quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Governo israelense joga população contra o Irã (mais uma vez) 01/08/2013

Benjamin Netanyahu
Neste mês, o primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, apareceu na televisão americana para lembrar ao mundo (caso alguém tenha esquecido) que a ameaça do Irã continua viva. Falando no programa "Face the Nation", Netanyahu alertou que a República Islâmica está novamente se aproximando da linha vermelha nuclear, assim como insinuou que se os Estados Unidos não agirem em breve, ele o fará.

Espere ouvir mais a respeito disso nas próximas semanas; a aparição de Bibi na TV foi apenas a salva inicial de uma nova campanha para redirecionar o foco para o Irã. Mas não espere que Washington ou a comunidade internacional entre correndo em ação.

Netanyahu não obterá –e nem deveria– a resposta que deseja. Colocando de modo simples, isso se deve tanto à linguagem dele quanto ao comportamento de Israel tornar cada vez mais difícil levar seus alertas a sério.

O problema começa em quão familiares os alertas de Israel contra o Irã se tornaram. Netanyahu realizou um exercício semelhante em meados do ano passado. E no ano anterior. Na verdade, os líderes israelenses estão fazendo esses alertas há quase uma década.

A repetição não seria necessariamente um problema se aquilo que vem sendo alertado não tivesse mudado tanto. Considere: em 2004, quando o primeiro-ministro Ariel Sharon levantou a questão do programa nuclear do Irã, ele disse que o ponto sem retorno chegaria quando o Irã se aproximasse de desenvolver capacidade técnica para enriquecimento de urânio.

Meses depois, entretanto, o ministro da Defesa, Shaul Mofaz, disse que não, o verdadeiro risco seria quando o Irã começasse a enriquecer urânio em seu próprio solo. Depois, em 2006, o primeiro-ministro Ehud Olmert disse que o momento fatal seria quando o Irã começasse a operar um determinado número de centrífugas de enriquecimento. E então, no ano passado, Ehud Barak (o ministro da Defesa de Bibi na época) disse que a verdadeira linha vermelha seria cruzada quando  o Irã entrasse na "zona de imunidade" – o ponto em que seu programa nuclear estaria tão avançado ou bem defendido a ponto de não poder ser inutilizado por um ataque.

O que é confuso nessa ladainha é que o Irã já cruzou cada uma das linhas vermelhas, mas o suposto desastre ainda não se materializou. Então agora Bibi tem um problema do menino que gritou lobo. Mas há uma falha mais profunda em seu argumento contra o Irã, que é o de incoerência intelectual. Netanyahu insiste que a República Islâmica deve ser impedida antes de construir uma bomba, porque não se pode confiar que o país não a usaria. O Irã, em outras palavras, não pode ser dissuadido.

Mas para que isso seja verdade, os líderes do país teriam que ser mais malignos e menos racionais do que Stálin ou Mao, cujos crimes foram infinitamente maiores, mas contra os quais a dissuasão funcionou muito bem. Essa alegação é muito difícil de aceitar. É ainda mais difícil quando uma pessoa se recorda de que o Irã aparentemente desacelerou seu enriquecimento de urânio no ano passado. Teerã o fez em resposta as ameaças e sanções orquestradas – a própria definição de comportamento racional.

Mas vamos deixar claro: eu não estou tentando argumentar que Israel não tem nenhum motivo para se preocupar com o Irã. Diante do tamanho e localização de Israel, a atual preocupação do governo Obama com o Egito e a Síria, e a aparente disposição de Washington de dialogar com o novo presidente do Irã em uma nova rodada de negociações, a ansiedade de Netanyahu é compreensível (apesar de excessiva).

O que não é compreensível, entretanto, é a forma como ele está lidando com isso. Se o governo dele estivesse realmente determinado a deter o programa nuclear do Irã, ele estaria agindo de modo muito diferente em alguns poucos aspectos chave.

Primeiro, para formar um amplo apoio internacional à ação, ele estaria fazendo tudo ao seu alcance –tudo– para chegar à paz com a Autoridade Palestina e assim remover o maior elemento irritante em suas relações com a Europa e o mundo árabe. Em vez disso, Bibi não está fazendo nada eficaz nessa frente.

Não se deixe enganar pelo recente anúncio americano de que as negociações de paz podem ser retomadas em breve. O fato de que o lado israelense será liderado por Tzipi Livni – uma parceira da coalizão que Netanyahu não gosta e nem confia – e que, antes mesmo das negociações serem anunciadas, outros membros de seu Gabinete declararam unanimemente que ela seria pouco mais que uma fraude– mostra quão seriamente Bibi as considera.

Segundo, se Jerusalém quisesse impedir o Irã de obter uma bomba, ele colocaria sua própria na mesa. Isso pode soar estranho, mas considere o que a simples oferta de estabelecer uma zona livre de armas nucleares proporcionaria a Israel. Netanyahu poderia insistir nos mecanismos de verificação mais intrusivos – inspetores israelenses em solo em Fordow ou Natanz, digamos. O Irã se recusaria, mas não importaria; Jerusalém teria colocado Teerã na defensiva e conquistado parte do apoio internacional que desesperadamente precisa.

Mas em vez desses passos ousados, Netanyahu recorre à velha tática e fica martelando em Washington. O que aponta para uma conclusão cínica, mas inevitável: o que ele realmente deseja  é que o restante do mundo cuide do problema dele com o Irã por ele.

Não é que Netanyahu não queira que os mulás sejam impedidos de construir uma bomba. É claro que quer. Ele apenas não está disposto a pagar o preço – como a oferta de concessões dolorosas – para que isso aconteça. Mas se ele não está, por que uma pessoa de fora estaria disposta a fazê-lo em seu lugar?

 O Informante

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