quinta-feira, 6 de junho de 2013

Brasileiro não sabe seu potencial no exterior 06/06/2013

"Os brasileiros nunca têm consciência da atratividade que eles têm lá fora"

Ao iG, executivos expatriados relatam as vantagens e dificuldades de se trabalhar no Brasil e como suas visões sobre o País mudaram ao chegar aqui

Murilo Aguiar - iG São Paulo*

O Brasil passa por um apagão de mão de obra em algumas áreas profissionais. Como consequência, as empresas têm dificuldade em encontrar candidatos compatíveis às vagas ofertadas. “Medicina, arquitetura, ciências sociais e engenharia são áreas que apresentam maior demanda do que oferta de trabalho no País”, afirma Daniel Rosenfeld, gerente de projetos da Brain (Brasil Investimentos e Negócios), consultoria que pesquisa a inserção do Brasil no mercado global.
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"Quem vem ao Brasil precisa aprender a língua do dia-a-dia, para se inserir mais facilmente”, aconselha Leonardo Rojas Neira
A falta de profissionais qualificados no País, somada à crise internacional e às recentes medidas do governo para facilitar a concessão de vistos de trabalho, criam condições favoráveis à vinda de executivos estrangeiros que pretendem trabalhar no Brasil. Somente entre 2006 e 2012, as concessões de autorização de trabalho à estrangeiros aumentaram 179%, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
De acordo com Denise Barreto, sócia diretora da Gnext, empresa de recrutamento de profissionais estrangeiros de alta qualificação, as empresas querem cada vez mais expandir seus negócios para fora do País e, por isso, tendem a contratar expatriados pela falta de preparação dos brasileiros, mesmo que especialistas em suas áreas de atuação, para ocupar altos cargos que lidem com o mercado internacional. Para a executiva, a falta de domínio de outras línguas, como o inglês e o espanhol, é uma das maiores desvantagens do executivo brasileiro em comparação ao estrangeiro.
Porém, a língua também é um obstáculo para os profissionais estrangeiros do alto escalão no País, que muitas vezes dominam outros idiomas, mas não o português. Para o colombiano Leonardo Rojas Neira, que se mudou para São Paulo em 2010 para trabalhar como gerente de canais de relacionamento do banco Santander Brasil, esse foi o seu primeiro desafio. “Quando você chega aqui, percebe que o português que você aprende nas aulas não é o mesmo que você usa”, conta Leonardo, que estudou a língua durante quatro meses antes de se mudar de Bogotá, capital da Colômbia, para São Paulo.
Veja também: Com lei antiquada, Brasil enfrenta desafio de integrar mão de obra estrangeira
“Em algumas reuniões, para me posicionar [em português], eu demorava muito mais. Quando eu ia falar alguma coisa, outra pessoa já tinha falado”, diz ele, que também passou por algumas saias justas por conta das gírias e expressões do cotidiano. Certa vez, quando perguntado por um brasileiro se ele já considerava estar falando bem a língua portuguesa, ele respondeu: “Não estou nem aí”, achando que a expressão significava “Não estou no mesmo patamar que você”. “Eu passei uma imagem de arrogante. Quem vem ao Brasil precisa aprender a língua do dia-a-dia, para se inserir mais facilmente”, aconselha ele.
Adaptação à cultura
Além da língua, os executivos também enfrentam outros entraves quando decidem se mudar para cá. Segundo Denise Barreto, da Gnext, o maior motivo de desistência da permanência do expatriado no País é a baixa adaptação da família à nossa cultura. “Enquanto o executivo passa o dia fora trabalhando, a esposa está sozinha e sem amigos em um país desconhecido”, justifica ela.
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”Quando somos expatriados, o mínimo que temos que fazer é se adaptar e tentar viver como as pessoas do país”, diz Franck Pruvost
Para Denise, o investimento de tempo e dinheiro de uma empresa ao contratar um estrangeiro é grande. Pela demora do processo seletivo e custos com vistos e traslados, os setores de Recursos Humanos das companhias acompanham mais a adaptação dos familiares à vida no Brasil do que do próprio executivo. Assim, eles evitam o regresso do funcionário ao país de origem e e a realização de uma nova seleção.
Quando o francês Franck Pruvost foi convidado a vir a São Paulo com sua família para ocupar o cargo de diretor de Operações da Ibis na América Latina (marca da rede francesa de hotéis Accor), em 1999, a reação de sua mulher foi bastante negativa. “Ela ficou muito assustada. Ouvíamos falar muito da violência do Brasil e ela falava ‘nós não vamos conseguir viver lá, é muito perigoso, vão raptar as crianças’”, diz ele. Foi então que a empresa trouxe Pruvost e sua família para passar duas semanas na capital paulista e decidir se mudariam. “A gente criou um roteiro legal para ela [ esposa ] gostar de tudo e funcionou. Ela adorou São Paulo”, conta Pruvost, que sempre sonhou em morar no Brasil.


Para Pruvost a adaptação à cultura brasileira não foi difícil .”Quando somos expatriados, o mínimo que temos de fazer é se adaptar e tentar viver como as pessoas do País”, diz Franck. “Eu ouvi muito mais brasileiros que moram na França falando que queriam voltar ao Brasil do que franceses morando aqui e querendo voltar para lá”, conta o francês, que diz que os brasileiros são pessoas acolhedoras e dispostas a ajudar.
“As pessoas [aqui] são muito abertas aos estrangeiros e estão interessadas em saber o nosso ponto de vista”, concorda o colombiano Leonardo.
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“Os brasileiros nunca têm consciência da atratividade que eles têm lá fora", destaca Patrick Mendes
Ambiente de trabalho diferenciado
Outra surpresa que os gestores estrangeiros têm no País é a boa relação interpessoal presente no ambiente empresarial brasileiro. “O brasileiro é muito carinhoso. Para obter o máximo da sua equipe, a gente precisa ter um cuidado especial com ela – comemorar, fazer festas quando se tem um bom resultado, pôr uma pessoa que se destacou em evidência. [ Os europeus ] são mais rudes, mais focados no processo e nos números, não tanto nas pessoas”, destaca Franck Pruvost.
Para o francês Patrick Mendes, que se mudou para o Brasil no início de 2012, quando assumiu o cargo de diretor de Operações Mercure, Pullman, Adagio e MGallery na América Latina, a energia positiva encontrada no ambiente de trabalho é a maior vantagem de se trabalhar no Brasil. “É uma coisa muito diferente, que você não consegue encontrar em outro país”, diz ele.
Porém, o executivo destaca o negativismo do brasileiro em relação e a mania de se colocar para baixo em relação a outros países. “O brasileiro nunca tem consciência da atratividade que eles têm lá fora. Com exceção da violência, só ouvimos coisas boas daqui”, conta Patrick.
Crise internacional também traz executivos
Entre o início da crise, em 2008, até 2012, considerando as dez nacionalidades estrangeiras mais presentes no mercado de trabalho brasileiro, o número de concessão de autorizações de trabalho a europeus aumentou 32,4%, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Apenas no primeiro trimestre deste ano, foram concedidas 4.543 autorizações.
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"Chegou uma hora em que ou eu fechava minha empresa e mudava de emprego, ou saía de lá", diz Alberto Da Lio sobre a crise na Itália
Com a crise afetando os resultados de seu negócio na Europa, o italiano Alberto Da Lio, em janeiro deste ano, abriu um escritório de sua empresa de revestimento de luxo em São Paulo, a Edificiositalia. "Chegou uma hora em que ou eu fechava minha empresa e mudava de emprego, ou saía de lá", diz Da Lio, que agora importa os produtos italianos para o Brasil.
Com a projeção inicial de conseguir 50 lojas pelo País distribuindo seus produtos até o final de 2013, Alberto conta que o mercado brasileiro o surpreendeu, tanto que reviu a projeção para 50 distribuidores somente no Estado de são Paulo.
O arquiteto confessa que o fato de ser estrangeiro favorece automaticamente o sucesso de sua empresa no Brasil, pela impressão de que produtos italianos, ainda mais os ligados a design, são naturalmente melhores que os nacionais. "[ Porém ], é preciso entregar um produto de boa qualidade para que as pessoas continuem comprando", lembra ele.
Sobre seus amigos que continuam na Itália sofrendo os efeitos da crise, Da Lio diz que muitos demonstram interesse em vir ao País e lhe perguntam sobre o mercado de trabalho brasileiro, mas poucos têm coragem de se mudar.
*Colaboraram Taís Laporta e Vitor Sorano

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