quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Polícia Militar liquida à bala protesto por moradia no Recife 22/02/2017

 


do Marco Zero

por Inácio França

Por volta das 2h da terça-feira, a Avenida Recife, Zona Oeste da capital pernambucana, tornou-se cenário de tiroteios que duraram duas longas horas. Em uma ação cinematográfica, bandidos detonaram o muro da Brinks, uma empresa de transporte e segurança, acessaram o cofre e efetivaram o roubo (supostamente R$ 60 milhões) e fugiram. Doze horas após o assalto, a Polícia Militar de Pernambuco mostrou eficiência e ferocidade: só que agora contra militantes desarmados do movimento social.



Tudo começou porque o secretário de Habitação, Bruno Lisboa, desmarcou uma reunião para discutir o destino de 971 famílias da ocupação “Carolina de Jesus”, em um terreno do governo estadual no Barro. Sem perspectiva de negociação, aproximadamente 250 pessoas do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) protestaram na frente da Companhia Estadual de Habitação e Obras (Cehab), na esquina das avenidas Agamenon Magalhães e Odorico Mendes, em Santo Amaro.

Os militantes do MTST decidiram, então, ocupar a sede da Cehab para forçar uma negociação com o governo estadual. A PM foi acionada e não demorou para invadir a recepção e os jardins do prédio público disparando balas de borracha.

Aqui, a versão oficial e dos integrantes do MTST divergem completamente: a nota oficial divulgada pela assessoria da PM informa que a polícia entrou em ação porque “um grupo de sem teto (...) começou a depredar as vidraças no intuito de reivindicar moradias, nossas viaturas foram acionadas mediante COPOM juntamente a guarnições da BPRp para conter o tumulto onde (sic) conseguimos deter dois suspeitos de vandalismo (sic)”.

A nota segue ressaltando que “algumas pessoas ouviram os disparos de elastômero e se assustaram”. O documento noticia também que dois policiais levaram pedradas e sofreram ferimentos leves.


A advogada do MTST, Ana Cecília Gomes, acompanhou tudo e contou para a Marco Zero Conteúdo que a nota da PM mente num aspecto crucial: “Houve sim algumas vidraças quebradas, mas isso só aconteceu depois que a polícia começou a atirar e agredir os militantes. Foi uma reação à violência”.

Se Ana Cecília estiver certa, é nítida a disposição da polícia em criminalizar o movimento social por moradia.

Pelo menos em um item, a nota da PM foi, no mínimo, equivocada. Não foram detidos apenas “dois suspeitos de vandalismo”, mas sim 10 pessoas, todas elas lideranças conhecidas do Movimento. Severino Alves, candidato a vereador pelo PSOL em 2016, por exemplo, foi perseguido até o Campo do Onze (ou “caçado”, segundo o vereador Ivan Moraes Filho, que testemunhou a prisão). O repórter-fotográfico Eric Gomes também foi detido e teve os cartões de memória levados pelos policiais.

De acordo com Ana Cecília, após o cerco na sede da Cehab, os militantes do MTST iniciaram um protesto na Agamenon. Os policiais redobraram a violência, agora com armas de fogo e munição letal, ferindo na perna e no ombro a militante Vitória Regina Rodrigues Pena, de 22 anos, levada para o Hospital da Restauração.

Os detidos foram levados para a Central de Plantões da Polícia Civil de Pernambuco. Como as negociações entre os advogados de defesa e a polícia não avançaram, os militantes do MTST ficaram detidos para audiência de custodia que deverá acontecer na tarde desta quarta-feira. Segundo apurou a Marco Zero, eles estavam sendo acusados, inclusive o advogado do movimento, de associação criminosa, incêndio e dano ao patrimônio.

Mídia

Como era previsível, nos portais dos grupos de mídia local a cobertura da violência policial foi acrítica, com o uso de palavras aparentemente neutras para transmitir o efeito de uma isenção inexistente: O Diario de Pernambuco e o portal da Globo usaram a insípida palavra “tumulto”, a Folha de Pernambuco apelou para “confusão”. O Jornal do Commércio veio com o inevitável “confronto”.

http://jornalggn.com.br/blog/marco-zero/policia-militar-liquida-a-bala-protesto-por-moradia-no-recife

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