domingo, 24 de junho de 2012

Presença dos EUA no Paraguai é profunda 24/06/2012

Mercosul- Geral

25/9/2005 - Presença dos EUA no Paraguai é profunda


SINDLAB


País, que pode ter base dos EUA, já é encrave militar dos americanos, que treinam forças paraguaias
CAROLINA VILA-NOVA
DA REDAÇÃO
A polêmica sobre a suposta instalação de uma base militar americana permanente no Paraguai, que dominou os jornais latino-americanos nos últimos meses, esconde uma outra realidade: a presença já forte e a influência marcante dos EUA nas Forças Armadas do país vizinho.
Analistas paraguaios independentes descrevem o país como um encrave militar histórico dos EUA no Cone Sul. Desde a década de 50, sob regimes autoritários ou sob governos democráticos, militares americanos têm trânsito relativamente livre pelo país por meio de acordos de cooperação.
Essas fontes afirmam que os EUA são também os responsáveis pela maior parte do treinamento e da formação das forças de segurança paraguaias, com cursos de especialização auspiciados pelos EUA por meio do Comando Sul e de programas de cooperação em defesa da Embaixada americana em Assunção.
"Hoje são os EUA quem definem quem é "bom" e quem é "mau" na política antiterrorista paraguaia", diz o especialista em temas militares Julio Benegas, do jornal paraguaio "ABC Color". "Há uma direta intervenção nos organismos antiterrorismo e antinarcóticos. São os EUA quem equipa, quem treina."
A implicação, sustenta, "é que o Paraguai abriu mão de definir sua própria política de defesa em troca de um suposto tratamento preferencial dos EUA".
"O presidente [Nicanor Duarte Frutos] diz que abrir uma maior relação com EUA pode redundar numa melhoria da economia e do intercâmbio comercial. Muitos somos céticos com relação a isso porque historicamente não temos tido uma relação comercial importante", disse o presidente do Senado, Carlos Filizzola, líder do partido de oposição País Solidário.
"A impressão é que os EUA se acercam porque lhes interessa estar nessa região e, como não podem fazê-lo com Brasil e Argentina, tentam ter uma maior presença através do Paraguai para fazer valer seus interesses em relação ao narcotráfico, ao terrorismo e à situação política no caso da Bolívia e da Venezuela", avaliou.
Grupos de defesa de direitos humanos vêem essa cooperação com inquietação.
"Isso é bastante preocupante porque o conceito de segurança norte-americano excluiu o conceito de direitos humanos", disse o advogado Orlando Castillo, membro da Serpaj (Serviço de Justiça e Paz).
Base
Com tamanha influência, argumentam os analistas, os EUA não precisam estabelecer uma base permanente em território paraguaio.
Fontes diplomáticas avaliam que o custo político dessa instalação seria muito alto e provocaria uma deterioração nas relações com os países vizinhos, dos quais depende boa parte da economia paraguaia.
"Seria mais interessante manter o Paraguai como um encrave sem ter a necessidade de trazer uma base, com toda a repercussão negativa que isso poderia ter na região", diz Benegas.
"Hoje, todos os escritórios de segurança norte-americanos estão funcionando [no Paraguai] e é melhor que funcionem livremente no país sem que se feche o escudo do Mercosul, para que possam mover-se facilmente e monitorar as atividades brasileira, argentina e boliviana", afirmou Castillo.
Não há indícios, por ora, de que a base exista. Segundo a Folha apurou, fotos aéreas feitas da pista de aterrissagem de Mariscal Estigarribia, apontado como lugar de instalação da base, e comparadas com fotografias de dois anos atrás não revelam nenhuma nova edificação nem movimentação de pessoas acima do normal -apenas um radar que não funciona.
Hoje, a atuação de militares americanos no Paraguai está ligada principalmente aos exercícios militares conjuntos de combate ao narcotráfico e ao terrorismo, além de operações de paz e humanitárias, como assistência médica em áreas carentes.
Recentemente, o Congresso do país autorizou a realização de 13 dessas ações, com duração prevista até dezembro de 2006. Estima-se que cerca de 400 militares americanos se revezem no país para participar dessas ações.
A reportagem da Folha pediu autorização para acompanhar os exercícios militares voltados ao combate do terrorismo e do narcotráfico que se realizavam nos últimos dias a 50 km de Assunção.
Foi autorizada pelo Comando das Forças Armadas do Paraguai; porém, até a última sexta-feira, quase duas semanas depois de formulado o pedido, a Embaixada dos EUA em Assunção não havia permitido o acesso do jornal ao local. Segundo uma fonte militar, trata-se de uma decisão "política".
"O que nos preocupa é que monitoramos 46 operações militares americanas desde 2002. Anteriormente, esses exercícios eram estabelecidos por seis meses. Depois aumentaram a quantidade de exercícios e o período, primeiro para um ano e agora para 18 meses. Isso demonstra a clara intenção de prolongar a presença americana no país", disse Castillo.
Exército nega participação americana
DA REDAÇÃO
As Forças Armadas e outras autoridades paraguaias negam a participação extensiva dos EUA na formação das tropas do país. Dizem que esta ocorre em academias militares paraguaias e que alguns oficiais são enviados para Brasil e Argentina para treinamento, como na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), no Rio de Janeiro.
Segundo o Exército, nenhum de seus oficiais atuais é egresso, por exemplo, da Academia Militar de West Point, nos EUA.
As autoridades paraguaias negam também qualquer ingerência exterior na política de defesa do Paraguai, apesar de admitir que parte da doutrina do país em questões de antiterrorismo e antinarcóticos chega por mãos americanas.
"O soldado americano, que tem maior experiência que nós, nos ensina a doutrina", afirmou o coronel Elio Flores, porta-voz do Comando das Forças Armadas do Paraguai.
"Mas isso não afeta em absoluto nossa política de segurança e de defesa", disse ele.
"Não temos orçamento para pagar esse tipo de treinamento. Os EUA têm a tecnologia, têm a doutrina, e nós optamos pela capacitação de nosso pessoal aprender suas diferentes experiências. Mas o compromisso é o mesmo dos treinamentos que temos com a Argentina e o Brasil", afirmou o coronel.
"São simples acordos de cooperação em matéria técnica na luta contra o narcotráfico e o terrorismo", concordou o ex-chanceler paraguaio Miguel Sanguier, senador pelo Partido Liberal. "Não significam nenhum compromisso com a política dos EUA. Não há uma política de defesa que os EUA nos ditem." (CV)
Militarização é "péssima idéia", diz Garcia
Assessor de Lula critica possível presença dos EUA, mas diz que é preciso fazer mais pelo Paraguai no Mercosul
CLÁUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo brasileiro prefere que os problemas de segurança da América do Sul sejam resolvidos internamente, sem interferências externas, disseram o assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, e o chanceler Celso Amorim. "Acho péssima a idéia de militarização da América do Sul, porque sabemos como começam esses processos, mas não como terminam", disse Garcia à Folha, referindo-se não apenas ao Paraguai, mas a toda a região.
Ele disse que o governo estuda formas de reduzir as insatisfações dos parceiros menores do Mercosul, mas admitiu que é preciso fazer mais para manter a coesão do bloco. "Sem dúvida teremos de ficar mais atentos a essas coisas, sobretudo se achamos que o Mercosul é um instrumento fundamental da construção da Comunidade Sul Americana. Política externa exige manutenção."
Para Garcia, a permanência do Paraguai no Mercosul é uma questão estratégica tanto para o vizinho quanto para o Brasil, e a discussão sobre a possível instalação de uma base militar americana no Paraguai em troca de um acordo comercial foi encerrada por Amorim, que procurou a chanceler paraguaia, Leila Rachid, para esclarecer o caso.
"Eu acho que eles [os paraguaios] têm todo o direito de reivindicar uma discussão mais consistente, e temos de fazer essa discussão. Temos de contribuir para o processo de diversificação da economia paraguaia e podemos fazer isso estimulando investimentos da iniciativa privada ou com crédito do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social]. São esses dois instrumentos públicos que temos", afirmou.
Sobre o fato de o vice-presidente paraguaio, Luis Castiglione, ter sugerido, na semana passada, que os EUA instalassem uma base militar no país em troca de um acordo comercial, Garcia disse que "Castiglione é uma autoridade do governo paraguaio e tem o direito de manifestar suas opiniões". "O Brasil não faria isso [oferecer o país como base militar] porque não acho que isso ajude na defesa da região e acrescentaria um elemento externo que não tem se revelado positivo para enfrentamentos de conflitos", afirmou.
"Por que temos de acrescentar esse elemento em uma região que sempre teve a capacidade de resolver os seus problemas pela via política, mesmo tendo contra si esse tremendo problema social que temos na região?", questionou o assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na semana passada, Amorim já havia dito que a defesa da região é um assunto que deve ser tratado internamente. "A questão da segurança e da defesa na América do Sul, creio que quanto mais for observada dentro da América do Sul, melhor será para nós", disse Amorim à imprensa quando participava da Assembléia Geral das Nações Unidas.
Ele também pediu transparência nas negociações entre o Paraguai e os EUA. Dois dias depois o ministro pediu explicações à chanceler Rachid, ainda em Nova York, que negou a existência de uma base militar americana no Paraguai ou que o país estava considerando deixar o Mercosul.
"Acho que o Paraguai lucra mais estrategicamente estando no Mercosul do que fazendo tratados de livre comércio que, de certa maneira, congelam as possibilidade de evolução de uma economia, que vão ocupar um nicho mínimo, ao passo que o Mercosul tem uma agenda de integração econômica e política", afirmou.
Economia dependente
Boa parte da economia do Paraguai é baseada na informalidade, e o país quer compensações dos sócios maiores do Mercosul, Brasil e Argentina, para desbaratar o esquema de contrabando e aumentar a proporção dos negócios formais, o que facilitaria o comércio com o país. No ano passado, o BNDES aprovou financiamentos de US$ 300 milhões para a construção da segunda Ponte da Amizade, que liga os dois países, e outras obras.
Na avaliação de diplomatas brasileiros, manifestações periódicas de insatisfação do Paraguai com o Mercosul são formas que o país encontra de pressionar os sócios maiores a fazer concessões. A situação econômica e social do país não melhorou com a entrada no Mercosul. A renda per capita do Paraguai caiu de US$ 1.500 em 1997 para US$ 960 em 2004.
Segundo esses diplomatas, a sociedade com o Paraguai tem um caráter mais político do que econômico. Para o Itamaraty, a cláusula democrática do Mercosul constrange golpes militares no país, que, assim como outros países da região, possui um ambiente político instável. É do interesse do governo brasileiro manter a estabilidade na região para evitar ingerências externas ou o afastamento de investimentos.
Outra preocupação do governo, que reforça a necessidade de manter o vizinho sob a órbita de influência do Brasil, é a extensa fronteira com o país e os 500 mil brasileiros que moram no Paraguai, além da divisão da hidrelétrica de Itaipu. Sem portos e indústrias, o Paraguai, por sua vez, precisa do Mercosul para garantir mercado para seus produtos, crédito e uma representação mais robusta em foros internacionais.
Para EUA, meta não é ter força, mas influência
IURI DANTAS
DE WASHINGTON
A aproximação entre EUA e Paraguai se insere em um programa estratégico da Casa Branca de aumentar sua influência na região, mas não passa necessariamente por maior presença física de soldados na área da Tríplice Fronteira, insistentemente apontada por Washington como pólo de financiamento de grupos supostamente vinculados a ações terroristas.
Nesse contexto, os exercícios de treinamento entre militares americanos e paraguaios são apenas mais uma peça no quebra-cabeças que envolve diversos órgãos do governo dos EUA na chamada "guerra ao terror", diretriz máxima da administração de George W. Bush após o 11 de Setembro.
Interessados em ampliar o fluxo de informações com os paraguaios, os EUA vêm promovendo diversas ações bilaterais, como os exercícios militares, o estudo de abertura de um posto avançado do FBI e o incremento no intercâmbio de dados de inteligência, tema que a CIA não comenta oficialmente.
Como não se trata de uma guerra convencional, a construção de uma base militar ou a instalação permanente de tropas americanas no país é descartada pelo Pentágono. O mais importante, e necessário dentro da estratégia de Washington, é a cooperação com autoridades paraguaias, intensificada nos últimos meses.
"Não há planos para basear soldados americanos no Paraguai por períodos extensos", afirma o Departamento de Defesa. Os exercícios conjuntos que vêm sendo realizados no país desde agosto, por períodos de duas semanas, são chamados pelo departamento de "exercícios humanitários". "Estamos satisfeitos com a ativa cooperação do Paraguai na luta contra o terrorismo", acrescenta o Pentágono.
Para um especialista em relações estratégicas ouvido pela Folha, atualmente os paraguaios cooperam "em praticamente tudo" com os EUA. Incluindo troca de informações sobre grupos vistos pelos americanos como vinculados a terrorismo e sobre a colônia árabe da região da Tríplice Fronteira, por exemplo.
Os exercícios militares servem, de acordo com o especialista, para que os EUA acumulem informações sobre o modo de atuação de militares paraguaios, além de promoverem uma abordagem mais pragmática e suave a respeito de atividades contra grupos terroristas. Sensibiliza os paraguaios, atrai seu interesse pelo tema e acumula dados sobre a atuação de suas forças armadas, diz.
Já no círculo diplomático estrangeiro, cujo acesso a documentos e ao governo americano é maior, há poucos que temem o avanço das relações EUA-Paraguai como algo perigoso para o Brasil. Servidores do Itamaraty ouvidos pela Folha em Washington manifestam mais interesse em descobrir se o "pacote" envolve alguma negociação comercial.f
Fonte: Folha de S.Paulo

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