sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Como proteger um amigo e esconder US$ 8 milhões 06/12/2013



Jornais O Globo, da família Marinho, e Valor Econômico, dos Marinho e dos Frias, repercutem, nesta sexta-feira, a informação exclusiva publicada no 247 sobre as contas de US$ 8 milhões abertas pelos familiares de Eduardo Paes no Panamá em 2008, quando ele se elegeu prefeito do Rio de Janeiro pela primeira vez, mas de um modo bastante peculiar; no Globo, cuja emissora dedicou mais de seis minutos ao caso St. Peter, o episódio foi apresentado da seguinte forma: "Publicação em site jornalístico gera debate político no Rio"; no Valor, foi reduzido a uma disputa local: "Garotinho faz denúncia contra Paes"; se fosse essa a indignação da Globo em relação aos chamados "mensaleiros", a Ação Penal 470 talvez nem tivesse entrado na pauta do Supremo Tribunal Federal; "affair Panamá", ao menos, serviu para desnudar a hipocrisia da imprensa brasileira

6 DE DEZEMBRO DE 2013 ÀS 07:00

247 - Eduardo Paes se elegeu prefeito do Rio de Janeiro em 2008, pelo PMDB, com apoio do PT. No dia 12 de junho daquele ano, quatro meses antes da disputa, seus pais e sua irmã abriram uma empresa no Panamá, a Conval Corporation, que recebeu depósitos de US$ 4 milhões. Uma semana depois, abriram outra companhia no mesmo país, a Vittenau, que também recebeu US$ 4 milhões. As informações foram publicadas em primeira mão pelo 247, que também trouxe a público documentos cartoriais obtidos junto às autoridades do Panamá (leia mais aqui). Somados, os US$ 8 milhões hoje equivaleriam a cerca de R$ 20 milhões.

Paes alega que seu pai, Walmar, sempre foi um advogado bem-sucedido, com carreira internacional, e que as empresas estão declaradas em seu imposto de renda. Mas o caso chama a atenção por algumas razões: por que depósitos tão volumosos foram feitos às vésperas de uma campanha eleitoral? Além disso, por que num paraíso fiscal como é o caso do Panamá?

São questões relevantes, que poderão ser respondidas, caso sejam abertos procedimentos de investigação por organismos como a Receita Federal, a Polícia Federal e o Coaf, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras. As respostas também viriam mais rápido se a imprensa familiar brasileira se dedicasse com mais afinco ao caso.

No entanto, as edições desta sexta-feira de dois jornais ligados a essa mesma imprensa controlada por famílias midiáticas deveriam ser guardadas para sempre nas escolas de jornalismo como um exemplo pronto e acabado de como esconder o que é relavante e ressaltar o acessório. Ou, em outras palavras, de como escamotear US$ 8 milhões e proteger um aliado político

No Globo, da família Marinho, a notícia foi publicada abaixo da previsão do tempo, com o seguinte título: "Publicação em site jornalístico gera debate político no Rio". No Valor Econômico, que pertence às famílias Marinho e Frias, o caso foi também reduzido a uma disputa política local: "Garotinho faz denúncia contra Paes".

Traçando um paralelo com o "mensalão"

Fosse essa a indignação das famílias Marinho e Frias com o chamado "mensalão", o caso que envolveu o PT e seus partidos aliados nem teria sido colocado na pauta do Supremo Tribunal Federal. Apenas para relembrar, o que foi o "mensalão"? Um escândalo de caixa dois eleitoral, transformado em "mesada" na ficção criada pela boa retórica do delator Roberto Jefferson.

Como disse o ministro Luis Roberto Barroso, ao fim do julgamento, foi apenas mais um escândalo que repetiu a lógica de todos os anteriores: financiamento irregular de campanhas políticas, em que parte dos recursos é desviada para fins pessoais.

Na Ação Penal 470, um personagem como José Genoino foi preso, humilhado e condenado como "corruptor", muito embora todos os deputados da Câmara e até os juízes que o sentenciaram saibam que seu patrimônio é irrisório – aliás, seus familiares, ainda hoje, são camponeses no interior do Ceará.

Aos inimigos, a fúria; aos amigos, a proteção

Curiosamente, o caso das empresas dos familiares de Eduardo Paes só veio a tona porque a Rede Globo foi ao Panamá com uma missão: impedir que José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, pudesse ser empregado no hotel St. Peter, em Brasília. Nessa viagem, a reportagem de mais de seis minutos da emissora no Jornal Nacional – uma eternidade para padrões televisivos – apontou que a estrutura da societária do hotel do empresário Paulo Abreu foi organizada pelo escritório Morgan y Morgan e utilizou os serviços de um laranja chamado José Eugenio Silva Ritter.

A Globo não conseguiu provar a conexão entre o "laranja" e o ex-ministro José Dirceu, mas atingiu seu objetivo: o de impedir que o ex-ministro, condenado a um regime semiaberto, onde teria apenas que dormir na prisão, pudesse sair para trabalhar. Assim, Dirceu continuará encarcerado na Papuda.

No entanto, o desinteresse da Globo pelos donos das outras 1,5 mil empresas abertas pelo Morgan y Morgan no Brasil permitiu que 247 tivesse acesso, com exclusividade, às contas abertas pelos familiares de Eduardo Paes, às vésperas de uma disputa eleitoral.

Os Marinho atiraram no inimigo político, mas acertaram num dos mais diletos aliados, que vem sendo preparado como eventual alternativa presidencial de centro-direita para 2018, dois anos depois dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.

Por mais que tenham tentado proteger o aliado Eduardo Paes, os Marinho conseguiram revelar ao público a grande hipocrisia da mídia e da sociedade brasileira.

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