O primeiro satélite astronômico
brasileiro já teve sua configuração definida. A informação é do
cientista responsável pela missão, que está sendo planejada para voar em
janeiro de 2017.
“Os instrumentos já estão
completamente definidos”, diz João Braga, pesquisador do Inpe (Instituto
Nacional de Ciências Espaciais), em São José dos Campos.
Batizada em homenagem ao físico
brasileiro César Lattes (1924-2005), a espaçonave é o ponto culminante
do primeiro esforço de desenvolvimento de satélites científicos
conduzido pelo Brasil.
Originalmente, o que veio a se tornar a
configuração original do Lattes consistia em dois satélites diferentes,
um voltado para astrofísica (Mirax) e outro para observação da Terra
(Equars).
O planejamento das duas missões,
separadas, havia começado em 2000. Contudo, uma mudança estratégica do
programa sugeriu a combinação das duas numa só, o que gera uma
configuração curiosa: a parte de cima do satélite passará o tempo todo
olhando para o céu, enquanto a de baixo estará sempre mirando a Terra.
Os dispositivos das duas missões estarão
embarcados na chamada Plataforma Multimissão (PMM), uma espécie de
“carcaça de satélite genérica” que pode ser usada para propósitos
diferentes.
Não será a primeira missão da PMM (que
deve ser usada inicialmente pelo satélite de monitoramento Amazônia-1),
mas a ideia é que se torne a primeira a ter o sistema de controle de
atitude (que determina a orientação da nave no espaço) desenvolvido
totalmente no Brasil.
O Lattes fará uma varredura do céu em
busca de sinais de fontes de raios X. Essa radiação altamente energética
costuma vir de objetos astrofísicos interessantes e misteriosos, como
os buracos negros, e seu estudo pode ajudar a identificar a natureza de
diversos fenômenos ainda pouco compreendidos.
Um dos aspectos interessantes da missão é
que ela fará um monitoramento constante de grande parte do céu em busca
dessas fontes. “O fato é que o céu em raios X é supervariável e até
hoje nenhuma missão fez um acompanhamento sistemático”, diz Braga.
“Vamos monitorar o comportamento transiente, em todas as escalas de
tempo, de segundos a meses.”
Com isso, espera-se fazer descobertas na
dinâmica de objetos como buracos negros, identificando, por exemplo, o
processo de acreção.
Buracos negros são objetos tão densos
que nada consegue escapar de sua gravidade, nem mesmo a luz. Os raios X
são emanados de suas imediações, onde costumam se formar discos de
acreção -material prestes a ser engolido pelo objeto. Com o Lattes, será
possível investigar a fundo esse processo.
VERSATILIDADE
Enquanto os detectores de raios X
-desenvolvidos pelo Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica, nos
Estados Unidos- ficam apontados para o céu, outros instrumentos,
destinados a monitorar a atmosfera terrestre, ficam apontados para
baixo.
A disputa entre duas missões
concorrentes num mesmo satélite poderia se tornar um problema, mas nesse
caso tudo confluiu bem, segundo João Braga.
“Tivemos de mudar nossa estratégia de
observação. Antes, quando o Mirax era uma missão solo, a ideia era
observar a região do centro da galáxia de forma fixa. Mas agora, para
conciliar com as necessidades do Equars, que precisa estar apontado para
a Terra, vamos fazer um monitoramento móvel de mais da metade do céu.”
Segundo o pesquisador, a mudança não
ocasionou perda científica. “Embora, para um alvo específico, você tenha
menos tempo ininterrupto de observação, você passa a ter uma região do
céu muito maior.”
O Lattes deve ficar a cerca de 650 km de altitude, numa órbita com 15 graus de inclinação, com relação ao equador terrestre.
O satélite, com seus 500 kg, deve ser lançado por um foguete estrangeiro, contratado comercialmente.
Nenhum dos lançadores que poderiam
partir do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, tem a
configuração certa para fazer o serviço. Para o brasileiro VLS, o Lattes
é pesado demais. Para o ucraniano Cyclone-4, é leve demais.
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