores desse tipo. Para outro, o que está para chegar é uma grande implosão do sistema.

Cabem duas hipóteses extremas. A primeira é que a acumulação de deteriorações gere cedo ou tarde um salto qualitativo devastador. A história do capitalismo está marcada por uma sucessão de crises de diferentes magnitudes. Olhando o passado seria razoável supor um desenlace sob a forma de hiper-crise.

A segunda hipótese é que a perda de dinamismo do sistema não seja um fenómeno passageiro e sim uma tendência pesada que obriga a superar a ideia de grande turbulência repentina, de tsunami arrasador, e introduzir o conceito de "decadência", de envelhecimento prolongado, de degradação civilizacional – o que não exclui as crises e sim incorpora-as a um percurso descendente em que o sistema se vai apagando, desarticulando, caotizando, perdendo vitalidade, racionalidade.

Larry Summers, ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos, relançou recentemente com grande repercussão mediática a teoria do "estancamento secular" segundo a qual as grandes potências tradicionais estão a entrar numa era de estancamento produtivo prolongado arrastando o conjunto do sistema global [15] . Recuperava desse modo as ideias de Alvin Hansen expostas em plena crise dos anos 1930. Por sua vez, académicos importantes como Robert Gordon [16] , Tyler Cowen [17] ou Jan Vijg [18] apoiavam esse ponto de vista a partir da visão da ineficácia crescente da mudança tecnológica em termos de crescimento económico. Este último autor assinalava o paralelismo entre a decadência estado-unidense e as do Império Romano e da China na era da dinastia Qing (entre meados do século XVII e princípios do século XX). Nos anos 1970, quando se iniciava a longa crise global que chega até os nossos dias, Orio Giarini e Henri Loubergé, então na Universidade de Genebra, haviam elaborado a hipótese dos "rendimentos decrescentes da tecnologia" a partir do processamento de uma grande massa de informação empírica [19] . Pelo seu lado, o historiador Fernand Braudel assinalava que a grande crise dessa década era o começo de uma fase cíclica descendente de longa duração [20] . A partir de uma visão marxista, Roger Dangeville, também nessa época, afirmava que o capitalismo enquanto sistema global havia entrado na sua etapa senil [21] . Eu retomei essa hipótese desde fins dos anos 1990 [22] , que mais adiante foi assumida por Samir Amin [23] e outros autores.

Agora os sinais de alarme multiplicam-se, desde desajustamentos financeiros graves até perturbações geopolíticas carregadas de guerra e desestabilizações, desde crises institucionais até declinações económicas. Nos anos 1990 os comentaristas ocidentais maravilhavam-se diante do espectáculo da implosão da URSS. É provável que dentro de não muito tempo comecem a horrorizar-se diante de desastres muito maiores centrados no Ocidente.
[1] Philippe Mesmer, "L'alarmisme de Shinzo Abe surprend le G7", Le Monde, 26/05/2016.
[2] Tyler Durden, "Is Deutsche Bank The Next Lehman?", Zero Hedge, www.zerohedge.com/news/2015-06-12/deutsche-bank-next-lehman
Michael Snyder, "Financial Armageddon Approaches", INFOWARS, www.infowars.com/...
[3] Antoine Gara, "George Soros Says Brace For 'Black Friday' If Brexit Vote Succeeds", Forbes, Jun 21, 2016, www.forbes.com/...
[4] Wolf Richter, "European Banks Get Crushed, Worst 2-Day Plunge Ever, Italian Banks to Get Taxpayer Bailout, Contagion Hits US Banks", Wolf Street, June 27, 2016, wolfstreet.com/...
[5] Michael T. Snyder, "Will Deutsche Bank Survive This Wave Of Trouble Or Will It Be The Next Lehman Brothers?", Smarter Analyst, May 23, 2016, www.smarteranalyst.com/...
[6] Jeffrey Moore, "Will Italian banks spark another financial crisis?", Global Risk Insights, March 7, 2016.
[7] Takashi Naakamichi, "Japan emerges as key victim in fallout from Brexit", Market Watch,June 27, 2016.
[8] U.S. Board of Governors of the Federal Reserve System, "Industrial Production and Capacity Utilization".
[9] Worlf Richter, "Business Loan Delinquencies Spike to Lehman Moment Level", May 19, 2016, wolfstreet.com/2016/05/19/delinquencies-of-commercial-industrial-loans-spike/
[10] FRED - Federal Reserve Bank of St. Louis, Total Business Sales.
[11] U.S. Census Bureau, "U.S. International Trade in Goods and Services".
[12] FRED - Federal Reserve Bank of St. Louis, All Sectors; Debt Securities and Loans.
[13] United States Department of Agriculture, Food and Nutrition Service.
[14] FRAC, Food Research & Action Center, "U.S. Makes Progress Addressing Food Hardship, but One in Six American Households Still Struggle to Put Food on the Table", June 30, 2016, frac.org/...
[15] Laurence. H. Summers, "Reflections on the New Secular Stagnation Hypothesis", Secular Stagnation: Facts, Causes, and Cures, CEPR Press, 2014.
[16] Robert J. Gordon, "Is US Economic Growth over? Faltering Innovation confronts the six Headwinds", NBER Working paper series, 18315, August.2012."The turtle's progress: Secular stagnation meets the headwinds", Secular Stagnation:Facts, Causes, and Cures, CEPR Press, 2014.
[17] Tyler Cowen, "The Great Stagnation", Dutton, 2011.
[18] Jan Vijg,"The American Technological Challenge: Stagnation and Decline in the 21st Century", Algora Publishing, 2011.
[19] Orio Giarini y Henri Loubergé,"La Civilisation technicienne à la dérive. Les rendements décroissants de la technologie", Dunod, Paris, 1979
[20] Fernand Braudel, "Civilisation matérielle, économie et capitalisme, XV e XVIII e Siècle", tome I, Armand Colin, Paris, 1979.
[21] Roger Dangeville, "Marx-Engels. La crise", Editions 10/18, Paris 1978
[22] Jorge Beinstein, "La larga crisis de la economía global", Corregidor, Buenos Aires, 1999 y "Capitalismo senil. A grande crise da economia global", Record, Rio de Janeiro, 2001.
[23] Samir Amin, "Au-delà du capitalisme sénile", PUF, Paris, 2002.

Ver também:

Crises, os desenlaces possíveis

Resenha do livro Le capital fictif, de Cédric Durand

O capital fictício, como a finança se apropria do nosso futuro
The Epic Collapse of Deutsche Bank

[*] Doutorado de Estado em Ciências Económicas (Universidade do Franche Comté, Besançon, França), especialista em prognósticos económicos. Foi consultor de organismos internacionais e de governos, dirigiu numerosos programas de investigação e foi titular de cátedras de economia internacional e prospectiva tanto na Europa como na América Latina. É professor titular das cátedras livres "Globalização e Crise" nas Universidades de Buenos Aires e Córdoba (Argentina) e de Havana (Cuba) e director do Centro de Prospectiva y Gestión de Sistemas (Cepros). Sua página web é http://beinstein.lahaine.org/

O original encontra-se em www.resumenlatinoamericano.org/

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/





http://resistir.info/beinstein/sinais_globais_08jul16.html

¿Será Deutsche Bank un nuevo Lehman Brothers que colapsará el mundo? 12/07/2016


Julio Fernández
El blog salmón


La realidad económica está cada vez más agitada en los tiempos que corren. El cambio económico chino y el impacto que ha tenido en las economías emergentes (como es el caso de Brasil), la guerra de divisas que estamos presenciando a nivel mundial, la ralentizada subida de tipos de interés por parte de la Reserva Federal Americana o la caída estrepitosa del precio del crudo. Ahora se suma las elecciones favorables al brexit, con toda la incertidumbre que está provocando a nivel económico y social las dudas de activar el famoso artículo 50 del Tratado de Lisboa, el cual permite dos años para el proceso de salida y marcar todas las relaciones económicas y de emigración con la Unión Europea. Bien, ahora nos enfrentamos a la más que posible quiebra de uno de los bancos más grandes del mundo, el Deutsche Bank.

En el artículo analizaremos todos los aspectos a considerar sobre la posible caída de dicha institución bancaria, así como su similitud a uno de los episodio más sórdidos de la historia económica moderna, la caída de Lehman Brothers el 15 de Septiembre de 2008. Si algo hemos aprendido de la historia económica reciente, y del caso de Lehman Brothers en concreto, es que las corporaciones ¨Too big to fail¨ (demasiado grandes para fallar), también quiebran con todo lo que ello implica a nivel mundial desde un punto de vista económico y social.

Deutsche Bank ha suspendido las pruebas de estrés aplicadas por la FED y el Fondo Monetario Internacional ha señalado al banco como el que mayor riesgo tiene, en producir un nuevo tsunami financiero a nivel mundial.
Deutsche Bank vs. Lehman Brothers


Algo que nos va a ayudar de forma bastante práctica, para entender lo que está pasando con Deutsche Bank, y saber a lo que nos enfrentamos, es entender que pasó con Lehman Brothers hace años, la historia aunque no es exacta, se parece bastante.

El banco de inversión Lehman Brothers que disfrutó del crecimiento que provocó la segunda burbuja financiera en la época de Alan Greenspan al frente de la FED, y digo la segunda, porque ya se había provocado otra, la burbuja punto.com. Esta segunda burbuja impactó al sector inmobiliario. El 18 de Junio del 2002, el Presidente de los E.E.U.U, George W. Bush pronunció su famoso discurso en el que promulgaba que la adquisición de una vivienda en propiedad, conformaba parte del sueño americano. De ahí que la FED tomara cartas en el asunto, y favoreciese la medida reduciendo los tipos de interés del 6% al 1%, para abaratar el crédito y se desató la locura.

La compra de inmuebles en bloque no se hizo esperar, y los bancos con un afán desmesurado de lucro, daban créditos hipotecarios hasta aquellos que no podían devolverlo. Los famosos NINJA (No Incomes, No Jobs, No Assets), es decir gente que no tenían trabajo, ni ingresos, ni ningún tipo de activo. Obviamente, todas estas hipotecas de elevadísimo riesgo eran a su vez revendidas por bancos comerciales a bancos de inversión, los cuales generaban los famosos paquetes hipotecarios, donde combinaban hipotecas con altos niveles de liquidez, y por tanto poco riesgo, con estas de elevadísimo riesgo. Dichos activos eran conocidos como CDO´s (Collateral Debt Obligation) los cuales eran emitidos y vendidos a otros bancos de forma global.

Dos semanas antes de la quiebra de Lehman Brothers, todas las empresas de rating americanas, S&P, Fitch o Moodys daban la calificación más alta de liquidez y solvencia a Lehman Brothers (AAA+).

Cierto es, que el caso actual de Deutsche Bank, las causas no se deben a ninguna burbuja inmobiliaria a día de hoy, pero si a un entorno macroeconómico inestable pocas veces visto con anterioridad. Es preciso comparar datos para ver la situación económico-financiera de Deutsche Bank con Lehman Brothers cuando quebró:
La caída en picado de la capitalización bursátil de Lehman Brothers antes de la quiebra. Las acciones de Deutsch Bank están practicamente en caída libre,como las de Lehman Brothers en su momento, las cuales están en torno a los 13.91 euros/acción, lo que implica una caída del 45% en este último año. Aunque más vértigo da ver la evolución del precio de la acción desde el 2008, cuya caída es superior al 90%. La capitalización bursátil del banco está entorno a 20 mil millones de dólares, muy por debajo de su valor en los libros contables, en torno es 67 mil millones, lo que implica un descuento en torno al 70%.

La evolución de las acciones de Deutsche Bank, las cuales parecen abocadas a caer hasta 0, como ya lo hicieran en su momento las acciones de Lehman Brothers. Las reacciones no se han hecho esperar, George Soros, a través de sus Hedge Funds a empezado a vender en corto acciones del banco, ¨invirtiendo a la contra¨, ya que la tendencia bajista parece ser irremediable. Vender a corto, implica que una compañía de Hedge Funds toma prestadas unas acciones por parte de un accionista de Deutsche Bank durante un tiempo limitado. En el momento que las adquiere las vende por que estima que van a caer, y después cuando las acciones realmente caen y vence el periodo para su devolución, las vuelve a comprar por un precio mucho más bajo, generando una plusvalía o ganancia, de la cual se deduce la consiguiente comisión a pagar por dicho préstamo de acciones al inversor primero, en el momento de la devolución¨. Esta es una de las muchas formas de ¨invertir a la contra¨.

Apalancamiento. Otro signo de similitud entre Lehman Brothers y Deutsche Bank, es el volumen de apalancamiento (Gearing o Leverage, en inglés). Las cifras no pasan desapercibidas. Momentos antes del colapso de Lehman Brothers, su balance de situación arrojaba un volumen de activos de 639 mil millones, y un pasivo de 619 mil millones de dólares respectivamente, lo que implicaba una proporción de apalancamiento de 31:1. Es decir, por cada dólar de capital propio, había 31 dólares de endeudamiento. Las cifras arrojadas por los estados financieros de Deutsche Bank en Diciembre del 2015, muestran un volumen de activos de 1.60 billones de euros (sí, billones) y un pasivo de 1.56 billones de euros, lo que implica un ratio de apalancamiento todavía mayor, en torno al 40:1. Es decir, por cada euro de capital propio, hay 40 euros de deuda, lo que implica un endeudamiento desorbitado. Tampoco han ayudado las LTRO (Long Term Refinancing Operations), o lo que coloquialmente se conoce como ¨la barra libre del Banco Central Europeo¨. Esto es, que el Banco Central Europeo emite dinero gratuito a la banca comercial privada. Es decir, deuda a un tipo de interés del 0% a los bancos para capitalizarse, lo cual no deja de ser un incremento del pasivo bancario en sus balances, aunque en principio no generen gastos financieros.
Otras magnitudes a considerar en el colapso de Deutsche Bank


En el apartado anterior veíamos aspectos comunes entre Deutsche Bank y Lehman Brothers antes de su quiebra. Bien, aparte de esos aspectos comunes, hay otros aspectos a considerar, al margen de la comparativa con Lehman Brothers, en el derrumbe del gigante alemán.


La política monetaria del Banco Central en un entorno de tipos de interés nulos, no ayuda a los bancos a sacar márgenes de ganancia en los intereses netos. Esto es, la diferencia entre los ingresos por intereses y los gastos por intereses se reducen cada mes más. Como se puede apreciar en sus cuentas anuales para el 2015 La pérdida obtenida por el Deutsche Bank en 2015 está en torno a 6.7 mil millones (después de impuestos), y que es por la reducción de los márgenes netos de interés, al incremento de los gastos no financieros, es decir al pago de gastos por comisiones a acreedores debido a una tendencia generalizada por parte del sector bancario a compensar sus exiguos ingresos por intereses, con ingresos por comisiones. Esto hace que los ingresos/gastos por comisiones tengan un peso específico mucho más alto en las cuentas anuales de los bancos. Por último, el batacazo dado por la depreciación de su Goodwill, o Fondo de Comercio con una caída de 5.7 mil millones de euros, que son todos los activos intangibles de la corporación, tales como marca comercial, cartera de clientes, prestigio en el mercado, etc..


La alta exposición al mercado de derivados. Actualmente Deutsche Bank tiene un volumen de 75 billones de dólares en derivados,lo que implica 5 veces el PIB de la Unión Europea y 20 veces el PIB alemán. También representa el 13% de mercado total de derivados en el mundo que se cifra en torno a 550 billones de dólares. En principio, esa no es la cifra a considerar en caso de rescate, ya que muchos activos se compensan con otros pasivos. Dichos derivados dependen de activos subyacentes, lo cuales pueden a su vez ser tóxicos y equiparables a las hipotecas subprime de Lehman Brothers.



Otro impacto a considerar es el ¨Brexit¨. El 19% de sus ingresos vienen del UK. Toda la incertidumbre generada en torno al nuevo escenario mundial con el Reino Unido fuera de la Union Europea está impactando negativamente en todo el sector bancario mundial, y concretamente en el banco alemán, el cual puede ver depreciado su facturación total en un 19%, si rompe toda su relación comercial con los británicos.


Riesgo sistémico. Este fenómeno hace referencia al riesgo que se produce si una corporación de esta envergadura quiebra y al impacto sobre el volumen insolvencias que generan en otras grandes corporaciones y bancos de inversión. De modo que, estos acreedores generan otras insolvencias sobre otros acreedores, y así sucesivamente generando un efecto dominó de colapso financiero mundial, como ya ocurrió con Lehman Brothers. Esto es debido en parte, al sistema bancario de Reserva fraccionaria o coeficiente de caja, por el cual el Banco Central marca el volumen de depósitos mínimos que deben ser mantenidos en un banco comercial, invirtiendo el resto en un segundo banco comercial. El segundo banco hace la misma operación, mantiene el porcentaje de dinero mínimo que exige el Banco Central, y que ha recibido del banco comercial primero e invierte el resto en un tercero, y así sucesivamente, generando lo que se llama el efecto multiplicador de dinero o multiplicador monetario. Ese es el mecanismo por el cual la banca comercial privada genera la mayor parte del dinero que hay en circulación en la economía, y no el Banco Central como mucha gente cree. El impacto global del riesgo sistémico que puede producir la quiebra de Deutsche Bank sobre el tejido bancario mundial, es amplio.

El último dato a considerar son los CDS (Credit Default Swaps). Son seguros emitidos en los mercados financieros, y que aseguran la posible falta de liquidez e insolvencia sobre un activo concreto. La particularidad de estos seguros, es que puedes comprar el seguro, sin adquirir el activo que dicho seguro cubre. Por tanto, si una empresa concreta quiebra, y usted tiene el seguro sobre los activos de la empresa sin haber adquirido dichos activos, usted cobra igual por la contingencia producida. Es muy fácil ¨invertir a la contra¨ en estas situaciones. Los CDS de Deutsche Bank han aumentado su valor de mercado de los 100$ a los 250$, lo que supone que el mercado estima un incremento de la posibilidad de insolvencia por parte de Deutsche Bank en torno al 150%.
El colapso que viene

Todo parece indicar que estamos a punto de sufrir otro colapso financiero global, esta vez debido a Deutsche Bank. Las cifras ofrecidas invitan al análisis de sus posibles consecuencias. ¿Preocupación?, sí, mucha. No debemos olvidar, que el volumen de activos de Lehman Brothers representaba sólo el 3% por ciento del PIB de E.E.U.U, y aún así quebró. O como el impacto que generó en el resto del sector bancario mundial, que implicó rescates a la banca, rescates a otros países de Europa, políticas de austeridad.... y mas políticas de austeridad.

Este caso es peor ya que el volumen de activos sobre el PIB de Alemania o sobre el de la UE tiene un peso especifico muchísimo más alto. ¿Cómo vamos a rescatar al gigante, si todos los demás somos infinitamente enanos?, ¿cómo se puede salir de una situación así?, ¿tiene el sistema capitalista realmente futuro?

Fuente: http://www.elblogsalmon.com/mercados-financieros/sera-deutsche-bank-un-nuevo-lehman-brothers-que-colapsara-el-mundo

http://www.rebelion.org/noticia.php?id=214394